Gleisi: “Não houve ato, como diz a perícia, não houve crime, como diz o Ministério Público. Como vamos julgar a Presidente da República?”“A decisão do procurador federal Ivan Cláudio Marques de arquivar um procedimento criminal que apurava as chamadas “pedaladas fiscais” do Governo Dilma no BNDES precisa ser analisada com muita atenção pelo Senado, casa que está julgando o pedido de impeachment contra a presidenta da República baseado principalmente nessa alegação. “O procurador arquivou a denúncia simplesmente por entender que os atos não configuram crime. O Senado da República, pela responsabilidade que tem, tem de dar a maior atenção a esse fato”, alertou a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), em pronunciamento ao plenário nesta segunda-feira (11).
O procurador Ivan Marques é o responsável pelo pedido de investigação do processo penal das chamadas “pedaladas fiscais”. Seu trabalho iniciou-se pelo processo que diz respeito ao BNDES, mas também vai analisar as supostas “pedaladas” do Plano Safra, que deu as condições formais para a abertura do processo de impeachment.
“Desde o início desse processo, alertamos que esses atrasos de pagamentos aos bancos oficiais — seja prestação de serviço, seja de subvenção de juros para determinados programas — não constituem operação de crédito, não podem ser considerados crimes. São atrasos, como afirma a defesa da presidenta Dilma e como agora o procurador da República vem corroborar”, lembrou Gleisi.
Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o procurador Ivan Marques adiantou que vai se manifestar sobre o atraso no pagamento de outros processos das chamadas pedaladas, inclusive no exercício de 2014. Ele afirma sobre esses casos: “Foi muito similar ao BNDES, e, possivelmente, eu vá dizer que não existe crime.”
Gleisi chamou a atenção para a gravidade da situação que se apresenta: o Senado da República está processando e julgando uma presidenta que supostamente teria cometido crime de responsabilidade — que seria o de transformar um programa governamental em uma operação de crédito junto a um banco oficial. Essa tese não é abraçada pelo procurador da República encarregado de avaliar se houve crime no comportamento da presidenta.
Em 2014, o Tribunal de Contas da União decidiu tratar como “pedaladas fiscais” os atrasos em relação ao pagamento de programas sociais junto à Caixa Econômica Federal, como é o caso do Bolsa Família, e também demais atrasos de pagamentos a outros bancos públicos, passando a entender que se configurariam em operações de crédito, supostamente dando espaço fiscal à presidenta Dilma para manipular o Orçamento. “Era isso que se dizia. E se entrou com uma ação penal contra isso. E a ação penal caiu no Ministério Público Federal, para o procurador Ivan Marques, que fez esse relatório”, lembrou a senadora.
Ele criticou o pouco caso da imprensa com essa decisão do procurador, já que ela coloca em cheque a base do pedido de impeachment da presidenta Dilma.
A manifestação do procurador da República veio se somar às 39 testemunhas de defesa ouvidas na Comissão Especial do Impeachment e à perícia realizada pelo Senado, que constatou que não houve ato da presidenta em relação aos atrasos do Plano Safra. “Ou seja, a presidenta Dilma não tinha nada que a comprometesse, até porque quem sempre foi responsável por esse programa, desde 1992, por sua operacionalização e administração, era, e é, o Conselho Monetário Nacional, o Ministério da Fazenda e o Ministério da Agricultura”, ressaltou a senadora
O resumo da situação, descreveu Gleisi, é bem ilustrativo: não houve ato, como diz a perícia, não houve crime, como diz o Ministério Público. “Como vamos julgar a Presidente da República?”, questionou.
Ela defendeu que a Comissão Especial do Impeachment abra um espaço para ouvir o procurador da República Ivan Marques—ele já declarou publicamente que lamenta não ter sido chamado a depor diante da comissão do Senado. “Ele precisa falar à comissão antes da apresentação do parecer do relator”.
Gleiso alertou que o Senado precisa atentar para os riscos que pode causar à própria história, à democracia e ao País. Diante de todas as provas já apresentadas, que eximem a presidenta de crime, a Casa não pode continuar com o processo de impeachment da forma como está, sem observar o que o procurador disse. Caso contrário, “vamos entrar para a história como golpistas. Não há base legal ou constitucional para se fazer o impeachment da presidenta. Esta Casa tem a grande responsabilidade de parar com esse processo”.
Cyntia Campos
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