Governo golpista se recusa a debater com a sociedade PEC do Fim do Mundo

Governo golpista se recusa a debater com a sociedade PEC do Fim do Mundo

Pela quinta vez consecutiva, o governo de Michel Temer proibiu a ida de representantes dos Ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil para debater os pontos da chamada PEC do Fim do Mundo, cuja essência é alterar a Constituição Federal para congelar gastos sociais na Saúde, Educação, Segurança e beneficiar os rentistas e banqueiros. A ausência da base do governo no debate democrático foi criticada pela presidenta da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). “Essa proposta é a mais importante neste momento do País. A CAE cumpre seu papel de debatê-la com os movimentos sociais, que serão os mais afetados. Por isso, nenhuma outra matéria deve ser discutida na comissão senão essa que o governo se recusa a fazer um contraponto”, afirmou. 

Na audiência desta quinta-feira (3), a CAE recebeu dois economistas, a professora da Universidade Federal do Rio Janeiro (UFRJ), Esther Dweck e Julio Miragaya, presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon). Esther, primeira a falar, apontou detalhadamente os efeitos nocivos da PEC 241 (número recebido na Câmara) e 55 (no Senado). “Essa proposta nasceu com um diagnóstico errado e o remédio vai piorar a situação ao invés de melhorar”, disse ela. O diagnóstico do governo Temer, adotado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, parte do princípio que para ajustar a política fiscal, que trata da relação entre gastos públicos e arrecadação tributária, é necessário fazer um ajuste estrutural. 

Acontece que o próprio governo Temer não explica qual é esse ajuste estrutural. “Adotaram um nome que nem o governo sabe qual é. O problema que enfrentamos é de natureza conjuntural e não estrutural”, disse Esther, ao explicar esses termos: o governo fala que o ajuste estrutural deve ser feito cortando gastos públicos. Acontece que o Estado, ou seja, é o próprio governo o indutor da recuperação econômica. Assim que o governo faz o corte de gastos públicos, outros setores da economia se afundam na recessão. 

A questão conjuntural apontada por ela diz respeito a um ajuste que deveria ser feito no andar de cima, ou seja, estabelecendo tributação maior para quem tem mais. A PEC do Fim do Mundo justamente vai jogar no colo dos trabalhadores a conta do pagamento do ajuste fiscal que a equipe do governo golpista chama de estrutural, ao invés de cobrar de quem tem mais, tributando os bancos, os especuladores e a transmissão de heranças. Ao congelar os gastos públicos em Saúde como está na PEC, por exemplo, a população poderá ficar sem alguns programas de atendimento. Os mais pobres serão os maiores prejudicados. 

No caso da Educação, o corte dos gastos pode implicar – e tudo indica que vai implicar – no fim de programas como o Prouni, o Fies, Pronatec, Ciência Sem Fronteiras e outros inclusivos, como aqueles estratégicos adotados pelos governos de Lula e Dilma que significaram o aumento de número de vagas nas universidades e a criação de novos campis e institutos federais de educação. 

Posição fechada

O professor Julio Miragaya relatou que por unanimidade o Conselho Federal de Economia tirou um posicionamento contrário ao texto da PEC do Fim do Mundo. Segundo ele, o problema fiscal do País, que consiste na queda da arrecadação tributária, não será resolvido com o corte de gastos públicos e incluindo isso na Constituição Federal. “O problema é que o governo Temer receita um remédio errado para o paciente. Ao invés de tira-lo da crise, vai piorar a situação”, observou. 

O professor disse que não há país no mundo, igual ao Brasil, que garante juros reais – acima da inflação – de quase 12% ao ano. O governo, segundo ele, quer jogar no colo dos trabalhadores e das famílias o problema da queda da arrecadação tributária, retirando os programas e políticas sociais inclusivas, com o congelamento dos gastos e liberando os gastos financeiros, para pagamento dos juros da dívida nas mãos dos banqueiros e dos rentistas.

“A renda das famílias está em queda. Ao congelar gastos sociais, liberando os gastos financeiros com o pagamento dos juros da dívida, estamos andando para trás na história. O governo atual segue regiamente recomendações de organismos internacionais que afundaram outros países, como a Itália e a Grécia, com o detalhe de retirar direitos sociais preservados na Constituição Federal”, observou. 

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) foi no foco dessa questão, ao mostrar que a PEC do Fim do Mundo é inconstitucional de ponta a ponta. “A proposta que eles querem aprovar a toque de caixa, sem discutir com a sociedade e os movimentos organizados, vai congelar o salário mínimo entre outras coisas. E isso fere uma cláusula pétrea da nossa Constituição, que é lúcida ao dizer que não haverá irredutibilidade do salário mínimo no Brasil”, disse ela. Cláusula pétrea, na Constituição, é aquela que não pode ser alterada por nada, nem por uma proposta de emenda à Constituição, nem por Medida Provisória ou por outra lei. 

Vanessa apontou que essa e outras cláusulas pétreas estão em risco com a PEC 55, do Fim do Mundo, porque a Constituição de 88 deixará de ter como marca registrada a defesa dos direitos sociais. “É uma violência que esse governo golpista está fazendo, ao querer mudar cláusulas pétreas da Constituição”, criticou. 

O senador Paulo Rocha (PT-PA) concordou com Vanessa e foi adiante, ao lembrar que o modelo do governo Temer tem como marca o desmonte de todos os ganhos sociais obtidos a partir dos governos de Lula e Dilma. A ordem do lado de lá, dos opositores, é tratorar, mas vão enfrentar os movimentos da sociedade organizada que crescem a cada dia. “Não é uma lei, uma proposta de emenda à Constituição que têm a capacidade de tirar o País da crise e promover a retomada do crescimento”, ponderou. 

Paulo Rocha disse que a imprensa conservadora, representada pelos grandes grupos de comunicação, está associada ao governo ilegítimo por omitir o debate que se faz na sociedade. “Só com muita mobilização vamos conseguir derrubar essa PEC”, conclamou, reforçando que nem na ditadura militar os governos deixavam de debater propostas tão nocivas como as contidas na PEC do Fim do Mundo. “Estão usando a imprensa para golpear a economia. A imprensa está sendo usada para esconder a verdade. Temos que assegurar a democracia, defender o verdadeiro estado social que ganhou evidência a partir dos governos de Lula e Dilma”, afirmou. 

O senador Roberto Requião (PMDB-PR) desmontou ponto a ponto as justificativas encaminhadas pelo ministro da Fazenda Henrique Meirelles aos senadores. Numa publicação pomposa, o governo faz a chantagem – ou terrorismo midiático – ao afirmar que a situação do Brasil vai piorar se a PEC não for aprovada. “Nada mais falso, segundo escreve Meirelles, dizer que a PEC traz aumento da confiança. Não é o reequilíbrio das contas que ajudará na retomada do crescimento, mas a existência de demanda efetiva na economia, isto é, o fato de os consumidores terem renda, emprego e vontade de comprar”, afirmou. 

Em conversa com jornalistas, Requião foi no ponto: não há como ter crescimento econômico quando se corta gastos públicos; não há como ter melhora da área fiscal se não mudar a tributação, cobrando dos bancos que não pagam impostos, cobrar dos mais ricos. Aí sim, de acordo com Requião, que a economia vai melhorar, e não tirando dos mais pobres como Meirelles quer fazer com seu receituário que vai matar o paciente. 

A PEC do Fim do Mundo, em outras palavras, seria como uma PEC do Brasil Colônia, porque a equipe do governo Temer quer entregar o Brasil de graça para o capital estrangeiro. “Vejamos, há outras propostas nocivas, como a permissão para a venda de terras para estrangeiros. Querem fazer o País voltar a ser uma fronteira exportadora de grãos, extinguindo a pesquisa, acabando com o pequeno produtor rural”, salientou. 

A audiência pública foi acompanhada por diversos representantes dos movimentos sociais, que puderam expor suas preocupações com a onda retrógrada que cresce no País. 

A senadora Gleisi Hoffmann convidou os representantes dos movimentos sociais para nova audiência pública que acontecerá na próxima terça-feira (8). Será promovida pela CAE e pelas comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Direitos Humanos (CDH). No dia 9, segundo Gleisi, os senadores que apoiam a PEC do Fim do Mundo querem votá-la na CCJ e encaminhá-la para o plenário. No dia 28 deste mês haverá uma audiência no plenário do Senado, para instruir a matéria. No dia 29, pretende-se votar em primeiro turno. O segundo turno de votação está previsto para acontecer dia 13 de dezembro. 

O senador Paulo Rocha conclamou os movimentos sociais para manter a mobilização contra a PEC do Fim do Mundo, dizendo que a CAE e a CDH são a trincheira da resistência contra o atraso e a perda dos direitos sociais, duramente conquistados a partir da Constituição Cidadã de 1988. 

Confira as apresentações da professora Esther Dweck, da UFRJ e de Julio Miragaya, presidente do Confecon. E as cartas públicas do Confecon sobre a PEC do Fim do Mundo: 

Marcello Antunes

 

 

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