A Medida Provisória (MP) nº 1045 que mexe com diversos direitos trabalhistas, acabando até com as férias, o 13º salário, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e a obrigação da empresa pagar ao menos o salário mínimo (R$ 1.100) entra na pauta de votação do Senado Federal desta quarta-feira (1º/9). Se não for votada até o dia 7, a MP perde a validade.
Veja abaixo tudo o que perde o trabalhador.
A princípio, a MP previa apenas a manutenção do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm), que permite às empresas reduzir jornada de trabalho e salários ou suspender contratos por causa da pandemia, mas os deputados acrescentaram tantas emendas que transformaram a medida em uma perversa reforma Trabalhista. Se os senadores mudarem o texto, a proposta volta para Câmara para ser analisada e votada novamente. Não vai dar tempo.
E o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), pressionado pela equipe econômica de Jair Bolsonaro (ex-PSL), e parte do empresariado que só pensa no lucro e vive alheio à fome que aumenta no país, por falta de distribuição de renda e má gestão do presidente da República, anunciou o início das discussões na Casa nesta terça-feira (31).
A oposição trabalha duro para barrar mais este ataque aos trabalhadores. Já o relator da MP, o senador Confúcio Moura (MDB-RO), diz que não há mais tempo de fazer mudanças no texto, como se isso fosse argumento para deixar como está e acabar com o salário digno, entre outros direitos.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da Minoria na Casa, um dos críticos à MP, discorda do relator e acredita que há uma possibilidade forte de o Senado aprovar a Medida Provisória 1045 e retirar os jabutis, que são os itens alheios à proposta original que são inseridas no decorrer das discussões no Parlamento.
“Estamos conversando com o presidente Rodrigo Pacheco sobre a possibilidade da MP ser enviada para sanção sem retornar para a Câmara. Não é possível permitir que uma reforma deste tamanho seja aprovada sem uma discussão aprofundada e trazendo enormes prejuízos aos trabalhadores”, afirma Prates.
Para o senador, não tem sentido uma Medida Provisória, que a princípio previa apenas a manutenção do BeM ser tão alterada.
A MP chegou à Câmara com 25 artigos e saiu de lá com 94 e uma mudança profunda nas regras das relações entre empresas e trabalhadores. Tá sobrando jaboti nesta MP e agora é tarefa dos senadores resolver isso
O também senador petista Paulo Paim (RS) deve apresentar uma questão de ordem para que 10 dispositivos sejam retirados rapidamente da MP sem necessidade de a proposta voltar à Câmara.
Em um requerimento, Paim pede ao presidente do Senado que sejam impugnados desde o artigo 24 até o final o texto alterado na Câmara, e mantenha apenas o que veio do texto original da Medida Provisória, acabando com todos os jabutis. Confira aqui.
Saiba o que está em jogo com a reforma Trabalhista de Bolsonaro
1 – É o fim da carteira assinada para muitos
A MP cria o Regime Especial de Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip), que permite que empresas contratarem um trabalhador por dois anos, sem vínculo empregatício. As empresas poderão ter até 15% de seus trabalhadores contratados neste modelo, sem direitos.
O programa é destinado aos jovens de 18 a 29 anos, que estão sem registro na Carteira de Trabalho há mais de dois anos, e a pessoas de baixa renda, oriundas de programas federais de transferência de renda, como o Bolsa Família.
2 – Trabalhador poderá ser contratado por metade do salário mínimo
Pelo Requip as empresas pagam apenas um bônus valendo metade do salário mínimo (R$ 550). Serão R$ 275 pagos pelos patrões e a outra metade pelo governo federal, a partir do próximo ano. As empresas só vão arcar com o total neste ano, caso a MP seja aprovada pelo Congresso Nacional.
3 – Fim do 13º salário
O trabalhador contratado pelo Requip não terá direito a receber o 13º salário.
Outro programa criado dentro da MP, o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), destinado à contratação de jovens de 18 a 29 anos e pessoas com idade igual ou superior a 55 anos, que estão sem vínculo formal por mais de 12 meses, também acaba com o 13º ao final do ano.
O valor do 13º será pago ao longo de 12 meses. Como o Priore permite pagar até no máximo dois salários mínimos (R$ 2.200) dificilmente um trabalhador poderá economizar a parcela e juntar até o final do ano, impossibilitando assim que ele tenha ao menos condições de comprar um panetone no Natal.
4 – MP acaba com FGTS e reduz percentual dos depósitos
Tanto o Requip quanto o Priore retiram direitos em relação ao Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço (FGTS)
Pelo Requip o trabalhador não terá direito a nenhum depósito do FGTS. Quando acabar o seu contrato sairá sem nada.
Já o Priore permite que empresas reduzam a multa sobre o FGTS de 40% para 20%. E também diminui o valor das contribuições feitas ao Fundo de Garantia. Hoje, a alíquota de contribuição para os trabalhadores com carteira assinada é de 8%.
Com a MP, o trabalhador contratado por meio do Priore de uma empresa de grande porte vai ter depositado em sua conta 6%.
Para quem trabalha em empresa de médio porte este valor é reduzido para 4%.
As empresas de pequeno porte vão contribuir ao FGTS com apenas 2%.
5 – Trabalhador perde direito à aposentadoria e auxílio-doença
As empresas que contratarem pelo Requip não precisam depositar a alíquota referente ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que garante tempo de contribuição para a aposentadoria e direito ao auxílio doença.
O trabalhador que quiser contar o período de contratação para a aposentadoria vai ter de tirar do próprio bolso e pagar como contribuinte individual, de 11% a 20% sobre, ao menos, o salário mínimo (R$ 1.100). Além de arcar com a contribuição vai pagar mais do que quem tem carteira assinada, cujo desconto no contracheque gira em torno de 7,5% a 14%.
6 – Fim das férias remuneradas e redução da hora extra
O trabalhador contratado pelo Requip terá direito a um descanso de 30 dias ao fim de 12 meses, mas sem remuneração. É o mesmo que ficar desempregado por um mês.
O texto aprovado na Câmara diz que categorias com jornadas especiais (menores que oito horas), como é o caso dos bancários, podem ter a jornada estendida para oito horas mediante acordo individual ou acordo coletivo, fixando em 20% o adicional pelas horas extras que passam a compor a jornada normal de trabalho (sétima e oitava horas). Hoje, a legislação determina que a hora extra seja paga com adicional de 50% (segunda a sábado) e 100% (domingos ou feriados).
Além dos bancários, a redução das horas extras pode atingir aeroviários, aeronautas, advogados, dentistas, engenheiros, jornalistas, médicos, músicos, secretários (as) e telefonistas (como operadores de telemarketing).
7 – Redução de multas pagas ao trabalhador
O trabalhador não terá direito a 50% dos salários devidos, no caso de demissão do emprego antes do prazo de vigência estipulado no contrato.
8 – Restringe a fiscalização das empresas
A MP determina apenas a orientação, nos casos de descumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho e impõe uma dupla visita dos auditores fiscais do trabalho, inclusive nos casos em que o trabalhador é submetido a condições análogas à escravidão.
A primeira visita seria de orientação e somente na segunda haveria a multa. Na primeira visita só estão previstas multas na falta de registro de empregado, atraso de salário e não recolhimento de FGTS.
9 – Restrição à Justiça do Trabalho gratuita
Pela mudança só terá direito a Justiça gratuita a pessoa pertencente à família de baixa renda, com renda familiar mensal per capita de até meio salário-mínimo (este ano, R$ 550); ou com renda familiar mensal de até três salários-mínimos (R$ 3.300).
Poderá também ter direito quem, durante a vigência do contrato de trabalho mais recente, tenha percebido salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), de R$ 6.433,57. Ou seja, terá direito à justiça gratuita apenas os trabalhadores com salários de R$ 2.573,42, ou que cumpram os requisitos de renda familiar descritas acima.
10 – Dispensa sem justa causa
A MP permite a possibilidade de dispensa sem justa causa, mesmo havendo em seu texto a garantia provisória de emprego durante a sua vigência.
11- Trabalhador paga por erro de empresa no BEm
Em caso de recebimento indevido do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, por erro do empregador ou do próprio governo, haverá desconto dos valores nas futuras parcelas de abono salarial ou de seguro desemprego a que o trabalhador tiver direito.
12- Substituição de trabalhadores
Como as empresas podem contratar 15% do seu quadro funcional pelo Requip e outros 25% pelo Priore, existe a possibilidade de até 40% dos trabalhadores mais antigos e com melhores salários serem substituídos por esses modelos , mesmo que a MP “proíba” este tipo de substituição.
As brechas são as barreiras à fiscalização dos auditores fiscais do trabalho que só poderão aplicar multas na segunda visita e à justiça gratuita ,que pode inibir os trabalhadores de procurarem seus direitos.
13 – Prejudica saúde do trabalhador
Manter a saúde do trabalhador de forma preventiva também é um direito retirado pela MP. O texto diz que o empregador poderá, a seu critério, optar pela realização dos exames médicos ocupacionais periódicos, para os trabalhadores em atividade presencial ou em teletrabalho, por meio de telemedicina, sem diferenciar o tipo de atividade exercida.
14 – Prática antissindical
No texto da MP 1045 sobre o Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, de redução de jornada e salários e suspensão de contratos, o trabalhador que quiser a proteção do sindical poderá ter prejuízos financeiros.
O trabalhador que fizer acordos individuais de redução de salários e jornadas, que podem ser de 25%, 50% ou 70%, receberá como complemento mesmo percentual do seguro-desemprego que teria direito caso fosse demitido. O teto do seguro-desemprego é de R$ 1.911,84. Por exemplo, um trabalhador que tenha direito ao teto e teve 50% de corte na jornada e salários vai receber como complemento R$ 955,92, por mês.
Mas, para impedir que sindicatos possam fazer acordos melhores para os trabalhadores com reduções abaixo de 25%, o governo não vai pagar nada de complemento salarial.
Nos acordos coletivos com reduções de 25% a 50%, o benefício será de apenas 25% do seguro-desemprego, ao contrário dos acordos individuais que podem receber 50% do valor.
Nas reduções salariais maiores que 50% e até 70%, o benefício será da metade do seguro-desemprego. Nas reduções mesmo que maiores do que 70%, o valor do seguro-desemprego se limitará a 70%.
15 – Menos impostos com prejuízos à população em geral
A empresa por “ contratar” pelo Requip ainda terá benesses do governo federal. Os patrões poderão deduzir o pagamento do Requip da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A empresa também poderá reduzir de 30% para 15% o que paga ao Sistema S.
A redução de impostos prejudica a arrecadação da União, estados e municípios que ficam sem recursos para investir em serviços públicos gratuitos para a população.