Em dez anos, número de alunos especiais em universidades cresceu sete vezes, mas falta capacitação de docentes
Primeiro jovem com síndrome de Down aprovado no vestibular da Universidade Federal de Goiás, Kallil Assis Tavares começou a assistir às aulas do curso de Geografia há uma semana, e o sucesso dele mostrou que a capacidade de aprendizado de pessoas com necessidades especiais às vezes surpreende até os pais. A prova está no aumento do número de pessoas com algum tipo de deficiência matriculadas em cursos de graduação, que saltou de 2.173 em 2000 para 16.328 em 2010, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), órgão do Ministério da Educação (MEC).
Os dados incluem pessoas com todo tipo de deficiência, como visual, auditiva e intelectual. A maioria (cerca de 10 mil) estuda na rede privada.
Na educação básica (ensinos infantil, fundamental e médio), havia 808 mil pessoas com necessidades especiais matriculadas em escolas especiais e regulares em 2010, de acordo com o Inep. A maioria estudava em classes comuns do ensino regular (526 mil). Em classes especiais dentro de escolas regulares, estudavam 54 mil alunos e em escolas exclusivas especializadas, 227 mil pessoas.
No Rio, capacitação de professores ainda é baixa
O MEC tem estimulado que crianças e adolescentes com deficiência frequentem o ensino fundamental e médio em uma escola regular e tenham aulas de apoio em escolas especializadas ou em salas multifuncionais. Porém, no Rio, segundo o sindicato de professores e pais de alunos, ainda há professores sem o treinamento adequado para dar aula para pessoas com deficiência em turmas regulares (onde também estudam pessoas que não têm deficiência).
– Muitos profissionais não têm nenhum tipo de formação para atender alunos com deficiência, nem de Libras (língua brasileira de sinais), nem de nada. Então o que acontece é a exclusão e não a inclusão – afirma a professora e coordenadora na capital do Sindicato Estadual de Profissionais de Educação do Rio de Janeiro, Susana Gutierrez.
A subsecretária de Ensino da Secretaria municipal de Educação do Rio, Helena Bomeny, admite que é possível haver professores não treinados nas escolas regulares e disse que a capacitação está sendo feita.
– O professor não preparado deve solicitar um estagiário para ajudá-lo e pedir para participar de curso de capacitação, que é feito ao longo do ano. E, durante o ano letivo, o Instituto Helena Antipoff (órgão da prefeitura que tem profissionais especializados para dar suporte a pessoas com deficiência) acompanha as escolas onde há alunos com deficiência – afirma a subsecretária.
Segundo Helena, a prefeitura vem respeitando a escolha dos pais dos alunos: os estudantes podem frequentar as aulas numa classe só para pessoas com deficiência dentro de uma escola regular ou numa classe para pessoas com e sem deficiência. Vai depender da decisão dos pais.
Há pais que preferem que os filhos estudem em classes só com pessoas com deficiência.
A professora aposentada Selma Nascimento diz que sua filha, Tamires Nascimento, hoje com 20 anos e com autismo, só se desenvolveu quando foi para uma classe onde só há pessoas com deficiência. Segundo ela, o aprendizado da jovem não progrediu quando ela estudou numa escola particular regular.
– Dentro da classe especial, ela se viu entre iguais, se viu crescendo, tem amigos, sabe ler, escrever e fazer contas – destaca Selma.
Outros pais preferem que os filhos estudem em classes com pessoas sem deficiência.
– O ambiente te dá mais de 50% do aprendizado na vida. Na escola regular, ele vivencia todo o padrão regular da idade dele, os costumes, vê o outro sempre como um desafio – afirma Vilma de Carvalho Sestaro, mãe de Samuel Carvalho Sestaro, que tem síndrome de Down.
De acordo com a fundadora da organização não governamental Escola de Gente, Claudia Werneck, escolas e salas de aula verdadeiramente inclusivas têm que dar conta das especificidades das crianças com todo o apoio necessário. E chegar a uma escola inclusiva, na opinião dela, é algo que se se consegue aos poucos.
– Como eu mantenho as pessoas com deficiência fora da escola e acho que a escola vai se preparar para uma criança com um autismo imaginário? É como um músculo, o exercício da escola inclusiva é diário – analisa.
Além de profissionais mais qualificados, pais de crianças com deficiência também pedem escolas com espaço físico e material didático mais adequado. Mãe da deficiente visual Giovanna Zuttion, de 13 anos, a paulista Dalva Zuttion reclama que a escola pública onde a filha estuda deveria estar melhor preparada.
– Até agora, a minha filha não recebeu apostilas adaptadas em braile. E eles não dão mobilidade para ela dentro do colégio, ela anda com a ajuda das amigas. Na escola há rampas, mas não existem placas, e o piso está todo solto – afirma Dalva.
Fonte: O Globo