Artigo: A contrarreforma do ensino médio avança no Senado Federal

Artigo: A contrarreforma do ensino médio avança no Senado Federal

Foto: Alessandro DantasA educação brasileira sofreu um duro golpe no Senado Federal com a aprovação em primeiro turno da PEC 55/16, que anula durante 20 anos o piso constitucional dos recursos destinados à educação, e com a aprovação, na Comissão Mista, da Medida Provisória que reformula o ensino médio, ampliando sua carga horária e modificando sua estrutura curricular.

Se é verdade que o Plano Nacional de Educação (2014 – 2024) estabelece como meta a ampliação da educação em tempo integral para no mínimo 50% das escolas públicas, também é verdade que a concepção de educação básica que norteia o PNE é completamente diferente daquela que norteia a Medida Provisória 746/16.

Ao ampliar a carga horária do ensino médio de 800 para 1400 horas anuais, mas estabelecer que a carga horária destinada ao cumprimento da Base Nacional Comum Curricular poderá ser inferior a 60% do total da carga horária do ensino médio, a MP desvincula parte significativa do ensino médio da educação básica, ou seja, comum ao conjunto dos estudantes brasileiros, instrumentalizando o ensino médio em benefício de uma formação tecnicista e precária, em detrimento da educação integral. Além disso, as escolas não serão obrigadas a ofertar os cinco itinerários formativos previstos na MP 746, de modo que os estudantes não terão o direito de escolher os itinerários formativos de sua preferência, cabendo aos sistemas de ensino definirem quais itinerários terão condições de ofertar.

Embora resgate a obrigatoriedade do ensino de arte e de educação física, o Projeto de Lei de Conversão – derivado da MP 746/16 – elimina a obrigatoriedade do ensino de filosofia e de sociologia no ensino médio, permite que profissionais com suposto notório saber ministrem aulas da formação técnica e profissional e permite que graduados sem licenciatura ministrem aulas de quaisquer disciplinas do ensino médio.

Ademais, a política de fomento que consta no PLV é extremamente limitada e insuficiente, prevendo o repasse de recursos pelo prazo de “até dez anos”, a depender da disponibilidade orçamentária. Em tempos de PEC do teto de gastos, a política de fomento pode se transformar em uma peça de ficção, provocando o sucateamento ainda maior das escolas públicas e agravando a situação econômica dos estados, na contramão do Plano Nacional de Educação.

A possibilidade de os sistemas de ensino reconhecerem, para efeito de cumprimento das exigências curriculares do ensino médio, quaisquer outras experiências adquiridas fora do ambiente escolar, revela a tentativa de esvaziamento do currículo do ensino médio e um modelo de educação meramente mercadológico.

A MP 746/16 não vai garantir aos estudantes de escola pública uma formação básica de qualidade nem tampouco uma formação efetiva para o mercado de trabalho, aprofundando ainda mais o apartheid existente entre a educação dos filhos da elite e a educação dos filhos dos trabalhadores, que terão o acesso ao ensino superior dificultado.

Uma matéria de tamanha relevância para o presente e o futuro do nosso país não poderia de forma alguma ser imposta via medida provisória, sem um amplo e qualificado debate com a sociedade. Resta-nos continuar lutando em defesa do Plano Nacional de Educação, que contém um conjunto de metas fundamentais para o fortalecimento da educação básica e para o desenvolvimento nacional.

Fatima Bezerra

 

Artigo publicado em 02.12.2016 pelo NOVO Jornal

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