Arrecadação e investimento – Por José Dirceu

É incontestável que um dos principais desafios do Brasil seja reformar o sistema tributário e conseguir ampliar o nível de investimento para entre 22% e 25% do PIB. Já tratei desses temas neste espaço, mas os retomo depois que o jornal Folha de S.Paulo trouxe, em manchete (31/10), a afirmação de que só foram investidos 9% do aumento da arrecadação desde 1995. Trata-se de um debate interessante, notadamente, porque aborda o conceito do que é investimento. Mas também porque revela como temos usado os recursos arrecadados, que tipo de políticas têm sido priorizadas e o que tem feito o governo arrecadar mais.

 

Essa avaliação nos faz perceber que está equivocada a sensação que o jornal difunde de que o governo federal está gastando errado. Afinal, quase um terço da arrecadação é de contribuição previdenciária, portanto, destinada ao pagamento direto dos benefícios da Seguridade Social, sem contar a Lei Orgânica da Assistência Social. Além disso, o FGTS vai para financiamento da habitação e saneamento. E o jornal não explica isso. Mas há uma questão crucial que é o conceito de investimento.

A alta na arrecadação tem raízes na retomada do crescimento e na geração de 15 milhões de empregos formais nos últimos oito anos, ou seja, a União tem arrecadado mais por conta de políticas públicas comprometidas com a melhora do ambiente econômico e com as condições de vida da população. E é justamente nessas frentes que o estado aplica a maior parte: gastos correntes e benefícios sociais e salários.

No olhar do jornal, meramente custo; no nosso olhar, investimento.

E um tipo de investimento prioritário: o social. Sabemos que a distribuição e aumento da renda, políticas inauguradas no governo Lula e do PT, são vetores do crescimento e colaboram para um círculo virtuoso.

Além disso, os gastos correntes vão para educação, saúde, justiça e segurança. O investimento público cresceu de 1,66% para 2,86% do PIB, o que ainda é pouco, é verdade. Mas também não esqueçamos que nossos juros elevados consomem 5% a 6% do PIB com o serviço da dívida – preocupação, aliás, que os jornalões não têm. Ademais, há um lado humano esquecido na forma como se propôs o debate: tirar 28 milhões de pessoas da pobreza extrema não é algo desprezível.

Sem contar que o gasto com a máquina é, na ponta, o salário de servidores públicos, médicos, enfermeiros, técnicos, professores, juízes, promotores, policiais, gestores e assessores. Por que isso nunca é considerado como um investimento?

Destacar que o ambiente positivo, na economia e no social, amplia o interesse do investidor externo – desde janeiro deste ano, o Investimento Estrangeiro Direto cresceu 123% em relação ao mesmo período de 2010, um recorde. Portanto, desconhecer ou ignorar essa realidade é deixar o país sem uma rede de proteção social, que consome grande parte da arrecadação, mas faz o Brasil menos desigual e mais justo.

Esse é o contexto em que devemos situar os debates sobre a imprescindível reforma tributária e a necessidade de melhorar a relação investimento/PIB.

Fora dessa perspectiva, é pura manipulação de números.

Advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

Artigo publicado no jornal Brasil Econômico

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