Para sanar dúvidas em relação à insegurança |
Um acordo proposto pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), garantiu o prosseguimento da hercúlea articulação política para que a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) destinada a acabar com a guerra fiscal entre os estados siga
Durante os debates nesta manhã, o líder do PT no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), observou que há dois anos o Senado discute a reforma do ICMS e lembrou que a criação desses dois fundos estava prevista na medida provisória editada pela presidência da República no começo do ano. Porém, como a MP não foi votada dentro do prazo, a iniciativa de criar dois fundos por meio de um projeto de lei de iniciativa parlamentar poderia ser questionada no Supremo Tribunal Federal (STF), já que a criação de fundos específicos como estes é uma competência privativa da presidência da República.
O relator do PLS nº 106/2013, Armando Monteiro (PTB-PE) ponderou que a consultoria jurídica do Senado fez uma interpretação favorável à utilização desse instrumento, um projeto de lei parlamentar, para autorizar a criação desses dois fundos. O senador Romero Jucá (PMDB-RR), concordou com Pimentel ao dizer que, tecnicamente, o texto poderia ter sua constitucionalidade questionada no STF. Jucá sugeriu, então, que a criação dos fundos fosse incluída no projeto (PLC nº 238/2013) que trata da troca de indexadores das dívidas dos estados e municípios.
Embora essa matéria faça parte da reforma do ICMS, Lindbergh ponderou que, ao incluir uma alteração no texto do projeto da troca dos indexadores da dívida dos estados e municípios (PLC nº 238/2013), obrigatoriamente a matéria retornaria para a Câmara, já que um projeto que sofre alterações no Senado deve retornar à casa de origem, ou seja, por onde começou a tramitar. Foi então que o presidente da CAE propôs o encaminhamento do PLS nº 106/2013 para que a CCJ exerça sua prerrogativa que é justamente analisar se o projeto que cria os dois fundos é juridicamente perfeito e está de acordo com a Constituição.
“Precisamos criar um fato político. Não dá para simplesmente convalidar (tornar válidos) os incentivos fiscais concedidos pelos estados e julgados inconstitucionais porque apenas isso não acaba com a guerra fiscal. E não podemos, também, admitir qualquer retrocesso que possa significar a manutenção da guerra fiscal entre os estados”, disse Lindbergh.
Ele citou como exemplo situações que ocorreram em alguns municípios que decidiram dar isenções do IPTU como forma de atrair empresas para sua região. O efeito que poderia parecer positivo foi o contrário, porque outras empresas não beneficiadas deixaram de recolher o imposto na expectativa de uma isenção mais adiante pelo poder público municipal.
“Quero acreditar que ainda podemos fazer a reforma do ICMS para vigorar no ano que vem. No âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária, o Confaz, 24 estados chegaram a um acordo sobre a convalidação dos incentivos. Também acredito que podemos salvar a reforma do ICMS aprovando a criação dos dois fundos, porque eles vão garantir a compensação de eventuais perdas de receitas e o desenvolvimento regional”, disse o presidente da CAE.
Para entender
A guerra fiscal do ICMS ganhou corpo nos últimos vinte anos e funcionava basicamente assim: com o propósito de atrair uma empresa para determinada região, os governos estaduais ofereciam terrenos e, para atender o interesse dos empresários, concediam a isenção da alíquota do ICMS nas vendas de seus produtos nas chamadas operações interestaduais. As alíquotas que incidem atualmente são de 7% nos estados das regiões Sul e Sudeste, quando enviam uma mercadoria para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e de 12% no caminho inverso. Então, quando uma mercadoria sai da região Norte para o Sul o estado beneficiário cobra no valor da nota do produto 12% na origem onde foi fabricado, enquanto o estado de destino fica com 7%.
A CAE aprovou a criação dos fundos de |
A alíquota cheia do ICMS, na média, é de 19% e muitas vezes o estado que atraiu a empresa para sua região faz uma cobrança simbólica do ICMS que seria devido por essa empresa beneficiada. Acontece, porém, que muitas vezes o estado que deu o incentivo remete ao estado de destino da mercadoria a cobrança da alíquota cheia. E é aqui que começa a guerra fiscal. Como os incentivos somente são legais quando aprovados por unanimidade por todas as secretarias de Fazenda estaduais, no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária, o Confaz, criou-se uma disputa judicial entre os estados porque nos últimos vinte anos muitos estados concederam benefícios fiscais com base no ICMS sem que fossem aprovados por unanimidade.
Para ilustrar o problema da guerra fiscal, o estado de São Paulo levou para os tribunais uma disputa contra o estado do Amazonas. Uma televisão que sai da Zona Franca tendo como destino São Paulo, por exemplo, sendo que esse produto foi fabricado por uma empresa que tem incentivo ilegal, ou seja, sem o aval de todos os secretários de Fazenda, faz com que a São Paulo retenha aqueles 12% do ICMS que Amazonas teria direito. No jargão tributário isso se chama de glosa, já que o recolhimento do imposto se dá no destino da mercadoria para posterior repasse ao estado de origem do produto.
Ao glosar o dinheiro que iria para o Amazonas, São Paulo levou para os tribunais o questionamento jurídico se um benefício concedido sem unanimidade tem valor. O STF, há dois anos, disse que não tem valor. Com isso, o efeito é uma insegurança jurídica, porque assim que o Supremo baixar uma súmula vinculante, a decisão que vale para um valerá para todos.
Quando o senador Lindbergh Farias disse hoje que há insegurança jurídica por falta da reforma do ICMS, com as empresas tendo que lançar em seus balanços valores expressivos de possíveis multas, ele apenas mostrou o caos que poderá acontecer na prática. Isto, porque a empresa que recebeu o benefício ilegal terá de recolher o ICMS de todos os anos passados. O senador Delcídio do Amaral (PT-MS), aliás, já fez esse alerta em diversas ocasiões.
Para piorar o cenário, dois municípios de Goiás recorreram e ganharam no Supremo Tribunal Federal o direito de receber a parcela de ICMS que o estado concedeu para duas empresas se instalarem na região. O estado concedeu um benefício considerado ilegal e agora os municípios querem receber o dinheiro do ICMS que teriam direito. A guerra fiscal até então entre os estados tende a ganhar corpo com os municípios reivindicando sua parte no bolo tributário.
Para Lindbergh não basta apenas tornar válidos os incentivos fiscais por meio da convalidação. O passo dado hoje, com a aprovação da criação de dois fundos, o de compensação de perdas e o de desenvolvimento regional, é complementar ao Projeto de Resolução (PRS nº 1/2013) que reduz as alíquotas para o intervalo de 4% quando os estados das regiões Sul e Sudeste vendem para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, mais o estado do Espírito Santo e de 7% no caminho inverso. Amazonas ficará com uma alíquota de 10% quando enviar mercadorias para as regiões Sul e Sudeste. No Confaz, São Paulo pediu uma alíquota diferenciada para o Pólo de Informática, de 7%.
São Paulo, por sua vez, agora também pede que as perdas de receita com a aprovação da PEC 197 do comércio eletrônico sejam incluídas no fundo de compensação, mas na ponta do lápis essa perda já foi diluída com o fim da guerra dos portos. O autor dessa PEC, Delcídio do Amaral, observa que o governo paulista aprovou a divisão do ICMS no comércio eletrônico com os estados de destino das mercadorias quando essa matéria foi aprovada no Senado antes de seguir para a Câmara. Mas há um porém: estranhamente, o governo paulista mudou seu posicionamento recentemente e agora quer a inclusão das perdas no fundo de compensação, embora essas eventuais perdas estejam sendo equilibradas com o fim da guerra dos Portos, quando o Senado unificou em 4% as alíquotas do ICMS incidente nas operações com importações.
Como se vê, a reforma do ICMS mexe com interesses distintos de cada estado e é por isso que Lindbergh acredita que a saída é política. A sinalização de hoje com a aprovação da criação dos fundos e a aprovação do projeto que muda os indexadores das dívidas poderá influenciar mais uma reunião dos secretários de Fazenda amanhã.
Marcello Antunes
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