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Vitória: PL do Veneno é adiado para agosto e terá novo debate

Surtiu efeito a pressão do PT e de entidades que lutam pela alimentação saudável e pelo meio ambiente; Comissão vai ouvir relator da ONU, que condena o projeto
Vitória: PL do Veneno é adiado para agosto e terá novo debate

Foto: Agência Senado

Foi um revés para a bancada ruralista, que até o último momento tentou fazer valer sua maioria na Comissão de Agricultura (CRA) do Senado e aprovar o PL do Veneno (PL 1459/2022). Até por isso, a convocação da reunião desta quinta-feira (14) só aconteceu perto das 22h da véspera. Abertos os trabalhos, o presidente da CRA e relator do projeto, Acir Gurgacz (PDT-RO), admitiu a pressão sofrida, inclusive dentro do Senado, para que o assunto não fosse votado antes de amplo debate. Ainda tentou se defender, alegando que a matéria tramita há 23 anos e que, por isso, estaria madura para ser decidida no voto. Mas foi rebatido pelo senador Jean Paul Prates (PT-RN), para quem esse argumento dá a entender o oposto.

“Projeto que passa 20 anos na Casa se arrastando em comissões, em deliberações, e às vezes passando três anos parado, ou é porque é muito polêmico ou porque é ruim mesmo. E esse projeto parece que é as duas coisas. É polêmico e é ruim. Portanto, ele tem que sofrer muitos aprimoramentos e a gente tem que ter essa paciência de legislador, competente, responsável, justamente de macerar o assunto, buscar as versões. E, no caso de um projeto como esse, mais ainda, porque esse tem mais de duas décadas sendo discutido, significa que foi discutido 23 anos atrás e não vale mais nada, porque a estrutura mudou, o negócio mudou”, justificou.

Para debater essas mudanças no modelo de produção e no ambiente global, a CRA aprovou pedido de audiência pública assinado pelo líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), Jean Paul Prates, Eliziane Gama (Cidadania-MA), Zenaide Maia (Pros-RN) e Dário Berger (PSB-SC). A Comissão vai ouvir o relator especial das Nações Unidas, Marcos Orellana, sobre nota da ONU, divulgada em junho, que condena o projeto em discussão no Senado.

Os especialistas chamados pela Organização das Nações Unidas afirmam que o texto enfraquece a regulamentação do uso de agrotóxicos no Brasil, com consequências arrasadoras para trabalhadores do campo, comunidades próximas às lavouras, povos indígenas, meio ambiente e para a saúde do consumidor. Entre os pontos mais críticos está a permissão de uso de substâncias cancerígenas e que trazem risco de problemas reprodutivos, hormonais e malformações em bebês. A recomendação, avalizada pela ONU, é de que o Brasil estabeleça regras para o setor alinhadas ao que é praticado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Mais riscos

Ao mudar a Lei de Agrotóxicos (Lei 7.802/1989), o PL do Veneno acaba com a competência tripartite — órgãos da saúde, meio ambiente e agricultura — para registro de agrotóxicos, restringindo essas autorizações ao Ministério da Agricultura (Mapa). O texto também retira da Anvisa (Ministério da Saúde) e do Ibama (Ministério do Meio Ambiente) a análise sobre riscos de mistura de substâncias em tanques, o que pode trazer resultados imprevisíveis. Pela proposta ruralista, bastaria a receita de um agrônomo para misturar agrotóxicos numa fazenda.

Os trabalhadores do setor estão entre os mais ameaçados. E não só porque poderiam lidar com perigosas e desconhecidas combinações. É que o projeto dispensa registro ou estudos prévios para agrotóxicos destinados à exportação, o que deixaria ainda mais exposto quem atua na produção e tem contato com seus resíduos. Vale lembrar que entre 2010 e 2019 foram registrados 7.163 atendimentos em hospitais de trabalhadores rurais intoxicados por agrotóxico. Mas a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a subnotificação dessas ocorrências é grande e que, para cada caso conhecido, existem outros 50 não computados.

Do trabalhador ao consumidor, a proposta coloca todos em risco em nome de ganhos mais rápidos para o agronegócio. Exemplo disso é a criação da modalidade do registro temporário, que seria concedido sempre que estourasse o prazo de análise pelo Ministério da Agricultura. Na prática, criaria uma indústria de agrotóxicos sem patente definitiva, com o enfraquecimento do controle de riscos, apontam a organização Terra de Direitos e a Campanha Nacional Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida.

As dezenas de entidades envolvidas na reação ao PL do Veneno mantêm a campanha nas redes sociais e junto aos parlamentares. Na bancada do PT, há um esforço para que técnicos da Anvisa e do Ibama também sejam ouvidos pela CRA em audiência pública antes de a matéria ir à votação.

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