Ex-ministro de Lula e Dilma participou de conferência em São Paulo e avaliou rumos da política externa brasileira após o golpePara o ex-ministro das Relações Exteriores e ex-ministro da Defesa, Celso Amorim, o Brasil não pode ter uma diplomacia submissa e voltada somente para relações comerciais. “O Brasil não pode se ausentar das questões mundiais. Sempre com senso de justiça e solidariedade. Política externa tem que ser altiva e ativa, se não, ela não é política externa”, afirmou, em evento realizado em São Paulo na noite de segunda-feira (4).
Amorim se referia à postura do Ministro de Relações Exteriores do governo interino, José Serra (PSDB), que tem enfatizado somente relações comerciais do país, enquanto busca desfazer laços diplomáticos estabelecidos desde 2003.
Argumentou que “o Brasil não é um país modesto, e não poder ser”, explicando que o povo brasileiro pode ser modesto no trato pessoal do cotidiano. Mas, na política externa, deve ter consciência de sua relevância no cenário mundial. “O presidente Lula mostrou que não fazia sentido o Brasil se portar de uma maneira modesta. O Brasil não é modesto. O país, com a dimensão que tem, não tinha só que reagir de maneira altiva, mas ser um construtor da agenda internacional”.
“A autoconfiança que o presidente Lula trouxe para o povo brasileiro se reflete na política externa, e foi assim que se construiu uma política externa ativa e altiva”, disse.
Amorim foi chanceler do Brasil nos dois governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministro da Defesa durante o primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff. O debate “Em defesa de uma política externa ativa e altiva” aconteceu na Casa de Portugal, na Liberdade, centro de São Paulo.
“O presidente Lula mostrou que não fazia sentido o Brasil se portar de uma maneira modesta. O Brasil não é modesto. O país, com a dimensão que tem, não tinha só que reagir de maneira altiva, mas ser um construtor da agenda internacional”.
Ao iniciar sua fala, Amorim saudou a plateia e disse estar feliz pelo salão estar lotado com pessoas de diferentes idades, principalmente jovens, para discutir relações exteriores. “Porque relações internacionais são importantes, não só na prática, como simbolicamente (…) Ajuda a formar a percepção que um povo tem de si próprio”.
Isto porque, lembrou o ex-ministro, diplomacia significa a forma como um povo se relaciona com o povo de outro país.
Ao comentar como se construiu a diplomacia ativa e altiva das gestões do PT, reforçou que, por sua relevância, “o Brasil não consegue se esconder em qualquer cantinho”.
A diplomacia brasileira, a partir de 2003, passou a pautar agendas na política externa e se tornou um ator-chave. É por esta razão que fazer uma política somente para relações comerciais pode destruir tudo o que tem sido construído.
O ideal, segundo ele, é equilibrar os dois aspectos, tanto os interesses políticos quanto os político quanto os comerciais. “Não se pode pensar a política externa com a mentalidade de perdas e ganhos”.
Em sua avaliação, o Brasil ganhou importância com diplomacia nos governos do PT. “A ALCA não foi aprovada porque trabalhamos muito pelos nossos interesses”, e que o governo interino atende àqueles que não querem independência do Brasil. “Precisamos ver o conjunto do país, pensando na redução das desigualdades. Foi isto que levou o presidente Lula a fazer uma política ativa e altiva”.
Política Sul-Sul
Uma das marcas da diplomacia brasileira a partir de 2003 é o fortalecimento das relações políticas e econômicas com países do sul. Ao ocupar o cargo de chanceler, Serra disse que fecharia embaixadas brasileiras na África para cortar custos e criticou o funcionamento do Mercado Comum do Sul (Mercosul). O ideal, para o tucano, seria “flexibilizar regras” do bloco, com a finalidade de buscar mais acordos comerciais.
Para Amorim, “fazer análise de custo e benefício sobre funcionamento de embaixadas é uma brincadeira”, ironizou.
“O que nos interessava era criar uma agenda internacional diversificada, como a aproximação com a África”. “Para cada problema africano, existe uma solução brasileira. E é verdade. Temos uma solidariedade ativa”.
Reforçou sua postura de crítico da flexibilização de regras no Mercosul. É que o bloco não surgiu para dar ganhos comerciais a seus membros, embora este seja um aspecto importante nas relações internacionais.
“Mercosul nasceu para conservação da paz e da democracia na América do Sul, com presidentes Sarney, no Brasil, e Alfonsín, na Argentina. Mercosul não é mero bloco comercial: é a identidade sul-americana, para consolidar relacionamento pacífico na região”.
Amorim quesitonou aqueles que usam como argumento o fato de o Mercosul estar passando por um momento ruim, e lembrou que se trata de uma questão de conjuntura mundial. “Tanto que a própria União Europeia está também passando por uma crise”.
Além de avaliar os rumos do Ministério das Relações Exteriores, Amorim criticou o afastamento de uma presidenta eleita, sem que haja crime de responsabilidade: “Impeachment de Dilma dividiu o Brasil de maneira muito grave”, alertou.
O evento foi realizado pelo Instituto Lula, a Fundação Perseu Abramo, a Frente Brasil Popular, o Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso), a Fundação Friedrich Ebert e o Grupo de Reflexão do sobre Relações Internacionais (GR-RI).
Por Daniella Cambaúva da Agência PT de Notícias