O Partido Liberal (PL), do candidato derrotado Jair Bolsonaro, remendou nesta quarta-feira (23) o pedido com teor golpista para anular 60% dos votos do segundo turno para presidente. E reforçou que quer anulação dos equipamentos apenas na segunda etapa do pleito, para supostamente não causar um grande “tumulto”. A peça deve ser anulada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e foi duramente criticada pela Bancada do PT no Senado.
O líder Paulo Rocha (PA) apontou que a peça do PL busca continuar mobilizando movimentos golpistas. “A apresentação de um pedido sem fundamento para tentar anular o resultado legítimo das eleições certamente será negado. E deveria ser investigado. Essa é apenas uma tentativa de tentar tumultuar de novo uma eleição que já acabou”, disse o parlamentar.
O primeiro relatório do PL foi apresentado ontem. A tentativa de garantir a vitória de Bolsonaro no tapetão foi respondida em apenas 13 minutos pelo presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, com ares de crueldade e sarcasmo. Ele solicitou que o partido incluísse na “denúncia” os resultados do primeiro turno eleitoral, já que as mesmas urnas foram utilizadas. Com isso, o partido coloca sob suspeita até mesmo a eleição dos parlamentares da sigla.
Mas o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, em coletiva nesta tarde, afirmou que seria uma medida “açodada” pedir verificação das urnas também no primeiro turno. Segundo ele, como efeito, isso traria um “grande tumulto” para o país. Disse ainda que a peça não precisa trazer provas de fraude, apenas indícios. Em resumo: não bancou colocar em xeque a eleição de aliados e confirmou não ter qualquer prova de fraude.
Em entrevista à CNN Brasil, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) classificou o pedido como uma “fake news”. “Os brasileiros sabem o quanto [as urnas] são seguras. Portanto, é só narrativa para criar confusão e tumulto às vésperas da transferência do poder para o novo presidente que ganhou as eleições”, disse.
O pedido do PL quer que 279,3 mil urnas sejam invalidadas por um falso “mau funcionamento”. O suposto problema alegado em modelos anteriores a 2020 foi desmentido por especialistas.
À Reuters, o consultor em eleições digitais, Giuseppe Janino, um dos criadores da urna eletrônica brasileira, disse que o arquivo de log − usado como base para a petição ao TSE − “nada tem a ver com o núcleo do ecossistema da urna eletrônica”. De acordo com ele, não há qualquer interferência durante o recebimento e o registro do voto, nem mesmo na apuração dos resultados.
“O log é um mecanismo de auditoria, dentre os vários outros que a urna eletrônica tem. “Portanto, se o log falhar, o que certamente não foi o caso, não interferiria em absolutamente nada no funcionamento do recebimento do voto e sua apuração”, destacou Janino.
“Má-fé ou terraplanismo”
As críticas ao pedido do partido de Bolsonaro se multiplicaram entre autoridades e especialistas. Entre elas, as proferidas pelo coordenador-geral da Associação Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), que reúne juristas e servidores do Judiciário, Luiz Fernando Casagrande, em fala ao Estadão.
“A iniciativa do PL contra as urnas não resiste a uma explicação técnica de dois minutos. É má-fé ou terraplanismo”, disse.
A expectativa é que a resposta ao pedido do Partido Liberal seja rápida. Um exemplo veio no final do segundo turno, quando Moraes indeferiu o pedido da campanha de Bolsonaro para investigar inserções de rádio. Além disso, o ministro pediu investigação do caso como possível “crime eleitoral” e incluiu o tema em inquérito do Supremo Tribunal Federal que apura atuação de milícia digital em atentados à democracia.