O PT protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) ação direta de inconstitucionalidade para que seja dada “interpretação conforme a Constituição” ao artigo 4º do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003) “de modo a se estabelecer que a aquisição de munições seja autorizada nos limites que garantam, apenas e tão somente, à segurança pessoal do cidadão”. Ou seja, “a partir de normativo que fundamente de forma adequada o número indicado, sendo vedada a disposição de número que ponha em evidente risco a sociedade e possibilite a conformação de estruturas milicianas paramilitares”.
A ADI 6.466 reforça a ADI 6.134 e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 581) propostas no mês passado, respectivamente, pelo PSOL e pela Rede Sustentabilidade, especificamente, contra o Decreto 9.785 do presidente Jair Bolsonaro que, ao modificar o Estatuto do Desarmamento, teria desrespeitado “a competência do Congresso, a reserva de lei, a separação de poderes e a capacidade de regulação pelo Presidente da República”, legislando “de modo autoritário, unilateral e abusivo”. E ampliando inconstitucionalmente a lei federal de 2003.
Agora, como ressaltam logo na petição inicial os advogados do PT, Eugênio Aragão e Angelo Ferraro, pretende-se “o pronunciamento dessa Suprema Corte acerca da compreensão constitucional do próprio Estatuto do Desarmamento, buscando atribuir uma leitura restritiva de seus termos.
Dentre os argumentos constantes do pedido destacam-se os seguintes:
“Desde a edição inicial da Lei 10.826/2003, o legislador previu que a aquisição de munições apenas poderá ocorrer nos termos previstos em norma regulamentadora, sendo que a alteração promovida posteriormente pela Lei 11.706/2008 não trouxe qualquer novidade sobre isso.
“Agora cabe ao Ministro de Estado da Defesa e ao Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública, de forma conjunta, emitir ato regulamentar sobre a quantidade de munição que se autoriza o cidadão a adquirir. Dessa forma, seguindo o novo regulamento, houve a emissão da Portaria Interministerial n. 412/GM-MD, de 271/1/2020, oportunidade em que se estabeleceu o limite de 200 a 600 unidades anuais por arma de fogo. Mas a Portaria Interministerial n. 1.634/GM-MD fez este número saltar para 550 a 650 unidades mensais por arma de fogo, o que resulta entre 6.600 a 7.800 unidades por ano”.
“Excelências, isso representa um aumento repentino de até 3.200% (três mil e duzentos por cento) no número de unidades de munição permitidas por arma de fogo devidamente registrada no Brasil. Isto é, multiplicou-se por 33 vezes o número de munições disponíveis na sociedade, que podem ser usadas para diferentes fins”.
“Este número é de grande preocupação para toda e qualquer pessoa que, minimamente, compreenda que uma política de segurança pública séria não suporta um número tão expressivo de insumos para armas de fogo circulando na sociedade. Isso porque, como registrado pelo Atlas da Violência divulgado pelo próprio Governo Federal, estes dispositivos estão passíveis de roubo e furto e, consequentemente, de saírem da legalidade e serem utilizados para o cometimento de diferentes crimes”.
“Isto é, o crime organizado – tanto aquele que alimenta as redes de tráfico de drogas, como aquele concentrado nas comunidades carentes brasileiras na conformação de milícias armadas – passa a se abastecer de artefatos bélicos adquiridos regularmente por pessoas registradas. Ao fim, o delinquente que antes conseguiria furtar até 600 munições por ano de uma mesma pessoa, possui a chance de subtrair até 7.800 munições dessa mesma pessoa”.
“Não pairam dúvidas que o efeito maléfico do aumento do número de munições na sociedade tem potencial de se manifestar imediatamente. Isto é, a partir da publicação da Portaria Interministerial 1.634/GM-MD, de 22/4/2020, todo cidadão que tenha algum registro de arma de fogo poderá adquirir entre 550 a 650 munições por mês, o que pode servir para a prática de violência doméstica, suicídios por questões corriqueiras, cometimento de crimes violentos ou mesmo serem objeto de roubo ou furto e caírem nas mãos de criminosos”.