O Brasil vive hoje dois dramas: um conjuntural, provocado pela covid-19, e um estrutural, que tem agravado as desigualdades. Se por um lado a pandemia aumentou o desemprego e a miséria, ela se tornou uma oportunidade para os mais ricos. Segundo a Oxfam, o patrimônio de 42 bilionários brasileiros aumentou cerca de R$ 177 bilhões, entre março e julho de 2020. Algo está muito errado.
No momento em que começamos a debater uma proposta de reforma tributária, precisamos focar na redução das disparidades, corrigindo distorções do sistema com um modelo que taxe quem ganha mais e alivie quem ganha menos.
Nossa estrutura tributária é altamente regressiva, penalizando os mais pobres. Isso nos faz o segundo pior país em concentração de renda e o sexto em desigualdade social. Para piorar, a agenda do atual governo é liberal ortodoxa, com restrição orçamentária e absolutismo fiscal que só acentuam os desequilíbrios.
No atual cenário, o mundo inteiro – mesmo os liberais, que não são ortodoxos e extremistas – reconhece a importância de uma renda básica, da sustentabilidade social e ambiental e da geração de empregos. Enquanto isso, no Brasil, o projeto do governo é a criação de um novo imposto e a enganação de que apenas uma simplificação vai resolver a situação e atrair investimentos. Claro que a simplificação é importante, mas se não atuar na regressividade tributária, não tiver um viés ambiental, como a energia limpa, por exemplo, não teremos sucesso.
Nenhuma democracia saudável convive com tanta exclusão e miséria. E o aumento da pobreza e da concentração de renda, provocados pela desastrosa visão de mundo que hoje habita o poder, impede que consigamos superar a crise para fazer o país voltar a crescer, gerar empregos e levar prosperidade para as pessoas.
Defendo que a reforma foque a distribuição de renda e a correção de distorções, estabelecendo um imposto sobre grandes fortunas, lucros e dividendos e taxe os rendimentos de alta renda a serem pagos pelos 0,3% mais ricos, num tributo a ser utilizado na rede social e ambiental de proteção.
Isso é justiça tributária capaz de reequilibrar as contas públicas e recuperar nossa capacidade de investimentos para retomar o crescimento no pós-pandemia com foco na proteção do povo, na preservação do meio ambiente e em políticas públicas sustentáveis.
Artigo originalmente publicado no jornal O Povo (CE)