Humberto dividiu com toda a bancada do PT a responsabilidade pelas articulações que garantiram a manutenção dos vetos presidenciais. Se fossem derrubados, buraco no orçamento seria de R$ 127,8 bilhõesNuma noite cansativa, de muitos debates entre deputados e senadores da base aliada contra os da oposição, finalmente o Congresso Nacional realizou uma sessão para votar pela manutenção ou pela derrubada de 32 vetos presidenciais a projetos transformados em lei. Como desejava o governo, 26 foram mantidos e os restantes, entre eles o veto ao reajuste de 78,56% para o Judiciário, ficarão para uma próxima sessão, ainda sem data marcada. O resultado da votação foi muito, mas muito positivo para o governo da presidenta Dilma e para a continuidade do ajuste fiscal, indicando que agora é possível virar uma página e seguir adiante. A sessão começou praticamente às 21h de terça-feira (22) e foi encerrada às 2h20 desta quarta-feira (23).
“A única vitória foi do Brasil. Aqui não estava em questão o governo ou a oposição. Estava em questão a responsabilidade com o País e com o equilíbrio fiscal das nossas contas. Foi nesse sentido que muitos oposicionistas, sensibilizados com a situação, se posicionaram pela manutenção dos vetos”, disse Humberto Costa, líder do PT no Senado.
O líder, aliás, foi claro ao observar que apesar de o resultado ser favorável, não há nada a comemorar. Isso porque ainda há muito trabalho pela frente, pois seis vetos não foram analisados por falta de quórum. Eram necessários ao menos 257 deputados para votar os vetos referentes aos terrenos de marinha, ao reajuste do Judiciário, ao que estende para todos os aposentados e pensionistas o reajuste conforme o salário mínimo e ao que isentava a cobrança de PIS/Cofins sobre o óleo diesel. Se todos os vetos fossem derrubados, o buraco nas contas públicas até 2019 seria de R$ 128 bilhões.
“Acredito que, até que se realize a próxima sessão do Congresso, nós conseguiremos afinar, ainda mais, o nosso diálogo para manter os demais vetos que restaram na pauta”, disse Humberto aos jornalistas. Em sua avaliação e dos demais senadores da bancada petista, o Congresso e o Executivo deram uma sinalização de que o País trabalha unido para recuperar a capacidade fiscal e voltar a crescer. Na terça-feira, por conta da ação dos especuladores, o dólar chegou a ser cotado a R$ 4,05.
Judiciário
Ficou para uma próxima sessão a análise do veto presidencial para o Judiciário. Durante os últimos quatro meses, servidores pressionavam os senadores como se não existisse uma negociação em curso. O Ministério do Planejamento apresentou uma proposta aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que garantia um reajuste de quase 40% a ser aplicado ao longo de 4 anos.
Mas a categoria não arredava o pé e queria 78,56% de reajuste imediato. Servidores da carreira de técnicos e analistas reclamavam que estão há oito anos sem reajustes. Porém, esse reajuste seria estendido para toda a carreira, de juízes a desembargadores, afetando, principalmente, as Justiças estaduais.
Ontem, servidores do Judiciário ocuparam, literalmente, os espaços do Senado e da Câmara e uma multidão se formou na frente do Congresso Nacional. Nos corredores, senadores eram cobrados. Alguns até sendo agredidos verbalmente, ainda mais quando apontavam a necessidade de negociar um reajuste em torno do oferecido pelo governo porque o impacto isoladamente desse reajuste de 78,56% seria de quase R$ 30 bilhões, o tamanho da economia que o governo está fazendo.
Os servidores do judiciário, conforme apuraram alguns jornalistas, contrataram pessoas que usaram vuvuzelas para cobrar os parlamentares. O som incomodou muito. Do lado de fora, parecia um encontro de food truck da alta gastronomia. Ao longo dos dias, a cada vez que se cobrava aumento de 78% num momento de crise, nas redes sociais surgiam holerites de juízes e desembargadores que chegam a ganhar, todos os meses, mais de 200 mil reais limpinhos, por conta dos auxílios e outros penduricalhos.
Falta de quórum
Na terceira votação em separado, a obstrução de grande parte das legendas provocou a queda da sessão por falta de quórum quando estava em votação nominal o veto parcial 21/15 ao Projeto de Lei 5627/13, que faz mudanças na lei sobre taxas de ocupação de terrenos de marinha.
Entre os itens vetados destacam-se a diminuição de 5% para 2% da taxa de ocupação de terrenos da União no caso de ocupações ocorridas a partir de 1° de abril de 1988 e o repasse de 20% da receita com taxa de ocupação, foro e laudêmio aos municípios onde estão localizados os imóveis que deram origem à cobrança.
Fator previdenciário
Um dos vetos mantidos foi ao destaque que cria uma alternativa ao fator previdenciário, a fórmula 85/95. A regra permite ao trabalhador aposentar-se quando a soma de sua idade com o tempo de contribuição chegar a 85 (mulheres) ou 95 (homens).
Ao vetar essa alternativa ao fator previdenciário, a presidente Dilma Rousseff editou a MP 676/15 com regra semelhante, mas com exigências que aumentam ao longo do tempo devido ao crescimento da perspectiva de vida da população. Assim, essa transição prevê o aumento de um ponto nesses anos (86/96 até 90/100) para evitar prejuízos ao caixa da Previdência Social a médio e longo prazos.
Com a desistência de destaque do PTB, a votação do veto à fórmula 85/95 foi feita em conjunto na cédula e não em separado. Segundo o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), a desistência decorreu de acordo com o governo para a votação na comissão mista, nesta quarta-feira, do relatório do deputado Afonso Florence (PT-BA) para a Medida Provisória 676/15 sem adiamentos.
O relatório para a MP, cuja vigência se encerra em 15 de outubro, estende por mais quatro anos o período de transição da regra 85/95 para que ela atinja 90/100. Em vez de começar em 2017 e terminar em 2022, a transição começará em 2018 (86/96) e terminará em 2026 (90/100).
O fator previdenciário foi criado no governo Fernando Henrique Cardoso para tentar evitar que os trabalhadores se aposentassem antes dos 60 anos, mas não tem obtido sucesso em adiar as aposentadorias. Geralmente, o fato diminui o valor dos proventos a receber em relação ao salário sobre o qual se deu a contribuição ao INSS.
Identificação na matrícula
O Senado manteve, por insuficiência de votos, o veto total 12/15 ao Projeto de Lei 4263/12 (PLS 572/11), que obrigava as escolas de educação básica a identificar, no ato da matrícula, as pessoas autorizadas a ingressar no estabelecimento de ensino para cuidar de assuntos de interesse do aluno.
Segundo o Executivo, o motivo do veto é que essa regra específica para escolas de educação básica é matéria de incumbência dos estados e dos municípios, nos moldes da organização dos sistemas de ensino estabelecida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Biodiversidade
O veto parcial 11/15 ao Projeto de Lei 7735/14, sobre o acesso à biodiversidade, também foi mantido. O dispositivo vetado proíbe a isenção de pagamento de royalties sobre a exploração de produto derivado desse acesso quando ele tenha ocorrido antes de 29 de junho de 2000. A justificativa é que isso fugiria à lógica do projeto e não haveria mecanismo para garantir a comprovação do acesso anterior à data fixada, provocando dificuldades operacionais.
Quanto às fiscalizações, foi mantido o veto sobre a repartição dessa atribuição entre vários órgãos federais. A participação de órgãos como o Ibama, o Comando da Marinha, o Ministério da Defesa e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento será normatizada por regulamento.
Sigilo do BNDES
Os parlamentares mantiveram o veto parcial 12/15 à Medida Provisória 661/14, sobre concessão de crédito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O principal item vetado previa o fim do sigilo de operações previsto em contratos do BNDES. O governo argumenta que o BNDES já divulga diversas informações a respeito de suas operações, mas a ampla divulgação desejada feriria sigilos bancários e empresarias e prejudicaria a competitividade das empresas brasileiras no mercado global de bens e serviços.
Marcello Antunes, com informações das agências Senado e Câmara
Leia mais:
Para Humberto, Congresso deve ajudar a encontrar saídas para reduzir déficit