“Eu sou o chefe da PF. Em qualquer caso que tenha repercussão interestadual ou internacional, a competência de investigar é da PF”.
“Não recebi um papel de embrulho com meia |
O ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, falou, na manhã desta terça-feira (03), à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado sobre as investigações do esquema de corrupção no sistema do metrô e trens de São Paulo. Ele criticou as tentativas de intimidação contra a Polícia Federal e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), “órgão republicanos encarregados de investigar”, respectivamente, casos de corrupção e de formação de cartel e rebateu os ataques às providências que adotou para esclarecer as denúncias.
“Não sou um engavetador. Recebi os documentos e mandei a PF investigar. É isso que faz um Ministro da Justiça. Tomei conhecimento de um possível crime, se tivesse ignorado, teria cometido o crime de prevaricação”, afirmou Cardozo. Ele se referia diretamente à afirmação do deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP), que sugeriu que, ao receber os documentos, Cardozo os “rasgasse e pisasse em cima”. As denúncias de pagamento de propina colocam sob suspeição exatamente a cúpula dos governos tucanos em São Paulo
“Quem tentou intimidar o CADE e a PF, esqueça”, garantiu o ministro aos senadores, durante a audiência pública convocada por requerimento do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que, segundo notícias divulgadas na imprensa, estaria envolvido nos fatos ora em apuração pela PF. O senador tucano, no entanto, não contestou nenhuma declaração do ministro.
O ministro Cardozo entregou à CCJ cópias dos documentos que ensejaram a abertura do inquérito e explicou aos senadores que as investigações correm em segredo de justiça, portanto não poderia citar fatos além dos que já foram veiculados pela imprensa. Ele fez duras críticas aos vazamentos dessas informações, que também já estão sendo investigados, para identificar a origem. “Vazamento é ruim para qualquer investigação, prejudica o curso dos procedimentos, além de atingir a honra de pessoas que têm todo o direito à presunção da inocência”, afirmou.
Segundo o relato do ministro, o caso Siemens não começou no Brasil. A empresa foi e continua sendo investigada em 12 países – entre eles a Suíça, a Grã-Bretanha, a Alemanha e os Estados Unidos — por formação de cartéis e práticas de suborno. Na Suíça, já há brasileiros condenados pela formação de cartel. Em função disso, a empresa adotou uma postura de compliance, uma espécie de ajustamento de conduta, para evitar punições legais.
Citado no caso, o senador Aloysio Nunes não |
No Brasil, a Siemens procurou o Cade, para fazer um acordo de leniência, que equivale, no âmbito desse órgão, a uma delação premiada na esfera criminal. Além da adoção de uma política de reparação de erros, o acordo também consiste em colaboração com as autoridades na apuração dos ilícitos e na substituição de dirigentes, entre outras. Nesse acordo, a Siemens reconheceu a prática de cartel e apresentou uma série de documentos para subsidiar as futuras investigações e as operações de busca e apreensão. Fora o inquérito noticiado pela imprensa, há outros dois em curso, que também correm em segredo de justiça.
O ministro relatou que desde 2008 está em curso um inquérito investigando a empresa Alston, que mantém forte conexão com os fatos apurados em torno da Siemens. Em maio de 2013, o ex-deputado estadual Simão Pedro (PT-SP) procurou Cardozo e passou às mãos do ministro o conjunto de documentos que teve parte de seu teor divulgado pela imprensa. O material foi entregue à Polícia Federal para ser investigado.
Embora não pudesse falar sobre o teor do material, devido ao segredo de justiça, Cardozo descreveu esse conjunto de documentos. Ele tem 16 tópicos, entre eles um histórico, onde o autor narra fatos, explica como tomou conhecimento deles e sugere que poderia ter sido colaborador da Siemens. O autor da denúncia, embora se mantenha anônimo, reivindica um cargo numa empresa pública para seguir com as denúncias. Ele também descreve o modus operandi do esquema, sugere providências, dá pistas claras para operações de busca e apreensão, planilhas, contratos e fotos. “Também consta do documento uma relação de políticos que supostamente estariam envolvidos nesses fatos. A citação de vários desses nomes me causou espanto, pois ali estão pessoas por quem tenho enorme respeito, alguns deles meus amigos pessoais”, disse Cardozo.
Ele também rebateu as críticas de representantes da oposição, segundo as quais não deveria ter remetido os documentos à Polícia Federal. “Eu sou o chefe da PF. Em qualquer caso que tenha repercussão interestadual ou internacional, a competência de investigar é da PF. Não recebi um papel de embrulho com meia dúzia de palavras, mas um conjunto de documentos muito detalhado, com contratos e planilhas. Não cabe ao ministro da Justiça fazer juízo de valor sobre o material. Cabe cumprir a lei e repassar à PF, que é quem está investigando, inclusive a autoria das denúncias”.
Eduardo Cardozo ainda respondeu ao senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB, que disse na semana passada que o ministro não teria mais “condições de liderar as investigações”. O ministro observou que, embora seja o chefe da PF, não lidera nem comanda as investigações. “Pode pedir a investigação, mas quem comanda é o delegado de polícia, que, neste caso, já cuidava disso desde 2008”, destacou.
Cyntia Campos
Leia mais: