A longa sessão plenária que culminou na aprovação do projeto de reforma do Código Florestal Brasileiro (PLC 30/2011), por 59 a 7 votos, foi o reflexo de toda a discussão envolvendo o texto dentro do Senado. Isto porque, como pode ser ouvido nos bastidores da discussão, “esta foi a matéria mais discutida nos últimos anos dentro da Casa”. Algo que pôde ser verificado ao longo de todo o dia, dentro e fora das paredes do Congresso Nacional, nas manifestações realizadas em frente à Casa nessa terça-feira (06/11), nos burburinhos de corredor e nos pronunciamentos dos senadores realizados, como de costume, antes da abertura da ordem do dia, que praticamente anteciparam a discussão. Diante disso, o resultado não poderia ser outro: só um acordo em torno das emendas (mudanças) apresentadas ao substitutivo do senador Jorge Viana (PT-AC) permitiu o desfecho da passagem da proposição no Senado.
Em um universo de 82 emendas apresentadas até o momento da discussão em plenário, Viana acatou 26. Dentre elas, como ele próprio observou em plenário, estavam algumas de redação, cuja finalidade era “aprimorar” o texto. Mas também passaram mudanças de conteúdo importantes. Das quais, três foram consideradas mais relevantes pelas parlamentares que comentaram o projeto ao deixar a sessão. A primeira delas incide sobre as {modal url=https://ptnosenado.org.br/popup/121-popup/4172-areas-de-protecao-permanente}Áreas de Proteção Permanente (APPs){/modal} que circundam os rios. Segundo essa emenda, o Governo poderá ampliar a extensão da faixa de proteção pré-estabelecida de no mínimo de 15 metros dessas matas ciliares, com a autorização dos comitês regionais de bacias hidrográficas, caso seja constatado que o ciclo d’água está em situação crítica.
A segunda mudança se dá no tratamento que será dado ao bioma manguezal. Pela proposta aprovada na Comissão de Meio Ambiente (CMA), as atividades realizadas em apicuns e salgados – duas partes protetoras do bioma manguezal, onde são praticadas criação de camarão e extração de sal – estariam resguardadas dentro do conceito de áreas consolidadas até 22 de julho de 2008; e depois dessa data passariam a fazer parte das APPs. Entretanto, a bancada nordestina fez pressão e disse que o texto deveria fazer alguma concessão para explorações futuras, com vistas ao sustento dos carcinicultores e salineiros da região. Este apelo foi atendido na forma da emenda que limitou a exploração de apiciuns e salgados em 10% na Amazônia Legal e 35% nos demais biomas, desde que respeitadas às exigências para licenciamento e não se faça o desmate da vegetação arbórea do mangue.
A terceira modificação de destaque atende aos anseios da bancada amapaense, que pediram a retirada do texto da previsão de que as unidades da federação que tivesse 65% do território em unidades de conservação teriam automaticamente a redução do tamanho previsto para as áreas de {modal url=https://ptnosenado.org.br/popup/121-popup/4171-reserva-legal-}Reserva Legal (RL){/modal} de 80 para 50%. Como o Amapá é o único estado com essa prerrogativa hoje, os senadores Randolfe Rodrigues (PSol-AP) e João Capiberibe (PSB-SP) sinalizaram que isso poderia incentivar o desmatamento e acirrar a disputa entre madeireiros e pequenos agricultores no estado. Quando a matéria ainda tramitava na CMA, o senador Jorge Viana havia ponderado que essa medida era uma forma de incentivar os estados a criarem mais bolsões verdes em unidades de conservação. A forma encontrada de conciliar os dois posicionamentos foi acatar a emenda que pede a recomendação do Zoneamento Ecológico-Econômico e de autorização do conselho estadual do meio ambiente para pedir a redução da proporção de 80 para 50% das áreas de RL naquele ente federativo.
Senadores de todos os partidos aplaudiram o trabalho do relator após a votação. |
Após o encerramento da votação, Viana conversou com a imprensa e falou sobre os ganhos que o projeto teve durante a tramitação no Senado. “Nós podemos ter, a partir desse novo Código, uma união de todos os brasileiros para por floresta onde ela foi destruída, nas margens dos nossos rios, nas nascentes. São 35 milhões de hectares de florestas que nós vamos ter que recuperar, reconstruir, deixá-la crescer. O Brasil tem que parar de contar as florestas que está destruindo todo ano e começar a contabilizar as florestas que nós estamos trazendo de volta”. E ainda ponderou que o texto aprovado na Casa não é dos seus “sonhos”, mas sim uma construção “suprapartidária”. “Se fosse o meu Código Florestal, ele faria muito mais pelo meio ambiente. Mas sinceramente acho que é uma proposta boa para o Brasil”, afirmou.
Para a ministra Izabella Teixeira, do Meio Ambiente, que acompanhou parte da sessão plenária de ontem, a redação aprovada teve “avanços expressivos” na conservação e proteção das florestas. Ela apontou que o novo Código Florestal “coloca o Brasil em suma situação muito vantajosa, não só de reduzir desmatamento, mas de ser um grande sumidor, aquele que capta carbono”.
O posicionamento da bancada
Alguns pontos do texto ainda permanecem sem consenso dentro da bancada. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), por exemplo, sinalizou que embora o texto de Jorge Viana tenha avanços importantes em muitos aspectos, algumas questões centrais permanecem problemáticas. A principal delas, na avaliação do parlamentar, é a anistia. Lindbergh destacou que regularizar a situação de quem desmatou até 22 de julho de 2008, ainda que mediante a recomposição dessas áreas, conforme prevê o texto, é uma forma de absolvição. “Esse dispositivo pune quem cumpriu a lei”, constatou.
Em contrapartida, os senadores Ângela Portela (PT-RR) e Delcídio do Amaral (PT-MS) avaliaram que o projeto não facilita a vida de quem desmatou, afinal todos serão obrigados a recuperar. “O projeto disciplina claramente de que forma se dará essa regularização, com a obrigação de recuperar os 15 metros de mata ciliar nas margens de cursos d’água com até 10 metros de largura, aumentando gradativamente, conforme a largura dos rios, até o limite de 100 metros”, observou Portela em seu pronunciamento.
Ana Rita concordou com o apoio ao produtor familiar, mas discordou da extensão para outros tipos de produtores |
Já a senadora Ana Rita (PT-ES) saudou o tratamento especial que o Código prevê para o produtor familiar, como a oferta de apoio técnico e jurídico para o cumprimento das obrigações ambientais, além das medidas de estímulo ao financiamento do setor. Mas ponderou que esses avanços “jamais” poderiam ser cedidos a outros setores que acabaram contemplados pela definição do parâmetro de quatro módulos fiscais como limítrofe do que seria a pequena produção.
A representante do Espírito Santo ainda indicou outras modificações que gostaria de ver aprovadas, mas que não foram atendidas. Ela questionou a permissão da conversão de florestas nativas situadas em áreas de inclinação entre 25 e 45 graus; a adoção da data de 22 de julho de 2008 como referência para o conceito das áreas rurais consolidadas, enquanto que o ano de 2001- quando foi realizada a última modificação dos parâmetros de extensão das Reservas Legais -, na avaliação da senadora, seria mais apropriado; e a manutenção de atividades agrossilvopastoris consolidadas localizadas em APPs nas margens de cursos d’água.
Próximo Passo
Como o texto aprovado na Câmara dos Deputados, no primeiro semestre, recebeu modificações no Senado, o PLC 30 precisará receber no aval dos deputados antes de ser encaminhado a sanção presidencial – o que pode ocorrer antes do recesso parlamentar de fim de ano. Os deputados agora vão decidir entre os dois textos: o que foi aprovado lá ou o que recebeu as modificações do Senado. Mas também existe a possibilidade de comparando cada um dos dispositivos das duas proposições, costurarem uma proposta combinada ou suprimirem partes do texto.
Indagado sobre o assunto, Jorge Viana disse acreditar que a interlocução estabelecida entre as duas casas durante a elaboração dos relatórios deve facilitar a aprovação do Código produzido no Senado. Ele garantiu que o projeto sai melhor do que entrou. “Tem pessoas que falam que a proposta da Câmara era melhor para os ruralistas. Eu acho que nem para eles era tão boa assim. A proposta da Câmara, se aprovada, imediatamente iria parar nos tribunais por conta da insegurança jurídica. A proposta do Senado tenta corrigir isso. Tenta deixar as coisas bem claras, estabelecer princípios que possam nortear os gestores públicos e também os tribunais na hora de decidir”, avaliou.
Catharine Rocha
Fotos: André Corrêa
Saiba mais:
Ouça o que disse a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.
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Ouça a entrevista do senador Jorge Viana (PT-AC).
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