Fotos: Alessandro DantasGiselle Chassot
21 de novembro de 2016 | 14h43
A PEC da Maldade (PEC 55) irá muito além do congelamento dos gastos públicos por 20 anos. Abrirá caminho para outras maldades, superlativas, como a reforma da Previdência, onde se prevê novas regras para os “contratos” já firmados entre o governo – que arrecada para fazer os pagamentos no futuro – e os trabalhadores – que contribuem na esperança de receber uma quantia que será reduzida. No escopo da PEC da Maldade, novas regras virão não só para a Previdência, mas para a securitização das dívidas dos estados e para a distribuição dos recursos do Orçamento, e até para uma reforma trabalhista.
O alerta foi feito por representantes de federações e confederações de trabalhadores e especialistas em Previdência Social que participaram, na manhã desta segunda-feira (21), de audiência pública conjunta das Comissões de Direitos Humanos (CDH) e de Assuntos Econômicos (CAE). O debate sobre as consequências da limitação de gastos públicos por 20 anos, prevista pela PEC 55, foi realizado por iniciativa dos senadores petistas Paulo Paim (RS) e Gleisi Hoffmann (PR).
Especialistas
“A PEC é uma espécie de operação de cerco e aniquilamento”, definiu Guilherme Costa Delgado, pesquisador aposentado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Especialista em Política de Desenvolvimento e Previdência Rural. Ele explicou que, embora os gastos previdenciários não possam ser submetidos à correção pela inflação do ano anterior, está claro que, atrelada à aprovação da proposta está a famigerada reforma da Previdência.
“Tem uma operação maligna aí”, destacou Delgado. Para ele, a maior das crueldades que está sendo engendrada contra os trabalhadores brasileiros é a retirada do artigo 201 da Carta Magna (sobre Previdência Social) que trata da vinculação entre o piso das aposentadorias e o salário mínimo. Sem essa garantia, será possível rebaixar o piso previdenciário por uma simples canetada de qualquer ministro da Fazenda, por meio de uma portaria. Isso afetaria 70% dos benefícios pagos pela Previdência, cujo valor é o piso. Assim, o governo de plantão economizaria o equivalente a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do País.
O especialista acredita que seja essa a grande “carta na manga” do governo Temer. Embora visivelmente inconstitucional, foi isso que ele conseguiu visualizar nas entrelinhas do texto e das declarações dos ministros do governo Temer. Também vendo o que está tacitamente dito no texto da PEC, o vice-presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB/DF, Diego Cherulli, disse que a tendência do projeto é possibilitar novas reformas previdenciárias que restrinjam direitos sob o argumento de que os benefícios estão “estourando” o teto previsto.
Congelamento de todas as despesas que interessam à população
A PEC da Maldade não trata de controle de gastos e sim de criação de um teto para as despesas primárias. E despesas primárias são todas as que interessam para a população, relacionadas à prestação de serviços públicos e à própria manutenção do Estado. “A PEC deixa de fora as despesas financeiras que já consomem quase a metade dos recursos públicos federais a cada ano”, demonstrou a Coordenadora Geral da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, Maria Lúcia Fattorelli. “Quem seria contra controlar gastos? O que a grande mídia e esse discurso mentiroso do governo estão fazendo é enganar a população”, protestou.
Maria Lúcia Fattorelli disse que é por causa da Previdência Social que não se chegou à total miséria no País. E é justamente sobre a Previdência que o governo lançará suas garras caso a PEC 55 seja aprovada. O texto, segundo ela, concentra sua preocupação com o mercado financeiro.
Para o presidente em exercício da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), João Marcos de Souza, uma vez aprovado o texto da PEC 55, o Brasil corre o risco de ver, depois, uma reforma de Previdência que terá como consequência o retorno à aposentadoria miserável que tínhamos no passado.
Lançamento
A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) lança nesta segunda-feira (21) um panfleto com uma carta aos senadores explicando por que a PEC 55 é um golpe contra os trabalhadores. Floriano Martins de Sá Neto, vice-presidente da entidade, disse que a Previdência precisa ser mais inclusiva, e não exclusiva. A previdência do trabalhador rural já avançou muito nesse sentido, é um exemplo, mas ainda há o que fazer, em sua avaliação.
Argumentos fáceis
De acordo com a senadora Gleisi Hoffmann, que presidiu o debate juntamente com o senador Paulo Paim, as audiências públicas são um importante canal para a população saber do que verdadeiramente trata a PEC da Maldade e o que está sendo articulado no País. “Como o governo tem usado argumentos fáceis, tentando convencer que o Estado é como a casa da gente, acaba convencendo uma parcela da população de que é uma medida justa. Ter esclarecimento de especialistas que entendem profundamente do assunto ajuda a esclarecer a população e convencer os senadores”, afirmou.
O líder da Oposição, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), enfatizou que é necessária uma grande mobilização contra a PEC. “Sem isso, vai ser difícil reverter os votos aqui no Senado”, observou. Ele lembrou que, nesta terça-feira (22), o plenário do Senado se transformará em Comissão Geral para tratar do tema.
A votação do texto em primeiro turno está prevista para o próximo dia 29. O segundo turno está marcado para o dia 13 de dezembro. As frentes de oposição, os movimentos sociais, estudantis e sindicais também querem que haja um referendo sobre a PEC 55, caso ela seja aprovada.
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