As últimas movimentações do grupo de apoio ao golpe parlamentar que se pretende ser suave acionou uma luz de alerta entre os defensores do Estado Democrático de Direito, da democracia e da presidenta Dilma Rousseff. Causou espanto, até mesmo na mídia conservadora, a articulação do presidente interino Michel Temer, do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, do ministro afastado Romero Jucá e do líder do PMDB no Senado e pretendente a presidente da casa em 2017, Eunício Oliveira, de tentar forçar Renan Calheiros, presidente do Congresso Nacional, em acelerar, turbinar o já apressado processo de impedimento de Dilma Rousseff.
Num almoço nesta semana o prato principal era um só, sem entrada e sem sobremesa: como fazer para que a votação pelo plenário do Senado do impeachment de Dilma ocorra o mais rápido possível. Acontece que a pressa, como diz o ditado, é inimiga da perfeição e o golpe que se pretende aplicar contra Dilma e contra a vontade popular, das urnas, impõe constrangimentos a seus construtores, um atrás do outro.
Essa articulação do interino vazou para a imprensa e aumentou, ainda mais, o pé atrás de senadores que estão indecisos sobre o que virá com Temer. A amostra data até agora é de retrocesso absoluto e isso as bases dos senadores que votaram pelo impeachment já mostraram. Apesar da crise, e com todo o conjunto da obra, Dilma Rousseff é fiadora incondicional da lisura, que ela não cometeu crime de responsabilidade e graças a ela, por fim, um monte de corruptos está na cadeia.
Dilma não barrou investigações, não abusou do seu poder de presidente para estancar a Lava Jato. Respeitou a escolha do Procurador Geral da União, não mudou o comando da Polícia Federal. E desde o início do processo de impeachment, articulado por uma quadrilha parlamentar comandada por Eduardo Cunha, o deputado que está prestes a ser cassado e preso, ficou evidente um notório desvio de poder. “Tirar uma presidente da República, legitimamente eleita, porque não gostavam dela, de seu jeito. Isso é golpe contra a democracia”, repete diversas vezes seu advogado, José Eduardo Cardoso.
Na noite de ontem, por causa dessa pressa que os apoiadores do golpe tentam esconder mas não conseguem que o advogado de defesa de Dilma, os senadores Humberto Costa (PT-PE), Lindbergh Farias (PT-RJ), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Fátima Bezerra (PT-RN) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) pediram uma audiência ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
É ele quem presidirá os trabalhos de afastamento ou não de Dilma a partir da semana que vem. É ele quem estabelecerá a data, o número de testemunhas que ainda precisam ser ouvidas nesse processo surreal, malicioso e golpista por excelência. Na noite de ontem, logo após a audiência com o presidente do
Supremo, o advogado de Dilma, José Eduardo Cardozo e o senador Lindbergh Farias conversaram com a imprensa. Confira a entrevista:
Repórter – Como foi a reunião com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski?
José Eduardo Cardozo – Nós manifestamos uma preocupação de pressões que possam significar o açodamento do processo e que podem atingir a instrução. Nós manifestamos uma preocupação. O presidente do STF, Ricardo Lewandowski ouviu. Nós fizemos também algumas ponderações em relação ao rito e ele, naturalmente não decidiu nada. Ele terá uma reunião amanhã (quinta-feira, 4) com os líderes do Senado para discutir a sessão do dia 9. O presidente ouviu nossas ponderações do ponto de vista das pressões que existem para apressar o processo e recebeu também sugestões que nós fizemos sobre o rito. Ele se posicionará em momento oportuno.
Repórter – Quais sugestões?
Cardozo – Fizemos ponderações sobre prazos que darão para as respostas das testemunhas na segunda fase, prazos de intervenções. Nós indagamos sobre qual seria a forma procedimental das arguições, caso nós tenhamos testemunhas de plenário. Nós colocamos a questão do número de testemunhas, porque o correto é que se siga o tribunal do júri. Indagamos se a conexão (entre uma acusação e outra) será reconhecida para ampliação (do prazo para ouvir as testemunhas) ou não. Fizemos um conjunto de ponderações e o presidente anotou e ficou de meditar e refletir para no momento certo fazer o pronunciamento devido.
Repórter – E qual é a data ideal que vocês consideram para o início do julgamento? A gente tem aí duas datas a princípio, dia 25 e dia 29?
Cardozo – Não tenho data ideal. O que eu tenho é a necessidade de ter um processo equilibrado com direito de defesa, com respeito e sem açodamento. Nós vimos durante a tramitação no Senado – e também na Câmara – um açodamento permanente, com pessoas querendo terminar o processo a qualquer preço. Nós pedimos perícia e eles (defensores do impeachment) não queriam perícia. Nós queríamos testemunhas e eles não queriam testemunhas. Nós fizemos ponderações e eles não queriam. Há alguma razão misteriosa pela qual as pessoas querem acabar esse processo muito rapidamente e parece que as horas estão contando. Eu não sei o que está por trás disso. Há quem diga que possam surgir fatos novos, possam trazer desequilíbrio ao processo de impeachment. Será que uma eventual delação de alguém pode trazer eventuais problemas? Acho que há muita preocupação. Da nossa parte não temos essa preocupação. Queremos um processo justo, equilibrado. A data que vai iniciar será o presidente do STF quem decidirá. Agora, o que não pode é ter atropelo como existiu em vários momentos desse processo.
Repórter – Sobre o número de testemunhas, o presidente do STF ontem falou para o senador Raimundo lira (presidente da Comissão Especial do Impeachment) que seriam dez, cinco para cada lado, acusação e defesa. O que é ideal para a defesa?
Cardozo – Vai se aplicar o rito do tribunal do júri. A letra da lei diz cinco testemunhas para cada lado. O problema é que há dois delitos conexos, um sobre pedaladas e outro sobre os decretos. A jurisprudência diz que quando há situações de delitos conexos, cada fato determinaria o número de testemunhas. Com isso poderia ter a seguinte leitura, ou cinco e cinco, ou poderia ter cinco para cada decreto e cinco para pedaladas, de cada lado, somando dez. Colocamos isso ao presidente do STF e ele vai examinar. O que ele decidir será feito.
Repórter – E a questão de ter sessão no fim de semana, o presidente do STF comentou alguma coisa?
Cardozo – Não. Ele não deu nenhuma posição. Nós manifestamos o desejo de que não exista açodamento. Essa coisa olímpica de varar horas, sem almoço, com uma pressa de terminar o processo não é razoável. As pessoas devem estar em condições de ouvir as testemunhas; em condições de debater, de meditar. Isso não pode ser uma situação como uma gincana. Vamos acabar a qualquer preço, não é assim que se conduz um processo. Então, nós fizemos essa ponderação a ele. O presidente Lewandowski é uma pessoa que tem se comportado com bastante imparcialidade, com bastante correção, ora acatando pretensões da defesa, ora negando. Ele busca se comportar com muito equilíbrio e nós acreditamos que ele também o fará nessa fase.
Repórter – Amanhã (quinta-feira, 4) tem essa reunião com os líderes (Lewandowski e os senadores). Se ele só vai decidir depois de terça-feira, depois dessa reunião, o que o senhor espera?
Lindbergh Farias (PT-RJ) – A reunião de amanhã (quinta-feira, 4) é sobre a pronuncia, que vai ser votada na terça-feira, dia 9. A gente já sabe que na comissão, amanhã, vai ser aprovada (relatório do senador Antônio Anastasia, do PSDB, para que prossiga o processo). Nós vamos ter cinco votos (na comissão especial do impeachment), e vai ser votada a pronuncia na terça-feira. Nossa discussão é sobre a pronuncia. A gente só vai ter reunião para discutir sobre o julgamento depois da decisão da pronuncia. Agora, aqui (no STF), a gente reclamou da interferência indevida, na nossa avaliação, do presidente interino Michel Temer.
Quem marca a data do julgamento é o presidente do Supremo. Não é o presidente do Senado, Renan Calheiros, porque ontem (terça-feira, 2) teve um almoço do presidente interino Michel Temer, com o presidente do Senado, Renan Calheiros, com Romero Jucá, e com o líder do governo Eunício Oliveira, e o Renan Calheiros saiu anunciando a data, anunciando testemunhas. Não é isso. São 48 horas de pressão indevida do presidente interino Michel Temer. O discurso de Romero Jucá – é preciso que se deixe claro – é o presidente do Supremo quem vai marcar a data do início do julgamento.
Repórter – O senhor perguntou a ele (Lewandowski) sobre essa pressão?
Lindbergh – Ele (Ricardo Lewandowski) está tranquilo. Disse que sabe das funções dele. O que ficou muito claro é que ele quer discutir primeiro a pronuncia. Ele só vai discutir a outra fase depois de aprovada a pronuncia pelo plenário do Senado Federal.