Parlamentares do PT e especialistas afirmaram nesta quinta-feira (24), durante o Seminário Resistência, Travessia e Esperança, que a reconstrução da Soberania Nacional – duramente atacada por Bolsonaro e seus aliados – será uma das principais missões do próximo governo. Durante o evento promovido pelas Lideranças do PT na Câmara e no Senado, Fundação Perseu Abramo, PT Nacional e Instituto Lula, foram apontados como desafios o fortalecimento do papel do Estado na questão energética, o combate à fome como fator de soberania alimentar, maior investimento em ciência e tecnologia e a reconstrução do protagonismo brasileiro na diplomacia internacional.
Na abertura do evento, o ex-ministro da Defesa no governo Dilma Rousseff e atual presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, senador Jaques Wagner (PT-BA), analisou a soberania nacional dentro do atual contexto. Segundo ele, os avanços obtidos pelo Brasil durante os 13 anos de governos do PT foram praticamente todos destruídos por Bolsonaro.
“Vivemos atualmente inúmeros retrocessos sociais, ambientais e na nossa soberania, com um presidente que durante um tempo foi totalmente submisso ao governo norte-americano (na era Trump) e que apagou o país no cenário internacional. Aqui no Brasil estamos vendo a destruição da nossa soberania energética, além do incentivo do governo à destruição ambiental, principalmente da Amazônia”, afirmou.
Já o líder da Bancada do PT na Câmara, deputado Reginaldo Lopes (MG), ressaltou que a insegurança alimentar e a fome que assolam o país também atentam conta a soberania nacional. “Temos um governo entreguista e antinacional que, apesar de falar em patriotismo, esquece que amor à pátria é ter amor pelo povo. O país que mais contribui para a produção de alimentos no mundo tem, atualmente, cinco milhões de crianças passando fome, em um total de mais de 20 milhões de brasileiros, e mais de 100 milhões em situação de insegurança alimentar”.
Presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional e um dos coordenadores do seminário, o deputado Patrus Ananias (PT-MG) acrescentou que soberania nacional pressupõe respeito à vida e a uma alimentação saudável, com pelos menos “três refeições por dia”. “E não falamos apenas da produção de alimentos, mas também de reserva de alimentos em caso de necessidade”, afirmou.
Protagonismo internacional
O debate sobre as relações internacionais teve espaço destacado no evento. Na opinião do líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), as pontes com a diplomacia internacional precisarão ser reconstruídas para que o Brasil volte a ter protagonismo no mundo.
“Além das políticas sociais, como o Minha Casa Minha Vida, o Mais Médicos, o Pronaf e tantas outras ações, uma das nossas maiores conquistas durante os governos do PT foi a reafirmação da nossa soberania, por meio da participação ativa e altiva na criação de organismos como G-20, Brics, além do fortalecimento do Estado brasileiro”, ressaltou.
Já o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), também coordenador da Mesa, alertou que o governo Bolsonaro, apesar da forte presença de militares nos cargos de 1º escalão, tem enfraquecido a própria indústria militar de defesa do país.
“Todo o conceito de soberania nacional dos nossos governos foi abandonado, até mesmo as iniciativas para fortalecer o parque industrial do setor. O Brasil hoje não tem uma indústria nacional de defesa e, recentemente, vimos a notícia de que a Avibras (indústria que projeta, desenvolve e fabrica sistema de defesa artilharia, foguetes e misseis) anunciou a demissão de mais de 400 funcionários”, relatou.
Soberania Energética
Durante a discussão sobre soberania energética, o coordenador-geral da Frente Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, fez um diagnóstico dos ataques sofridos pela Petrobras nos últimos anos. Segundo ele, nos sete leilões de campos de Petróleo desde o golpe de 2016, o Brasil entregou para petrolíferas internacionais – a maioria norte-americanas e chinesas – a exploração de mais de 100 bilhões de barris de petróleo. Ele ainda criticou a redução drástica da política de conteúdo nacional, que priorizava a indústria brasileira na compra de equipamentos. “Hoje, as sondas, navios e plataformas não são mais construídos no Brasil. A Petrobras atualmente compra esses equipamentos de países como China, Hong Kong e Cingapura, gerando empregos e enviando divisas para fora do país”, acusou.
A conta do prejuízo à população não para por aí. Deyvid Bacelar assinalou que a venda de refinarias influencia na alta dos preços dos combustíveis. “Após ser privatizada, por exemplo, a Refinaria Landulpho Alves (BA) vende a gasolina mais cara do país. E com essa política de preço de paridade de importação (PPI), que atrela o valor dos combustíveis ao valor do barril de petróleo no mercado internacional, em dólar, desde outubro de 2016 a gasolina já sofreu 157% de reajuste e o gás de cozinha, 349%, quando tivemos nesse período apenas 31,8% de inflação”.
A política atual do setor foi igualmente criticada por Jaques Wagner, para quem “é incompreensível que o Brasil dependa de combustíveis de outros países. Temos as matérias-primas necessárias, a nossa autossuficiência nesses setores”. Na opinião do senador, “tem de se ter extremo cuidado para não entregar o controle de setores críticos como os de energia, comunicação e petróleo para interesses estrangeiros, especialmente quando visam apenas lucro rápido”.
É o que pensa também a representante do Coletivo Nacional dos Eletricitários, Fabíola Latino Antezana, que condenou a tentativa do atual governo de vender a Eletrobras. Segundo ela, um país que se propõe a ser soberano precisa ter estatais fortes para universalizar o oferecimento de serviços com qualidade e preços módicos.
“Se pegarmos as experiências internacionais de privatização no setor energético, veremos que a população sempre paga a conta com aumentos absurdos. Na Espanha, por exemplo, entre 2018 e 2021, houve aumento de 500% no valor da energia. Na Argentina, após a privatização do parque energético os aumentos chegaram a 700%. Em países com matriz de produção iguais à do Brasil (hidroelétrica), como Estados Unidos, Rússia, China e Canadá, não se ouve falar em privatização, porque isso também envolve a privatização da água, o que pode acarretar risco hidrológicos”, observou.
Também participaram do seminário, como palestrantes, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, o professor e economista Renato Maluf e a doutora em relações internacionais e pesquisadora do Observatório da Defesa e Soberania Nacional, Ana Penido.