“Morrem mais mulheres, no Brasil, do que em tempos de guerra em outros países”, revelou a juíza titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, Adriana Mello, ao citar os dados do Mapa da Violência de 2012: “nos últimos 30 anos foram assassinadas no País perto de 91 mil mulheres, 43,5 mil só na última década”. Um cenário que provoca as autoridades públicas a pensar em uma nova definição dos crimes cometidos contra a mulher. Nesta quinta-feira (08), durante um debate na Subcomissão Permanente em Defesa da Mulher, as senadoras petistas Ângela Portela (RR) e Ana Rita (ES) defenderam a criação de um novo tipo penal: o feminicídio.
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“A gente propõe à comissão que estuda as alterações do novo Código Penal a inclusão da terminologia feminicídio como tipo penal. Alguns países da América do Sul já tem a tipificação e nós não temos ainda. É o momento oportuno”, afirmou Ângela Portela. “Precisamos qualificar a nossa legislação. Não que a violência contra a mulher seja recente, ela é antiga; mas a reflexão sobre a violência nos leva a dar um tratamento mais adequado, aprofundar mais”, completou Ana Rita.
Mais do que sinônimo feminino para homicídio (femicídio), o feminicídio categoriza as mortes decorrentes de uma situação de gênero. Conforme observou a secretária-executiva da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Lourdes Bandeira, a tipificação jurídica pode contribuir para redimensionar o assassinato e a violência contra a mulher dentro dos valores da sociedade. “Os tipos do Código Penal atual não tem um olhar e sensibilidade para crimes que representam a coisificação do corpo feminino e esvazia as mulheres de sua condição de humanidade”, destacou.
Fator cultural
O feminicídio, esclareceu a juíza Adriana Mello, é reflexo da relação de subordinação e discriminação feminina e da aceitação social da dominação masculina. “Estima-se que cerca de 70% dos homicídios de mulheres são cometidos por razões associadas a sua condição de gênero e por homens próximos”, disse. A pesquisa “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado”, realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o SESC, revela que a cada 5 minutos 2 mulheres são vítimas de espancamento no Brasil. O estudo aponta que 70% das vítimas de agressão sofreram o crime na própria residência, sendo que em 65% das vítimas na faixa dos 20 aos 49 anos a agressão foi praticada pelo parceiro ou ex-parceiro.
Diante deste quadro, Adriana sugere, que, além do novo tipo penal, seja criando um banco de dados de homicídios de mulheres em razão do gênero e desenvolvidas políticas públicas de prevenção à violência contra as mulheres, através de campanhas de combate à violência e educação nas escolas de igualdade de gênero e direitos humanos.
Neste sentido, a secretária Lourdes Bandeira ressaltou o programa “Mulher: viver sem violência”, anunciado pela presidente Dilma Rousseff em
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março deste ano. Com investimento da ordem de R$ 265 milhões, o programa prevê a criação de centros integrados de serviços especializados, humanização do atendimento em saúde, cooperação técnica com o sistema de justiça e campanhas educativas de prevenção e enfrentamento à violência de gênero. À época, Dilma assegurou que a medida representava “tolerância zero” à violência de gênero.
Ângela Portela afiançou que é de fundamental importância a continuidade de recursos públicos para a rede de proteção à mulher, que segundo ela ainda está muito aquém do que o País precisa. “Há necessidade de investimento. No orçamento público tem que constar recursos destinados a estruturação dessa rede de proteção à mulher. A gente percebe que se não houver um consciência política da importância do combate a essa violência, certamente vamos continuar patinando nos números”, finalizou.
Ranking mundial
Estatística da Organização Mundial da Saúde mostra que, dentre os 80 países, o Brasil, com sua taxa de 4,4 homicídios para cada 100 mil mulheres, ocupa a 7ª colocação, como um dos países de elevados níveis de feminicídio. O relatório aponta que o número assombroso é acompanhado de elevados níveis de tolerância da violência contra as mulheres e, em alguns casos, são o resultado de dita tolerância.
Catharine Rocha
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