A Venezuela, país vizinho, e amigo histórico do Brasil, enfrenta momento de graves impasses políticos, com riscos potenciais de rupturas estruturais. Um processo eleitoral atípico, marcado por controvérsias, a começar pelo protagonismo do chefe do Executivo nas demais instituições, em uma sociedade polarizada, empobrecida, e em forte diáspora, reúne os ingredientes para crise de profundidade. De plano, diga-se que os fatos políticos de hoje na Venezuela não guardam equivalência com a tentativa de golpe da extrema direita ao então presidente Hugo Chávez.
Como Senador pelo PT, Partido do qual integro a Executiva Nacional e o represento atualmente na liderança no Senado, me submeto à decisão da direção partidária sobre o imbróglio na Venezuela. Porém, a despeito de afinidades, admito dificuldades em reconhecer, no regime Maduro, assentado em autoproclamada aliança cívico-militar-policial, pré-disposição à contenção democrática e apego a alguns outros direitos fundamentais.
Alimentando a complexidade, como membro da base governista, aliado incondicional de um governo que transcende o PT, me orgulho e louvo as articulações do presidente Lula que arrisca seu capital político e liderança para, em última instância, tentar saídas que facilitem a pacificação na Venezuela e o resgate da normalização da integração do país n0 concerto das nações democráticas.
Com o respaldo de outras Nações, Lula lidera tentativa de convergência internacional (afora China e Rússia) sobre a Venezuela, que esteja em efetiva sintonia com a soberania popular naquele país. Um enorme esforço para fazer prevalecer a diplomacia, e da mesma forma, uma inegável demonstração do prestígio internacional do presidente Lula. Mas, gato escaldado deve ter medo de água fria. Especialmente sobre a “procuração” outorgada pelos EUA ao presidente Lula, devemos recordar que Obama puxou o tapete de Lula no caso Irã. Quem garante a efetividade do aval de Biden ao governo brasileiro na mediação do caso Venezuela? A Nota divulgada pelo Departamento de Estado no dia 01 de agosto chancelando de forma precipitada os discursos da oposição venezuelana demonstra os riscos de atropelo, pelos EUA, do processo pactuado.
Com a eventual divulgação das Atas das eleições na Venezuela, Brasil, EUA, UE, México, Colômbia e outras Nações não hesitarão em homologar os seus resultados. Todavia, teme-se as consequências, internas e internacionais, da não divulgação das Atas ou, no outro cenário, do indiscutível não reconhecimento por Maduro e ‘SUAS’ instituições, da hipótese da vitória de Edmundo González. A propósito, a condição de González, como quadro orgânico da extrema direita venezuelana, e “laranja” de Maria Corina, também tornaria de difícil assimilação política para os setores progressistas a sua investidura no cargo de presidente. Mas, enfim, cada povo tem o direito de escolher os seus governantes.
O fato é que em ambos os casos, haveria o maior isolamento internacional da Venezuela e, no plano interno, repercussões políticas e econômicas imponderáveis que poderão gerar o aprofundamento da polarização e infortúnio ainda maior para a população venezuelana. Aliás, no fechamento deste artigo havia expirado o “prazo diplomático” de 72 horas para a libração das Atas, o que efetivamente não ocorreu. Vejamos o que vem pela frente.
Em suma, estamos diante de impasse monumental com tendência de mais violência, infortúnio e desesperança para o povo venezuelano. Todos sabemos que Lula é um político diferenciado, iluminado, muito acima da média; uma força da natureza. Quem sabe consiga a proeza de conter Maduro e a extrema direita, e colocá-los em diálogo construtivo para o bem do povo venezuelano?