O economista e professor Pedro Rossi, da Universidade Estadual de Campinas, afirmou que o debate em torno da reforma da Previdência no País está “muito nebuloso” quando trata da relação entre gasto público e desigualdade. Em audiência da comissão especial da Câmara que trata da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 6/2019), que dispõe sobre a reforma, Rossi alertou que, ao contrário do que prega o governo – sobre o pretexto de combater privilégios e desigualdades – a reforma da Previdência atinge em cheio a renda dos mais pobres – retirando-lhes por ano R$ 17 bilhões do bolso e também da economia – e não mexe em nada com o 1% mais rico da população.
Segundo Rossi, há “equívocos ideológicos” no debate. Pela proposta, as mudanças no abono salarial vão reduzir, em média, 5,7% da renda anual de 24 milhões de trabalhadores que ganham entre um e dois salários mínimos. Isso aumentaria a desigualdade social medida pelo índice de Gini de 0,5475 para 0,5489, de acordo com a análise do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon), do Instituto de Economia da Unicamp.
Segundo o estudo, as profissões que mais devem perder são cozinheiros, trabalhadores de serviços de manutenção, porteiros/vigias e recepcionistas, entre outros. Mais de 60% dos ajudantes de obras, por exemplo, perderão essa renda anual.
De acordo com o estudo exposto na comissão, com a reforma da Previdência seriam retirados até R$ 17 bilhões por ano da economia, com impactos muito negativos ao país, já que esse dinheiro sairia do bolso de uma parcela da população que, consequentemente, deixaria de consumir.
“Grande parte dos assalariados vai perder o abono salarial e isso tem impacto distributivo e impacto macroeconômico”, disse Rossi. “Estamos tirando recursos que fazem girar a economia. Não tem argumento que me convença que tirar recursos dessas pessoas vai fazer a economia crescer. Crescimento é (formado por) consumo e investimento. Se tirar renda, as pessoas não vão consumir. Não entendo esse argumento.”
Segundo o economista da Unicamp, o problema não está em quem ganha salário mínimo. “O problema está no teto de gastos, com as limitações fiscais da Emenda Constitucional 95, que reduz o gasto público em 20 anos. O problema da desigualdade está nos 2% ou 1% mais ricos.”
De acordo com a pesquisadora Luciana de Barros Jaccoud, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a mudança proposta pelo governo de Jair Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), no texto original da reforma, vai ter grande impacto social. Hoje, o valor do benefício é de um salário mínimo (R$ 998), mas passaria a R$ 400 para quem tem 60 anos e só chegaria ao valor do salário mínimo para quem completar 70 anos.
A pesquisadora do Ipea ressaltou que os problemas econômicos vividos por quem tem pessoas fisicamente vulneráveis ou com deficiência “não são apenas individuais, são problemas familiares”. Os gastos dessas famílias com saúde, alimentos especiais e outros são maiores. Além disso, pessoas que têm dependentes nessas condições na família têm mais dificuldade de conseguir emprego. “Mães de crianças de portadores de doença ou dependente não conseguem trabalho”, exemplificou Luciana.