O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) leu, nesta terça-feira (14/02), carta de uma voluntária, que acompanha os moradores removidos de Pinheirinho, em São José dos Campos. A carta traz depoimentos emocionados de como a população de Pinheirinho sofreu durante a remoção de suas casas e dos problemas que enfrentam agora para reconstruir suas vidas.
De acordo com a voluntária, Andréa Luswarghi, além da violência sofrida durante a remoção, os moradores ainda sofrem com o preconceito por parte de donos de imóveis, que se negam a alugar moradias. “Além do preconceito, a maioria dos moradores não pode apresentar as garantias exigidas, inviabilizando de saída a locação porque praticamente nenhum deles pode cumprir exigências como fiador, nome limpo e comprovação de renda”, diz a carta.
O problema atinge principalmente as crianças. Morando provisoriamente em abrigos da Prefeitura e sem perspectiva de outro local para morar, as dificuldades também incluem a falta de vagas nas escolas de outras regiões. Andréia conta também histórias que colhe, diariamente, durante os encontros com os ex-moradores de Pinheirinho, e a situação de abandono dos animais, deixados entre os escombros.
Suplicy contou que resolveu voltar a São José dos Campos (SP) para examinar em que condições vivem os ex-moradores da comunidade, que foram forçados a sair daquele local denominado Pinheirinho. O senador relatou ainda o trabalho de diversos voluntários. “São dezenas de voluntários que, preocupados com a situação daqueles moradores, resolveram, de forma apartidária e independente, realizar trabalhos de solidariedade e, sobretudo, escutar aquela população”.
Eduardo Suplicy ainda fez um apelo para que o governador Geraldo Alckmin, o prefeito Eduardo Cury, e a presidenta Dilma Rousseff, conheçam a realidade daquelas famílias.
Eunice Pinheiro
Leia a integra da carta de Andréa Luswarghi
“Caro Senador Suplicy,
Seguem as informações solicitadas sobre o que acontece aqui com os moradores do Pinheirinho. Nesse relato abaixo, entrevistei 2 pessoas que achei que ilustram de forma significativa nossas preocupações sobre a condução por parte da prefeitura do destino dessas pessoas que sofreram aquela barbárie e agora continuam sofrendo diversos tipos de violência diariamente, inclusive a psicológica, que como comunicadora, desconfio que não acontece por acaso. Como o anúncio das usanças de abrigo que é feito com pouca antecedência e nunca discutido, apenas informado.
Senador, é importante dizer que nessa situação me posicionei como cidadã joseense indignada com a forma como essa desapropriação foi conduzida. E muito importante: de forma totalmente partidária, como todo o grupo de voluntários a que pertenço, nenhum de nós está ligado ou apóia nenhum partido.
Estas informações são de relatos dos moradores e de observações feitas por mim diretamente ao entrevistá-los:
1) Há preconceito das imobiliárias quando um morador do Pinheiro chega procurando uma casa depois da imagem negativa que se criou a partir da cobertura da imprensa com a desapropriação violenta, mostrando essa população como baderneiros descontrolados que incendiários carros, inclusive um carro da TV Vanguarda, e destruíram patrimônio público. Por outro lado, a maioria dos moradores não podem apresentar as garantias exigidas, inviabilizando de saída a locação porque praticamente nenhum deles pode cumprir a exigência do fiador. Por outro lado, há relatos, como o da Sra. Antônia Craveiro, que encontrou uma casa direto com o morador, mas era exigido o nome limpo, sem dívidas e uma comprovação de no mínimo 3 salários mínimos. Ela não podia atender nenhuma das exigências, caso similar à grande maioria dessa população. Portanto, consideramos uma falácia que a situação será resolvida com essa solução que prevê que o morador encontre a casa por ele mesmo. Isso está gerando desde a primeira semana situações de grande estresse e frustração. Os abrigados do Pinheirinho andam pelas ruas batendo nas casas e perguntando se existe alguma casa para locação. Como vc pode ver no texto de 7 de Fevereiro às 15:48 publicado no meu mural do facebook:
Boletim PINHEIRINHO AGORA…
Dna. Marinilva informa que saiu do abrigo Dom Pedro às 13h40 (7/2/12) em uma perua da prefeitura com outros 5 ex-moradores e o motorista da perua para procurar casa pra alugar. Eles estão batendo de porta em porta perguntando se sabe de casa para alugar na Vila Nair. Até o momento conseguiu um número de telefone de alguém que pode saber de algo, para ligar depois das 18hs.
Além disso, condições como a falta de informações e a incerteza de qual será o seu destino, a falta de atividades, o sol escaldante durante toda a semana que passou. As pessoas ficaram em uma condição difícil, já que a maioria não têm carro e precisa andar sob o sol batendo de porta em porta e amargando uma frustração grande no final da busca. Os que já tinham mais recursos e contatos já saíram dos abrigos. Alguns já alugaram com amigos que não fizeram exigências impossíveis, outros foram para a casa de parentes, o que não significa uma situação confortável, como relata a Sra. Antônia Craveiro:
“Eu tenho um neto de 1 ano e meio que tem uma problema de carne esponjosa no nariz que dificulta muito ele respirar e atingiu o ouvido. No dia 13/2 vou ao posto medico para marcar a cirurgia dele, enquanto isso não acontece não posso dormir com ele no abrigo, é barulhento e eu preciso vigiar a noite porque tem vezes que ele pára de respirar ou fica com o peito cheio. Na terça-feira passada (7/2), tive que correr com ele pro pronto socorro por causa disso. Ele também não pode beber leite integral, só leite de soja sem lactose, porque assim melhora bastante. Nessa situação, tive que pedir ajuda para a filha do meu marido, então fico no abrigo Dom pedro durante o dia e a noite vamos dormir na casa dela. Mas a situação está difícil porque a casa é pequena e nós dormimos na cozinha, o Nicolas debaixo da mesa e eu do lado da geladeira. A dona da casa já está incomodada, ela não fala nada, mas demonstra, então estou me sentindo mal com a situação e quero sair o quanto antes, para não ter briga.”
2) A forma como está sendo conduzida a entrega dos cheques não dá garantias aos moradores de que continuarão a receber o benefício pelos 6 meses anunciados, nos documentos assinados, cujo conteúdo relevante está transcrito com exatidão abaixo, não há NENHUMA citação do tempo do benéficio.
Publicado no meu mural do facebook em 7/2:
A Sra. Antonia conta a experiência dela no dia de ontem:
– Entrou numa fila por uma hora para pegar o cheque, o local não era aquele e foi encaminhada para Unidade de Proteção Social Básica – Morumbi. Av. Benedito Domingues de Oliveira, 467 – Morumbi – Antiga av. 6. Fone: 12.39336762
– Chegou lá e foi informada que quem já estava na lista do cheque liberado (seu caso) deveria ir ao DR (Departamento de Estrada e Rodagem – Estrada Velha Rio-São Paulo, na Dutra). Longe…
– Chegou no DR e a fila era pequena. Foi atendida em menos de 10 minutos. Entregou CPF e RG e esperou ser chamada para pegar o cheque.
Abaixo a descrição do cheque e documentos assinados:
Cheque da CAIXA de R$1000,00 assinado pela prefeitura do mun. de SJC.
Assinou um TERMO DE COMPROMISSO que diz:
(…) “Reconheço que atendo aos requisitos previstos na Lei Mun. n 8598/12 (realização de cadastro no momento em que foi retirado da área denominada “Pinheirinho”. Está em abrigo municipal ou na residência de parentes ou terceiros no momento da concessão dos benefício, e ter renda familiar de até 3 salários mínimos), para receber tal quantia, comprometendo-me a utilizar os benefícios para fins de moradia e mudança, com a saída definitiva do abrigo, juntamente com a família e respectivos pertences.
Estou ciente que o não cumprimento dos critérios estabelecidos na Lei Mun. 8598/12, dentre ele, o retorno a área invadida ou invasão de nova área, bem como seja dada solução habitacional definitiva por qualquer das esferas de governo ou pessoa, família ou grupo vir a conquistar autonomia financeira, implicará na suspensão dos benefícios. (…)
Assinou 1 DECLARAÇÃO: “Declaramos para os devidos fins que o(a) Sr.(a) XXXX, portadora da identidade XXXX, e CPF XXXX, está recebendo o benefício do “Programa Aluguel Social, conforme Lei n 8.598/12, pago através da Secretaria de Desenvolvimento Social.
E mais 3 folhas de ORDEM DE PAGAMENTO, sendo que especificam:
– 400,00 Ref.: (escrito no doc que ela assinou) “A pagamento de auxilio moradia proveniente de recursos proprio do governo estadual. Conf. Lei municipal de n 8598/2012 – Pinheirinho solic. pelo memo 005/GC/SDS/ 2012.” Ficha 1533. Dotação 50.10.3.3.90.48.08.244.0003.2.11.02.5000
– R$100,00. “Ref. a pagamento de auxilio mudança proveniente de recursos proprio do governo municial. Conf. Lei municipal n 8598/2012- Pinheirinho. Solic. pelo memo 017/GC/SDS/2012”.
– R$500,00. “Ref. a pagamento de auxilio mudança proveciente de recursos proprio do governo municipla. Conf. Lei municipal n 8598/2012 – Pinheirinho – Solic. pelo memo 05/GC/SDS/2012”.
3)O valor de R$ 500,00 nao é suficiente para alugar um imóvel na cidade, já que os preços foram inflacionados com o fato que ocorreu no Pinheirinho. Estão pedindo 700, 800,00 reais e mais 2 ou 3 meses de calção.
4) As famílias estão sendo obrigadas a se distanciar da sua comunidade onde tinham um laço de colaboração e solidariedade, porque a situação nos abrigos é absolutamente insustentável e assim eles, sem saída, vão por conta própria para bairros distantes onde se sentem isolados e não contam com ajuda, não conhecem ninguém. Além disso, há o preconceito de parte dos cidadãos de SJC contra os moradores do Pinheirinho nesses bairros para onde vão e eles sentem medo de retaliação ou rechaço, além da perda da identidade que aquela comunidade construiu com um projeto conjunto de luta por habitação.
“Encontrei uma moradora da comunidade e ela tinha filhos na escola Edgar de Melo, no Campo do Alemães, que fica em frente ao Pinheirinho. Ela se distanciou e foi morar no Jardim Helena, do outro lado da cidade. Chegando lá procurou escola para os 3 filhos. Na escola alegam que não há vagas”, conta Antonia Craveiro.
5) Durante essa semana foram remanejadas as famílias que estavam no abrigo do CAIC para o Dom Pedro e o Morumbi.
Hoje, 11/2, foi comunicado pela prefeitura para os abrigados no Dom Pedro, por volta do meio dia, que todas as famílias serão retiradas e levadas para o Poliesportivo do Morumbi. Ao receber as informações os moradores ficaram exaltados e decidiram que iriam resistir. Um deles ameaçou tocar fogo na quadra de fosse obrigado a sair. Os mais calmos explicam que ali, durante os 20 dias que estão juntos, já há regras de respeito e convivência estabelecidas. E que no Morumbi, que está bem mais cheio, eles se sentirão intrusos.
Uma situação muito desgastaste é que as informações sobre as ações que serão realizadas, só chegam aos moradores poucas horas antes de acontecer, o que tem gerado revolta e um comportamento de resistência e enfrentamento dessa população que está sendo exposta a situações podem resultar em violência policial, o que reforça a imagem de baderneiros que eles já tem na cidade.
Relato da psiquiatra infantil Marília Toledo, que veio até o momento 4 vezes de São Paulo com 3 carros de doações e uma agenda para resgatar os animais que ficaram abandonados no terreno com os escombros das casas:
“Quando cheguei no terreno os animais abandonados estavam machucados, deitados do lado dos escombros das casas. Essa era uma imagem impressionante, na chuva, alguns mutilados. Muitos foram encontrados mortos embaixo dos escombros, outros recolhidos com tiros de bala de borracha.
O pessoal do Clube dos ViraLatas foi quem recolheu diversos animais com ferimentos de bala, fraturas e até amputações.
No primeiro dia era um caos, voluntários de várias cidades foram lá para recolher os animais, mas a maioria era de São Paulo e SJCampos.
Um grupo de de voluntários se organizou em São José para ir ao terreno todos os dias e alimentar os bichos. Mais de 600 animais foram recolhidos do terreno e estão em casas de voluntários e em um local alugado ali perto no valor de R$ 1000,00 mensais que será dividido entre os voluntários. Também temos os internados em situação grave em clinicas também pagas pelos voluntários.
Alguns cachorros nao queriam sair do local e foi preciso sedá-los para finalizar o resgate desses animais.
A cena mais chocante foi mesmo ver os animais sentadinhos do lados dos escombros quando chegamos, eles ficavam bravos quando a gente se aproximava. Eles ainda estavam defendendo sua casa…”
É isso. Estou à disposição para esclarecer o que for necessário. Não dei uma lida final, mas as informações estão todas ai.
Abraços,
Andrea”
Leia a íntegra do discurso do senador Eduardo Suplicy