O BNDES já poderia, segundo o líder do governo no Senado, ter divulgado as operações no exterior para mostrar que “não há nada escondido”O líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral, afirmou que o governo discute há um bom tempo a publicação das operações do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no exterior e que a instituição já poderia ter feito isto anteriormente. Em entrevista na tarde desta quarta-feira (3), o líder foi enfático ao dizer que “não há nada escondido” e que a iniciativa proporciona um acompanhamento claro dessas ações.
Sobre a proposta conjunta dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMBD-AL) e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), da chamada Lei de Responsabilidade das Estatais, tornando obrigatória a sabatina de diretores das empresas públicas, Delcídio considerou positiva a sinalização de Renan de rever tal exigência. “Essa iniciativa mostra que está disposto ao diálogo e a ouvir todas as opiniões, para, a partir daí, apresentar um projeto importante para as estatais nas áreas de gestão, de compliance (regras de transparência e controle interno de uma empresa), transparência, eficiência e de seus resultados”, afirmou. Confira as perguntas dos jornalistas e as respostas do líder do governo no Senado:
Repórter – Em relação à posição do presidente do Senado, Renan Calheiros, de que pode recuar da sabatina, o senhor considera que facilita a tramitação do projeto de lei?
Delcídio – Acho que a fala do presidente Renan mostra que está disposto a ouvir todas as opiniões e apresentar um projeto importante para as estatais, para a gestão, para essa questão de compliance, para transparência, eficiência e resultados. É assim que a gente vai construir uma proposta importante, não só fruto do acordo dos dois presidentes (Renan Calheiros, pelo Senado e Eduardo Cunha, presidente da Câmara), mas inclusive de projetos que já tramitam no Senado Federal e que tratam dessa questão.
Repórter – Houve consenso?
Delcídio – O presidente Renan compreende a importância de um tema como esse e sem dúvida vai ser uma oportunidade para fazer o debate que é bom para o País.
Repórter – Não é uma transferência de poder, do Executivo para o Congresso Nacional?
Delcídio – Não. Eu tenho uma leitura muito clara porque o Estado é o principal acionista das estatais. Mas essas estatais, muitas delas, têm também acionistas privados. Elas evidentemente enfrentaram dificuldades, mas têm regras claras de governança, de compliance; de acompanhamento de plano de negócios e várias estatais têm ações negociadas na bolsa de valores. Têm empresas com ações negociadas no exterior e que seguem preceitos contábeis americanos. Agora, claro, toda iniciativa para melhorar a gestão é bem vinda. O governo não vai se negar a fazer esse debate, como a própria presidenta Dilma Rousseff disse ontem.
Repórter – É difícil aprovar esse projeto da sabatina para diretores de estatais?
Delcídio – Acho que esse é mais um assunto que vinha sendo discutido e o próprio presidente Renan Calheiros, sentindo que não é talvez o foco principal dessa proposta, entende que esses tópicos podem ser discutidos e até eventualmente eliminados. Acho natural isso.
Repórter – Ele (Renan) queria aplicar sabatina para vice-presidentes, diretores e até destituir presidentes de estatais…
Delcídio – Nós ainda não chegamos no Parlamentarismo. Nós somos um governo presidencialista, ainda. Se nós tivéssemos no regime Parlamentarista, tirar, expulsar, eu acho que o Senado, por exemplo, pode ter mecanismos em relação às agências reguladoras, até no sentido de tomar providência de não cumprimento de metas ou problemas de desempenho. Acho normal naquelas agências de Estado. Para o executivo de uma empresa estatal as empresas evidentemente com falhas, com problemas, que podem ser ajustados, tudo isso já passa pelo crivo da Controladoria Geral da União (CGU), do Tribunal de Contas da União (TCU), e o Senado e a Câmara têm as comissões de fiscalização e controle que se utilizam do próprio Tribunal de Contas da União para se atualizar em relação ao desempenho das estatais, para fiscalizar efetivamente a aplicação dos recursos. Acho que se a gente azeitar essa relação podemos melhorar ainda mais.
Repórter – O BNDES começou a divulgar dados sigilosos de empréstimos. O que o senhor acha dessa iniciativa?
Delcídio – Nós estamos discutindo há tempos a publicação dessas operações no exterior. Foi uma iniciativa correta e já podia ter sido feita antes, porque aí fica aquele mistério e todo mundo acha que tem alguma coisa escondida. Não há nada escondido. Acho que essa iniciativa é importante e proporciona um acompanhamento claro dessas ações, principalmente os investimentos do BNDES no exterior. É importante destacar que esses investimentos no exterior representam só 8% da carteira de projetos e 92% são financiamentos do banco no Brasil. Esses investimentos fora não são só para as empresas fazerem construções ou grandes obras; são pacotes de engenharia e fornecimento de equipamentos. Portanto, são projetos que geram empregos aqui no Brasil. Não podemos, em função da politização ou do debate político ideológico, questionar operações lá fora que trazem uma série de benefícios para o País. Isso não é só o Brasil quem faz, a Alemanha e outros países têm bancos com perfil do BNDES para alavancar suas indústrias e isso é absolutamente normal.
Repórter – A divulgação começou com alguns recortes. Alguns dados divulgados são de 2012, outros de 2007. Não deveria ser uma divulgação ampla? O que o senhor acha dessa divulgação?
Delcídio – Pelo entendimento, o BNDES vai abrir todas as operações, inclusive nós temos uma reunião que vamos agendar para a Comissão de Assuntos Econômicos e Comissão de Relações Exteriores para discutir com o presidente do banco, Luciano Coutinho, a estratégia ou a maneira que o BNDES vai se comportar com o Senado, com as comissões permanentes e demonstrar a transparência do banco e o desejo de bem informar a população, para suplantarmos esse debate que no meu ponto de vista, com a abertura dessas informações, finalmente, vai sair do foco e consequentemente vamos nos preocupar com os próximos projetos. Os próximos investimentos que eu espero que a presidenta Dilma Rousseff apresente já nas próximas semanas de junho.
Repórter – Se constata que as taxas de juros foram mais baixas. Houve favorecimento?
Delcídio – Depende muito de como cada projeto foi desenvolvido. Como foi construído o projeto; qual é o tipo da operação; o detalhamento; até onde vai o projeto; se é só construção; se é só engenharia ou se tem equipamento. Quer dizer, como esse projeto foi estruturado. Por isso a reunião com o presidente Luciano Coutinho nas comissões do Senado vai nos levar até esclarecer esses números e ver que cada caso é tocado de um jeito, porque há interesses comerciais brasileiros; existe uma política toda estruturada de relações exteriores com esses países. Portanto, nós temos as condições de fazer um debate positivo, isento, para melhorar a ação do BNDES com o controle do Senado e olhando para a política externa brasileira e os interesses que se abrem a investimentos brasileiros no exterior e gerando empregos aqui dentro.
Repórter – Com a divulgação desses dados diminui a necessidade de abertura de uma CPI do BNDES?
Delcídio – Eu pessoalmente acho que a partir do momento que sistematizar essa relação do Congresso com o BNDES, com transparência dessas operações, o banco tem um quadro de funcionários espetacular; é acompanhado por organismos de controle e acho que temos as condições, nessa nova relação, de fazer um trabalho transparente e compreender muito bem e acompanhar tudo o que o BNDES produz, principalmente aquilo que é a atividade de um banco de desenvolvimento.
Repórter – Há algum casuísmo da parte da oposição, dos próprios presidentes da Câmara e do Senado nesse assunto da sabatina? Pergunto porque se passar a ter sabatina para diretores de estatais não existe a possibilidade de maior contaminação política?
Delcídio – É isso que estou dizendo. Nós temos que tomar cuidado para não nos transformar, sendo presidencialistas, num regime parlamentarista, porque o parlamentarismo é o primeiro-ministro quem dá o tom e nós não chegamos nisso ainda. Nós temos que tomar cuidado porque há o risco de politização das indicações, o que no meu ponto de vista contraria o objetivo principal dos presidentes das duas casas, da Câmara e do Senado.
Repórter – Até onde o governo está disposto a ir?
Delcídio – O governo está disposto a dialogar, a conversar, a aprimorar, a qualificar essas ações. Não vejo dificuldades. Se há divergências, é das divergências e das contradições que a chegamos às melhores proposições para o País.
Marcello Antunes