O presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco, foi um dos representantes brasileiros na COP 26, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. No dia 9 de novembro, em Glasgow, na Escócia, ele afirmou: “assumimos pelo Senado Federal os compromissos legislativos de acompanhamento, inclusive, da gestão feita pelo governo federal em relação ao combate ao desmatamento ilegal. Leis, nós temos, mas precisamos é fazer cumprir a lei no Brasil, evitando que haja esse desmatamento”. Cerca de um mês após o evento mundial, a Casa que Pacheco preside se depara com o desafio de barrar projetos que provocam não apenas o desmatamento, mas a injustiça e mais violência no campo.
Os dois projetos – PL nº 2.633/2020, já aprovado pela Câmara dos Deputados, e o PL nº 510/2021, de autoria do senador Irajá (PSD/TO) – tramitam em conjunto e aguardam votação nas Comissões de Meio Ambiente e de Agricultura. O relator, senador Carlos Fávaro (PSD/MT), apresentou na semana passada (8/12) um texto que reúne elementos das duas propostas. O resultado é a manutenção de alguns retrocessos e o agravamento de outros.
Entre os principais pontos estão a anistia a quem invadiu terras públicas depois de 2011, contrariando o marco temporal previsto em lei; a redução do prazo de garantias socioambientais que devem ser cumpridas após a titulação das terras; a transferência da prerrogativa de resolução de conflitos agrários a municípios (mais expostos a pressões); e a dispensa de vistoria prévia, pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), de imóveis com até 15 módulos fiscais (no caso da Amazônia, 1.650 hectares) para efeito de titulação. Nesse caso, bastaria a apresentação de documentos simples – como o CAR, Cadastro Ambiental Rural – e de declarações por parte do ocupante da terra.
A professora e pesquisadora da Climate Policy Initiative (CPI), grupo de estudo ligado à PUC-RJ, Cristina Leme Lopes, adverte que a aprovação do projeto poderá legalizar terras invadidas sem o compromisso de regularizar os passivos ambientais. Ainda segundo Cristina Leme, diferentemente do que vendem o governo e sua base aliada, esses projetos não tratam da titulação de terras para pequenos produtores, que possuem no máximo quatro módulos fiscais e respondem por 88% das áreas que reivindicam regularização no país:
— A lei que trata da regularização para pequenos produtores não muda. O que os dois PLs tratam é de flexibilizar, beneficiar a aquisição de terras públicas por grandes fazendeiros.
O objetivo de concentrar terras, em vez de democratizá-las, fica evidente também na retirada da limitação legal que impede que proprietários de terra e antigos beneficiários de programas de regularização fundiária possam se beneficiar com novas titulações. Para piorar, o relatório amplia a possibilidade de extinção de projetos de assentamento – destinados a populações agroextrativistas, por exemplo – para dar lugar a grandes licitações de terras públicas.
A conclusão dos maiores especialistas do país em cartografia, sensoriamento remoto e controle de desmatamento é de que só a expectativa de aprovação desses projetos bastou para aumentar os índices de desmatamento na Amazônia nos últimos meses. Um evidente sinal de que as matérias em análise no Senado vão na contramão de acordos internacionais assinados pelo Brasil e dos compromissos assumidos pelo presidente do Congresso frente a outros líderes mundiais na COP 26.