Na mídia: Ana Rita lamenta falta de profundidade da minirreforma política

Na mídia: Ana Rita lamenta falta de profundidade da minirreforma política

 

“Dados os limites já sabidos da atual composição
do Congresso Nacional em relação a esse tema,
é imprescindível a convocação de uma Assembleia
Constituinte sobre a reforma política”

A senadora Ana Rita (PT-ES) faz severas críticas à minirreforma política, em artigo publicada na edição desta sexta-feira (20) do jornal Correio Braziliense. Com citação da máxima do filósofo Lampedusa – “Mudar para continuar como antes” -, a senadora acha “lamentável” que as discussões tenham se limitado a questões superficiais. “Essas são apenas alterações periféricas, que não enfrentarão o atual quadro de desigualdades a que estão submetidos os pleitos eleitorais”, defende a petista no texto.

O projeto de minirreforma aprovado na última segunda-feira (16) no plenário, basicamente, regula apenas regras de campanha, como tamanho de adesivos e a diminuição dos cabos eleitorais. O ideal, segundo Ana Rita, era que a proposição tivesse incluído definições sobre o financiamento de campanha e regras que fortalecessem os partidos.

“Dados os limites já sabidos da atual composição do Congresso Nacional em relação a esse tema, é imprescindível a convocação de uma Assembleia Constituinte sobre a reforma política”, afirmou. “A voz das ruas pediram uma ampliação efetiva dos atuais limites da democracia e a minirreforma em discussão não dá conta desses anseios”, finalizou.

Leia a íntegra do artigo:

“Por uma reforma política que aprofunde a democracia”

O projeto de minirreforma eleitoral em discussão no Senado, pelo conteúdo, parece-me que servirá para reforçar a velha máxima: “Mudar para continuar como antes”. Ao mesmo tempo do projeto de lei do Senado, diversas propostas estão sendo apresentadas. Segundo os autores, objetivam reduzir gastos de campanhas eleitorais, aumentar a transparência no processo e garantir igualdade de condições aos candidatos em disputa.

É lamentável que estejamos nos limitando à discussão do tamanho de adesivos, da proibição ou não de placas e da pintura de muros em propriedades particulares, de regras para envelopamento de carros e outros bens particulares móveis, ou mesmo — num aspecto importante, mas insuficiente — com a diminuição do número de cabos eleitorais nas eleições. Essas são apenas alterações periféricas, que não enfrentarão o atual quadro de desigualdades a que estão submetidos os pleitos eleitorais.

Se essa minirreforma é uma tentativa do parlamento de responder à voz das ruas, que clama por uma reforma política profunda no Brasil, fica a impressão de que os questionamentos não foram bem interpretados.

Estou convencida de que a questão central do debate apresentada pelas ruas diz respeito às distorções presentes no atual modelo de representatividade, com peso gigantesco do setor econômico, presença inexpressiva da diversidade social brasileira no parlamento, além da insuficiência de mecanismos de participação social direta nas decisões políticas do país.

Dados do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) revelam a profunda distorção do atual sistema político brasileiro. Dos 594 parlamentares eleitos em 2010, 273 são empresários (246 deputados e 27 senadores), 160 compõem a bancada ruralista (142 deputados e 18 senadores), 73 são da bancada evangélica (três senadores e 70 deputados), e apenas 72 parlamentares (64 deputados e oito senadores) são considerados representantes dos trabalhadores, da bancada sindical.

A sub-representação atinge também as mulheres, que representam apenas 9% dos 513 deputados e 12,3% num universo de 81 senadores. Isso, sem mencionar a presença ínfima de negros, homossexuais, indígenas, ou mesmo de pobres no parlamento. São questões apontadas há muito tempo por várias organizações populares e amplificadas pelo movimento de junho a que, infelizmente, o perfil conservador e elitista do parlamento brasileiro tem demonstrado incapacidade de responder.

A resistência que parte significativa dos congressistas tem demonstrado à proposta de constituinte exclusiva e plebiscito demonstra a enorme dificuldade de conviverem e conjugarem o exercício parlamentar com participação direta da sociedade na construção da cidadania. Há uma dificuldade latente em romper com os atuais entraves que limitam a nossa jovem democracia.

Esse quadro revela que medidas consistentes, capazes de corrigir as distorções presentes no atual sistema político e eleitoral, dificilmente serão tomadas pelo Congresso brasileiro, por uma razão muito simples: parte significativa dos parlamentares são fruto e decorrência do atual modelo.

Uma verdadeira reforma política deve ser capaz de aprofundar a democracia e isso invariavelmente passa por tocar em alguns pontos que são fundamentais nesse debate.

O primeiro deles é combater o personalismo, fortalecendo as organizações partidárias assentadas em programas e projetos de sociedade. É fundamental ampliar os mecanismos que possibilitem a participação de seus filiados, aumentando a democracia interna e a transparência na gestão de seus recursos.

Segundo, é o fim do financiamento privado de campanhas eleitorais. Em nossa opinião, a porta de entrada para a corrupção. Esse devia ser o ponto central de qualquer debate sobre reformas do atual sistema político nacional. Os inúmeros casos de corrupção apontam que o atual sistema produz o político corrupto em uma ponta, e, na outra, o corruptor, ávido para receber benesses do Estado.

Terceiro, a adoção de lista preordenada com paridade de gênero, o que possibilitará a ampliação da presença das mulheres, um dos segmentos sociais hoje sub-representados no parlamento e nos espaços de poder.

Por fim, dados os limites já sabidos da atual composição do Congresso Nacional em relação a esse tema, é imprescindível a convocação de uma Assembleia Constituinte sobre a reforma política.

A voz das ruas pediram uma ampliação efetiva dos atuais limites da democracia e a minirreforma em discussão não dá conta desses anseios. Isso só será possível a partir de intensa participação da sociedade, quem de fato deve protagonizar as mudanças.

* Artigo originalmente publicado no jornal Correio Braziliense

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