Donizeti: aperfeiçoar sempre a lei para garantir processo democrático com lisura, equidade e oportunidades para todosA noite histórica em que o Senado Federal decidiu pelo fim do financiamento empresarial nas campanhas eleitorais, tanto para partidos quanto para candidatos, teve momentos memoráveis. Do lado daqueles que defendiam a manutenção da “doação” de dinheiro de pessoas jurídicas para seus candidatos escolhidos, a falta de argumentos convincentes era mais do que patente – era escandalosa. Sem ter o que dizer para 79% dos eleitores contrários ao financiamento empresarial, segundo pesquisa Datafolha de julho passado, parlamentares do PSDB e do DEM recorreram novamente aos pobres argumentos que alimentam a demonização do PT e a desmoralização de toda a classe política como um todo.
O senador José Serra, por exemplo, tentou relacionar o crescimento do número de sindicatos como prova de que o fim da doação empresarial iria beneficiar os partidos mais próximos das organizações de trabalhadores, procurando induzir os demais senadores à conclusão de que o imposto sindical, “é óbvio”, pontuou ele, “abre uma fonte de financiamento informal de campanha que não é propriamente de pessoa física, não é de pessoa jurídica”.
Sua argumentação, entretanto, era falsa. Quem chamou a atenção para a tentativa de engodo foi a senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM). Os sindicatos, disse ela, são Pessoas Jurídicas, e, portanto, também estariam proibidos de financiar campanhas eleitorais. A senadora Vanessa estava certa. Um sindicato legalmente reconhecido pelo Ministério do Trabalho – primeira condição para ter acesso ao Imposto Sindical (a fonte de financiamento, segundo Serra) – deve fazer parte do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (CNES). A inclusão nesse cadastro, por sua vez, exige que o sindicato apresente seu número no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ). Como o texto aprovado coíbe qualquer “doação” de pessoa jurídica, os sindicatos não poderão destinar dinheiro para as campanhas eleitorais.
O senador tucano não retrucou – e nem poderia.
Outro senador que usou argumentos falsos para justificar seu voto contra a maioria do que quer o eleitorado foi Ronaldo Caiado (DEM-GO). Para ele, os empresários deveriam continuar livres para “doar” dinheiro para candidaturas para, por exemplo, evitar que o Brasil caminhe para o bolivarianismo – uma das mais arrematadas bobagens criadas pela campanha de ódio na disputa política. À sua maneira, foi ainda mais profundo. “Quantos me apoiam amanhã porque não querem que o Exército brasileiro seja o exército do Stédile como quer o PT? Quantos me apoiam hoje porque não querem que seja a CUT que vai se entrincheirar de armas nas mãos, poder receber o dinheiro da propina dos “Baruscos” e distribuir entre os seus sindicalizados e membros do MST, para depositar na conta de campanha de seus simpatizantes? Por isso, não tem credibilidade nenhuma o PT para vir aqui tentar demonizar a prática que tem, sim, lá o CNPJ, tem identidade da empresa, o repasse que foi feito e todos nós poderemos saber como cada parlamentar vai votar”.
A resposta à confusa argumentação do senador demista também não tardou a vir. Coube ao senador do PT de Tocantins, Donizeti Nogueira, dar a resposta, acrescentando outro discurso memorável da histórica noite de votação no Senado.
“Embora eu esteja tentado a entrar no debate rasteiro, mesquinho e mentiroso que tenta atribuir ao PT a responsabilidade por tudo que acontece nas eleições, vou tentar falar daquilo que ouço das ruas. E, nas ruas, segundo pesquisa Datafolha, três em cada quatro brasileiros não admitem financiamento de empresas às campanhas eleitorais”, iniciou Donizeti. Também é preciso deixar claro que, aqui, nesta Casa de homens e mulheres honrados, não há nenhuma Madre Teresa de Calcutá. É preciso dizer que, no livro sobre as estratégias de construção da organização da Madre Teresa de Calcutá, há uma orientação que ela deixou para suas seguidoras: às vezes, é preciso dialogar com o diabo para alcançar os anjos. É isso que penso. É o que cada homem e cada mulher que estão aqui, na sua carreira política, nesse modelo de financiamento de campanha, acabam fazendo: dialogam com o sistema podre de financiamento de campanha, que nós temos a oportunidade de barrar agora.
Ao reconhecer o esforço do presidente da Comissão Especial da Reforma Política, Jorge Viana, e do relator da proposta que seria votada para baratear as campanhas eleitorais, acrescentou:
“Não adianta vir aqui querer tapar o sol com a peneira, dizendo que a responsabilidade é de A ou B, pois a responsabilidade é de todos. Todos que participam de campanha conhecem como funciona o sistema. Negar isso é mentir para a sociedade brasileira, é mentir para o povo brasileiro! Negar isso e atribuir a responsabilidade ao Partido dos Trabalhadores é mentir para a sociedade brasileira! A democracia está a exigir de nós um ato de responsabilidade na mudança e no aprofundamento dessa reforma política, para que a gente melhore a convivência do cidadão com os políticos. (…) Não será suficiente, certamente, o que vamos aprovar aqui, não aceitando doação de empresas privadas, mas é um bom começo, e haveremos de aperfeiçoar a cada dia os instrumentos da lei que possam garantir o processo democrático com lisura, com equidade e com oportunidades para todos”.
O Senado deu o “bom começo”. Por 36 votos a favor contra 31, proibiu o financiamento empresarial de campanhas de partidos ou candidatos.