O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, Srª Senadora, Srs. Senadores, apresento requerimento, nos termos do art. 218, do Regimento Interno, para inserir em ata voto de pesar pelo falecimento do visionário e criativo empresário do setor de informática Steven Paul Jobs, co-fundador, presidente e, até agosto passado, diretor-executivo da companhia Apple, ocorrido ontem, 5 de outubro, na cidade de Palo Alto, Califórnia, em decorrência de um câncer pancreático, contra o qual lutava desde 2004, bem como a apresentação de nossas homenagens e condolências a sua esposa, Laurene Powell Jobs, a suas filhas Erin, Eva e Lisa, ao seu filho, Reed, e aos diretores e funcionários da companhia Apple.
O empresário norte-americano Steve Jobs, nascido em 24 de fevereiro de 1955 e falecido ontem, 5 de outubro, presidente e diretor executivo da Apple, deixa a todos nós um grande exemplo de vida. Gênio criativo, homem de visão, foi responsável por levar a Companhia Apple à posição de empresa mais valiosa do mundo. Além de co-fundador e presidente da Apple, foi também diretor-executivo da empresa de animação por computação gráfica Pixar e o maior acionista individual da Companhia Walt Disney.
A Apple postou em seu site as seguintes palavras de despedida: “A Apple perdeu um visionário e um gênio criativo. Os que tiveram a sorte de conhecer Steve e de trabalhar com ele perderam um amigo querido e um mentor que os inspirava. Steve deixa uma empresa que só ele poderia ter criado. Seu espírito será sempre a base da Apple.”
Steven Paul Jobs foi um dos responsáveis pela existência de um número significativo de aparelhos eletrônicos que caracterizam o nosso cotidiano, aparelhos esses que não estavam presentes aqui, há vinte ou trinta anos. Quando eu, por exemplo, em 1983, cheguei aqui, ao Congresso Nacional, como Deputado Federal, ou mesmo em 1990, quando Senador pela primeira vez, não estavam aqui os computadores em nossas mesas. Não tínhamos todos aparelho celular, iPad, iPod, Mac, todas essas coisas – iPhone, iPad, iPod, Mac, iTunes, celulares com cada vez maior capacidade de prestar serviços que têm facilitado enormemente as nossas vidas.
Desde ontem, quando anunciada a sua morte, dezenas de milhões de pessoas no mundo estão registrando, comovidas, suas mensagens de homenagem e agradecimento a Steve Jobs. Não sendo uma estrela da música nem do cinema, tampouco um atleta ou um político de renome mundial – era empresário –, sua morte consternou todo o mundo. Quero muito recomendar a todos, sobretudo aos mais jovens, que possam assistir, no YouTube, ao seu belo discurso, como patrono, aos formandos da Universidade de Harvard, em 2005, quando Steve Jobs falou de suas experiências de vida, destacando três histórias. Senadora Ana Amélia, eu quero muito recomendar a V. Exª, a todos os presentes e aos que nos ouvem que acessem esse pronunciamento tão belo, cujas palavras aqui pronunciarei:
“Eu abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei enrolando por mais 18 meses antes de realmente abandonar a escola [ele aqui está destacando como ‘ligar os pontos’]. E por que eu a abandonei? Tudo começou antes de eu nascer. Minha mãe biológica era uma jovem universitária solteira que decidiu me dar para a adoção. Ela queria muito que eu fosse adotado por pessoas com curso superior. Tudo estava armado para que eu fosse adotado no nascimento por um advogado e sua esposa. Mas, quando eu apareci, eles decidiram que queriam mesmo uma menina.
Então, meus pais, que estavam em uma lista de espera, receberam uma ligação no meio da noite com uma pergunta: ‘Apareceu um garoto. Vocês o querem?’ Eles disseram: ‘É claro.’
Minha mãe biológica descobriu mais tarde que a minha mãe nunca tinha se formado na faculdade e que o meu pai nunca tinha completado o ensino médio. Ela se recusou a assinar os papéis da adoção.
Ela só aceitou meses mais tarde quando os meus pais prometeram que algum dia eu iria para a faculdade. [O que aconteceu?] E,17 anos mais tarde, eu fui para a faculdade. Mas, inocentemente [disse Steve Jobs] escolhi uma faculdade que era quase tão cara quanto Stanford. E todas as economias dos meus pais, que eram da classe trabalhadora, estavam sendo usadas para pagar as mensalidades. Depois de seis meses, eu não podia ver valor naquilo.
Eu não tinha ideia do que queria fazer na minha vida e menos ideia ainda de como a universidade poderia me ajudar naquela escolha. E lá estava eu, gastando todo o dinheiro que meus pais tinham juntado durante toda a vida. E então decidi largar e acreditar que tudo ficaria ok.
Foi muito assustador naquela época, mas, olhando para trás, foi uma das melhores decisões que já fiz. No minuto em que larguei, eu pude parar de assistir às matérias obrigatórias que não me interessavam e comecei a frequentar aquelas que pareciam interessantes. Não foi tudo assim romântico. Eu não tinha um quarto no dormitório e por isso eu dormia no chão do quarto de amigos. Eu recolhia garrafas de Coca-Cola para ganhar 5 centavos, com os quais eu comprava comida. Eu andava 11 quilômetros pela cidade todo domingo à noite para ter uma boa refeição no templo hare-krishna. Eu amava aquilo.
Muito do que descobri naquela época, guiado pela minha curiosidade e intuição, mostrou-se mais tarde ser de uma importância sem preço. Vou dar um exemplo: o Reed College oferecia naquela época a melhor formação de caligrafia do país. Em todo o campus, cada pôster e cada etiqueta de gaveta eram escritas com uma bela letra de mão. Como eu tinha largado o curso e não precisava frequentar as aulas normais, decidi assistir às aulas de caligrafia. Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o que torna uma tipografia boa. Aquilo era bonito, histórico e artisticamente sutil de uma maneira que a ciência não pode entender. E eu achei aquilo tudo fascinante.
Nada daquilo tinha qualquer aplicação prática para a minha vida. Mas 10 anos mais tarde, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh, tudo voltou. E nós colocamos tudo aquilo no Mac. Foi o primeiro computador com tipografia bonita. Se eu nunca tivesse deixado aquele curso na faculdade, o Mac nunca teria tido as fontes múltiplas ou proporcionalmente espaçadas. E, considerando que o Windows simplesmente copiou o Mac, é bem provável que nenhum computador as tivesse.
Se eu nunca tivesse largado o curso, nunca teria frequentado essas aulas de caligrafia, e os computadores poderiam não ter a maravilhosa caligrafia que eles têm. É claro que era impossível conectar esses fatos olhando para frente quando eu estava na faculdade. Mas aquilo ficou muito, muito claro olhando para trás 10 anos depois.
De novo, você não consegue conectar os fatos olhando para frente. Você só os conecta quando olha para trás. Então tem que acreditar que, de alguma forma, eles vão se conectar no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa – sua garra, destino, vida, karma ou o que quer que seja. Essa maneira de encarar a vida nunca me decepcionou e tem feito toda a diferença para mim.
A segunda história destacada por aquele maravilhoso discurso que me foi chamar a atenção por um amigo, Philippe Van Parijs, lá da Bélgica, destacada por Steve Jobs, diz respeito ao amor e perda. No seu discurso aos formandos de Stanford, disse ele, era em 2005:
“Eu tive sorte porque descobri bem cedo o que queria fazer na minha vida. Woz e eu começamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha 20 anos. Trabalhamos duro e, em 10 anos, a Apple se transformou em uma empresa de 2 bilhões de dólares e mais de quatro mil empregados. Um ano antes, tínhamos acabado de lançar nossa maior criação — o Macintosh — e eu tinha 30 anos. E ai eu fui demitido.”
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Srª Presidenta, se puder me dar cinco minutos a mais, vai ter a certeza que valerá a pena.
“Como é possível ser demitido da empresa que você criou? Bem, quando a Apple cresceu, contratamos alguém para dirigir a companhia. No primeiro ano, tudo deu certo, mas com o tempo nossas visões de futuro começaram a divergir. Quando isso aconteceu, o conselho de diretores ficou do lado dele. O que tinha sido o foco de toda a minha vida adulta tinha ido embora e isso foi devastador. Fiquei sem saber o que fazer por alguns meses.
Senti que tinha decepcionado a geração anterior de empreendedores. Que tinha deixado cair o bastão no momento em que ele estava sendo passado para mim. Eu encontrei David Peckard e Bob Noyce e tentei me desculpar por ter estragado tudo daquela maneira. Foi um fracasso público e eu até mesmo pensei em deixar o Vale do Silício.
Mas, lentamente, eu comecei a me dar conta de que eu ainda amava o que fazia. Foi quando decidi começar de novo. Não enxerguei isso na época, mas ser demitido da Apple foi a melhor coisa que podia ter acontecido para mim. O peso de ser bem-sucedido foi substituído pela leveza de ser de novo um iniciante, com menos certezas sobre tudo. Isso me deu liberdade para começar um dos períodos mais criativos da minha vida. Durante os cinco anos seguintes, criei uma companhia chamada NeXT, outra companhia chamada Pixar e me apaixonei por uma mulher maravilhosa que se tornou minha esposa.
A Pixar fez o primeiro filme animado por computador, Toy Story, e é o estúdio de animação mais bem-sucedido do mundo. Em uma inacreditável guinada de eventos, a Apple comprou a NeXT, eu voltei para a empresa e a tecnologia que desenvolvemos nela está no coração do atual renascimento da Apple.
E Lorene e eu temos uma família maravilhosa. Tenho certeza de que nada disso teria acontecido se eu não tivesse sido demitido da Apple.
Foi um remédio horrível, mas eu entendo que o paciente precisava. Às vezes, a vida bate com um tijolo na sua cabeça. Não perca a fé. Estou convencido de que a única coisa que me permitiu seguir adiante foi o meu amor pelo que fazia. Você tem que descobrir o que você ama. Isso é verdadeiro, tanto para o seu trabalho quanto para com as pessoas que você ama.
Seu trabalho vai preencher uma parte grande da sua vida, e a única maneira de ficar realmente satisfeito é fazer o que você acredita ser um ótimo trabalho. E a única maneira de fazer um excelente trabalho é amar o que você faz [Como a Senadora Ana Amélia amava ser uma excelente jornalista e hoje ama ser ótima Senadora].
Se você ainda não encontrou o que é, continue procurando. Não sossegue. Assim como todos os assuntos do coração, você saberá quando encontrar. E, como em qualquer grande relacionamento, só fica melhor e melhor à medida que os anos passam. Então continue procurando até você achar. Não sossegue.
A terceira história apontada por Steve Jobs é sobre sua relação com a morte. Permita-me, Srª Presidente, porque isso aqui é notável, inclusive, para os assuntos de que V. Exª há pouco falava, sobre a saúde. Tive o conhecimento dessa história exatamente porque uma pessoa querida, que eu amo, estava em situação semelhante como a que vou contar:
Quando eu tinha 17 anos, li uma frase que era algo assim: ‘Se você tiver cada dia como se fosse o último, um dia ele realmente será o último.’ Aquilo me impressionou, e desde então, nos últimos 33 anos, eu olho para mim mesmo no espelho, toda manhã e me pergunto: “Se fosse hoje o meu último dia, eu gostaria de fazer o que farei hoje?” E se a resposta é “não” por muitos dias seguidos, sei que preciso mudar alguma coisa.
Lembrar que estarei morto em breve é a ferramenta mais importante que já encontrei para me ajudar a tomar grandes decisões. Porque quase tudo — expectativas externas, orgulho, medo de passar vergonha ou falhar — caem diante da morte, deixando apenas o que é apenas importante. Não há razão para não seguir o seu coração. Lembrar que você vai morrer é a melhor maneira que eu conheço para evitar a armadilha de pensar que você tem algo a perder. Você já está nu. Não há razão para não seguir seu coração.
Há um ano, eu fui diagnosticado com câncer. Era sete e meia da manhã e eu tinha uma imagem que mostrava claramente um tumor no pâncreas. Eu nem sabia o que era um pâncreas. Os médicos me disseram que aquilo era certamente um tipo de câncer incurável, e que eu não deveria esperar viver mais de três a seis semanas. Meu médico me aconselhou a ir para casa e arrumar minhas coisas — que é o código dos médicos para “preparar para morrer”. Significa tentar dizer às suas crianças em alguns meses tudo aquilo que você pensou ter os próximos 10 anos para dizer. Significa dizer seu adeus.
Eu vivi com aquele diagnóstico o dia inteiro. Depois, à tarde, eu fiz uma biópsia, em que eles enfiaram um endoscópio pela minha garganta abaixo, através do meu estômago e pelos intestinos. Colocaram uma agulha no meu pâncreas e tiraram algumas células do tumor. Eu estava sedado, mas minha mulher, que estava lá, contou que quando os médicos viram as células em um microscópio, começaram a chorar. Era uma forma muito rara de câncer pancreático que podia ser curada com cirurgia. Eu operei e estou bem, disse ele em 2005. Isso foi o mais perto que eu estive de encarar a morte e eu espero que seja o mais perto que vou ficar pelas próximas décadas e não só mais seis anos.
Tendo passado por isso, posso agora dizer a vocês, com um pouco mais de certeza do que quando a morte era um conceito apenas abstrato: ninguém quer morrer. Até mesmo as pessoas que querem ir para o céu não querem morrer para chegar lá. Ainda assim, a morte é o destino que todos nós compartilhamos. Ninguém nunca conseguiu escapar. E assim é como deve ser porque a morte é muito provavelmente a principal invenção da vida, disse Steve Jobs. É o agente de mudança da vida. Ela limpa o velho para abrir caminho para o novo. Nesse momento, o novo é você. Mas algum dia, não muito distante, você gradualmente se tornará um velho e será varrido. Desculpa ser tão dramático, mas isso é verdade.
O seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém. Não fique preso pelos dogmas, que é viver com os resultados da vida de outras pessoas. Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior. E o mais importante: tenha coragem de seguir o seu próprio coração e a sua intuição. Eles de alguma maneira já sabem o que você realmente quer se tornar. Todo o resto é secundário.
Quando eu era pequeno, uma das bíblias da minha geração era o Whole Earth Catalog. Foi criado por um sujeito chamado Stewart Brand em Menlo Park, não muito longe daqui. Ele o trouxe à vida com seu toque poético. Isso foi no final dos anos 60, antes dos computadores e dos programas de paginação. Então tudo era feito com máquinas de escrever…
Eu vou pedir que seja registrado, porque acho que o principal eu já li. Vou apenas concluir. O exemplo deixado por Steve Jobs a todos nós resume bem os motivos que o levaram a ser essa pessoa respeitada e admirada em todo o mundo. No momento em que apresento este voto de homenagem de pesar, considero que a melhor homenagem à sua história é assimilar os seus exemplos e aplicá-los, dentro do possível, em nossa vida cotidiana.
Desculpem-me, caros colegas Senadores, por haver abusado um pouquinho do tempo, mas eu achei que deveria ler esse depoimento. Realmente recomendo que todos a assistam na forma original. Está no Youtube. Basta pesquisar “Steve Jobs. Universidade Stanford 2005”.