Hoje, as conversas sobre deficiência trazem o termo “capacitismo”. A palavra é nova, mas o conceito é antigo. Trata-se da errônea percepção de que uma pessoa com deficiência é incapaz de interagir e participar da vida em condições de igualdade com as demais pessoas.
Nesse sentido, atividades corriqueiras como estudar e se divertir, por exemplo, devem ser realizadas separadamente das demais pessoas. É a mesma percepção que diz que uma pessoa com deficiência é incapaz para o trabalho. Essa noção leva ao assistencialismo, princípio esse que protege, mas ao mesmo tempo afasta e isola.
Por outro lado, precisamos entender que a busca pela igualdade não elimina a necessidade e o respeito às diferenças.
Uma pessoa com deficiência não vai realizar as tarefas diárias como estudar ou trabalhar da mesma forma que uma pessoa sem deficiência, nem usará os mesmos recursos. Para que uma pessoa com deficiência se desenvolva bem, é necessário que ela tenha as mesmas oportunidades.
Incluir é dar acesso. Dar acesso é eliminar as barreiras que dificultam a participação das pessoas com deficiência na vida em sociedade.
A busca pela eliminação das barreiras, pela acessibilidade e pela inclusão é uma luta que tem mais de 40 anos. Mas ainda é um desafio. Nesta trajetória, as leis têm cumprido o seu papel, como a Lei de Cotas, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, a Lei Berenice Piana de Piana.
A lei de cotas, por exemplo, é responsável pela ocupação econômica de 98% das pessoas com deficiência que estão no mundo do trabalho. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) preconiza a educação inclusiva. O Estatuto da Pessoa com Deficiência, além de consolidar toda a legislação anterior, redefine o conceito de deficiência de acordo com os avanços internacionais. Ele determina que o Estado seja responsável por eliminar as barreiras e promover acessibilidade. A Lei Berenice Piana de Piana cria a política para a inclusão das pessoas com transtorno do espectro autista, seguimento tão excluído dentro da nossa sociedade.
Não podemos esquecer que a pandemia aprofundou as desigualdades entre as pessoas. Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), as pessoas com deficiência foram atingidas ainda mais severamente pelo desemprego. Contudo, segundo a entidade, o fechamento de postos para trabalhadores com deficiência teve início ainda em janeiro, antes da chegada da Covid-19 no Brasil.
No período de janeiro a agosto de 2020, foram fechados 849 mil postos de trabalho formais. Do total de vagas fechadas, 171,6 mil (cerca de 20%) eram destinadas a esse grupo de trabalhadores. Ainda, segundo o Dieese, até 2018, os trabalhadores com deficiência com carteira assinada chegavam a quase a 500 mil.
A carência de acessibilidade tecnológica aprofunda a dificuldade na comunicação, um cenário de distanciamento social, em que a comunicação é essencialmente remota. A falta de acessibilidade nas ruas faz com que as pessoas com deficiência necessitem mais do auxílio de outras pessoas para a mobilidade, o que é potencialmente perigoso num cenário de transmissão do coronavírus.
É necessário que o Estado brasileiro e as esferas governamentais adotem políticas públicas que garantam maior acessibilidade e empregabilidade, bem como a garantia de uma melhor representatividade política. Segundo levantamento da Agência Pública, com base em informações do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), apenas 1,2% (6.584) do total de candidaturas para o pleito municipal de 2020 se declarou com alguma deficiência. Ou seja, uma participação ínfima.
Para o 3 de dezembro deste ano – Dia Internacional da Pessoa com Deficiência – o Senado Federal lançou a campanha “Capacitismo não tem vez”, buscando desconstruir a noção de incapacidade das pessoas com deficiência.
Em âmbito internacional, a ONU (Organizações das Nações Unidas) apresentou como tema deste ano o lema “Construir melhor em direção a um mundo pós-Covid-19, inclusivo, acessível e sustentável”. A campanha mostra que a busca por um mundo mais igual e inclusivo não foi abandonada. E persiste mesmo em uma realidade tão adversa. E voltará com toda força no pós-pandemia.
Em todo este cenário de desafios e de busca de novos caminhos, o envolvimento de toda a sociedade é fundamental para que soluções sejam encontradas. Afinal, estamos tratando de 47 milhões de brasileiros que possuem algum tipo de deficiência, dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).