Caminho para fim do racismo no futebol passa por campanhas educativas

Por iniciativa do senador Paulo Paim, Comissão de Direitos Humanos discutiu desafios e soluções para atos de racismo em arenas esportivasOs recentes casos de racismo no futebol motivaram o senador Paulo Paim (PT-RS) a levar o tema para a discussão na Comissão de Direitos Humanos (CDH) e, nesta segunda-feira (17), em audiência pública, discutiu sugestões que podem acabar com atos racistas, não somente no esporte brasileiro, como também em toda a sociedade.

O senador destacou que o País tem vivido um retrocesso em relação ao respeito aos direitos humanos e o crescimento de atos de discriminação racial nas arenas esportivas ocorridas ao longo deste ano precisa acabar.

Paim lembrou um dos casos de maior repercussão, ocorrido no último dia 28 de agosto, durante partida disputada entre Grêmio e Santos pela Copa do Brasil. Na oportunidade, um grupo de torcedores gremistas foi flagrado por emissoras de TV que transmitiam a partida chamando de macaco o goleiro santista Aranha.

“O racismo mancha a história do esporte e não pode ser admitido. Nosso desafio é garantir igualdade de oportunidades em todas as áreas, inclusive no futebol”, disse o senador.

Combate ao preconceito no esporte
Para a representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Deise Benedito, a prática do racismo nos estádios e nos campos de futebol sempre existiu. Segundo ela, é uma prática que não ofende apenas aquele que está sendo atacado. “Quando os torcedores xingam alguém de macaco, eles têm a certeza da impunidade. Essas são práticas que visam atingir toda uma comunidade. Eu não estou chamando apenas o goleiro Aranha de macaco; aquele ato ofende toda a comunidade negra”, observou.

Carlos Alberto Junior, representante da Secretaria de Promoção de Políticas de Igualdade Racial da Presidência da República, apontou que setores do futebol ainda são restritivos e não representam a diversidade racial existente na sociedade. “Apenas um treinador da Série A do Campeonato Brasileiro é negro, o treinador do Fluminense, Cristóvão Borges. Expandindo essa análise para a Série B, apenas 15% dos treinadores são negros. E isso não reflete a diversidade racial de nosso País”, disse ele.

Para Deise Benedito, é fundamental que os clubes de futebol assumam a responsabilidade no combate aos atos de discriminação e preconceito, realizando campanhas de conscientização que possam ter amplo alcance, como mensagens nos uniformes e a reprodução de vídeos com jogadores passando mensagens educativas contra esse tipo de crime. Deise sugeriu a adoção de campanhas coletivas – entre todos os times de uma competição – que possam ajudar no combate a diversos tipos de preconceito.

“No mês da Consciência Negra, em novembro, seria interessante que todos os clubes assumissem essa luta contra o racismo. Assim como, no mês de junho, os clubes poderiam assumir a campanha contra a homofobia. Em março de cada ano também seria possível fazer campanhas de combate à violência contra a mulher”, sugeriu.

Ronaldo Ferreira Tolentino, representante da Ordem dos Advogados do Brasil, relatou que, além de ofensas racistas, é comum e constata-se nos estádios de futebol ou em ginásios, torcidas adversárias tratando seus rivais com referências homossexuais ou chamando-os de “favelados”. Ronaldo parabenizou o Movimento Negro por não aceitar passivamente esse tipo de discriminação e salientou que as demais organizações da sociedade civil devem trilhar o mesmo caminho para que atos discriminatórios não sejam interpretados dentro da normalidade.  

“Os torcedores devem saber que, se um ato desse tipo for praticado, vai haver consequências. Temos de acabar com essa sensação de impunidade”, disse.

Críticas à posição de parte da imprensa esportiva
Alexandre Santos, representante do Sport Club Internacional, apontou que uma pequena parcela da imprensa esportiva acaba contribuindo para a construção de um clima tenso entre torcidas rivais que acaba incitando atos de violência e intolerância. O representante do clube gaúcho utilizou, como exemplo, a discussão que ocorreu na Rádio Gaúcha após o clássico ocorrido entre Grêmio e Internacional, no último dia 09. Na oportunidade, durante a transmissão do programa Sala de Redação, da Rádio Gaúcha, os jornalistas Kenny Braga e Paulo Sant’Anna trocaram ofensas e até xingamentos.

Para José Carlos Torves, que representou a Federação Nacional de Jornalistas na audiência da CDH desta manhã, o fato de ofensas dirigidas a árbitros e jogadores de futebol atualmente causam revolta na sociedade e isso que a questão dos direitos humanos avançou no País. Mas, apesar disso, ainda é necessário resolver alguns problemas para que a questão possa avançar mais.

“No Brasil, nós temos três setores da sociedade que ainda não se democratizaram. A Justiça, a imprensa e o futebol. O futebol tem seriíssimos problemas. Esses setores precisam evoluir para atingirmos um grau de civilidade necessário a outros setores do País”, disse. “É preciso que o Congresso se debruce sobre essa questão da democratização do esporte, assim como deve ocorrer em relação à regulamentação de imprensa”, emendou.

Grêmio não é um clube racista
Adalberto Preis, vice-presidente do Grêmio de Football Porto Alegrense, ressaltou que a entidade tem feito campanhas públicas de combate ao racismo de forma constante. O dirigente disse que os jogadores do clube, desde as categorias de base, são instruídos e ensinados a respeitar todos, independente de sua cor, etnia ou raça. “O Grêmio é um clube multiétnico e multirracial”. Adalberto citou como exemplo a campanha contra o racismo que o clube tem feito com o mote “Somos 100% negro, azul e branco”, em alusão as cores do clube.

No final da audiência, o senador Paulo Paim lembrou que o Senado Federal, anualmente, concede a medalha Abdias do Nascimento, condecoração destinada a pessoas e entidades que combateram de forma efetiva o racismo no País. “Oxalá que, daqui alguns anos, a medalha Abdias do Nascimento possa ser entregue a alguma entidade esportiva por seu efetivo combate ao racismo e demais formas de preconceito”, concluiu.

Rafael Noronha

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