“Por orientação da minha defesa e com base na ordem do habeas corpus concedida pelo STF, farei uso do meu direito constitucional ao silêncio.” Essa foi a tônica do depoimento do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, à CPMI do Golpe, nesta terça-feira (11/7).
Por conta de habeas corpus concedido pela ministra Cármen Lúcia, o depoente não era obrigado a responder às perguntas feitas na CPI do Golpe para que não produzisse provas contra si mesmo. Mauro Cid, contudo, avançou no direito obtido e deixou de responder questionamentos simples feitos pelos parlamentares – que não tinham qualquer relação com as investigações em curso –, como se negar a responder sua própria idade e até mesmo a responder se se considerava inocente.
Durante a oitiva, o presidente da comissão, deputado Arthur Maia (União-BA), anunciou que a CPMI deverá fazer uma denúncia ao STF pelo descumprimento do habeas corpus por parte de Mauro Cid. “Aquilo que não o incriminasse ele tinha obrigação de responder”, lembrou.
Mauro Cid está preso desde 3 de maio, acusado de fraudar cartões de vacinação, e é investigado em oito inquéritos, incluindo sua possível participação no estímulo a atos golpistas e à invasão de prédios públicos em Brasília.
Ele também é apontado como um dos articuladores de uma conspiração para reverter o resultado eleitoral do ano passado, inclusive com planos de uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
De acordo com investigações da Polícia Federal, mensagens capturadas com autorização judicial após apreensão do celular de Cid evidenciam que ele reuniu documentos para dar suporte jurídico à execução de um golpe de Estado.
A relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), questionou o depoente sobre fatos que envolvem as investigações como: as motivações para a suposta fraude nos cartões de vacinação do ex-presidente e seus familiares e sobre as trocas de mensagens com o coronel do Exército Jean Lawand Júnior, que implorava por manifestação oficial do ex-presidente Jair Bolsonaro a uma intervenção das Forças Armadas. Cid não só não se insurgia contra as mensagens golpistas como dizia que as coisas estavam andando.
A senadora perguntou ainda o motivo de integrantes do governo Bolsonaro terem ido visitá-lo na prisão, como o ex-ministro da Saúde e deputado federal Eduardo Pazuello. Mantendo a postura covarde, Mauro Cid permaneceu em silêncio.
“Se o senhor Mauro Cid falasse hoje, acabavam os trabalhos da CPMI. Não precisava investigar mais nada. Porque ele viu tudo, ouviu tudo e sabe de tudo. É incrível como onde havia um malfeito do Bolsonaro, lá estava Mauro Cid”, resumiu o deputado federal Rubens Pereira Junior (PT-MA).
O deputado Rogério Correia (PT-MG) tentou obter informações de Mauro Cid em relação a sua participação na confecção da minuta do golpe e da tentativa de um golpe de Estado no país, alvos de investigações em curso contra o ex-ajudante de ordens. Além disso, o deputado relatou que a imprensa solicitou, por meio da Lei de Acesso à Informação, acesso ao e-mail oficial de Mauro Cid. No entanto, a caixa de mensagens estava vazia.
“Não existia absolutamente nada no e-mail oficial. Deduzimos que o senhor apagou o que estava no e-mail oficial da ajudância de ordens. E isso é crime. Apagar documentos para apagar provas é algo sério. Mais uma denúncia feita contra o senhor”, disse o deputado.
Mauro Cid desmoraliza o Exército
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) lembrou que as Forças Armadas investem um grande volume de recursos públicos na formação de quadros para que seus membros tenham um leque de competências profissionais. Isso deveria ser motivo de orgulho para os brasileiros, apontou o petista.
Já a postura de Mauro Cid, que compareceu fardado à CPMI, trata-se de um completo desrespeito ao Exército Brasileiro por tentar envolver a instituição Exército Brasileiro nas falcatruas a que Mauro Cid responde, prosseguiu o senador petista.
“O tenente-coronel [Mauro] Cid não devia, em homenagem ao Exército Brasileiro, e em respeito a essa instituição, apresentar aqui seu uniforme. Acho um desrespeito, na condição de suspeito, trazer aqui este uniforme. Porque mostra ao Brasil um envolvimento que não é institucional. Mas parece que o senhor está aqui representando uma instituição. Acho isso reprovável”, destacou o senador.
Convocação de Bolsonaro e Michelle
A deputada Erika Hilton (PSOL-SP) questionou se Mauro Cid estava tentando proteger alguém com seu silêncio perante o colegiado. Diante da ausência de resposta, a parlamentar informou que apresentará requerimentos para convocação, na condição de investigados, do ex-presidente Jair Bolsonaro e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro para prestarem depoimento na CPMI.
Bolsonarista acusado de transfobia contra deputada
O senador Rogério Carvalho, seguido de outros parlamentares, acusou o deputado bolsonarista Abilio Brunini (PL-MT) de transfobia contra a deputada Erika Hilton.
A deputada disse que Brunini precisava “tratar sua carência em outro espaço”, já que o Congresso Nacional é um espaço sério. Brunini tem se notabilizado por fazer provocações durantes as manifestações de parlamentares governistas e tentar impedi-los de completar o raciocínio durante as oitivas.
“O [deputado] Abílio foi homofóbico. Fez uma fala homofóbica, quando a companheira estava se manifestando, ele acusou e disse que ela estava oferecendo serviços. Isso é homofobia, é um desrespeito. Peço a vossa excelência que o senhor peça para o deputado se retirar do plenário”, disse, em tom de cobrança ao presidente da CPMI, deputado Arthur Maia.
Após a confusão, Arthur Maia determinou a abertura de investigação sobre o caso, masno bolsonarista provocador seguiu na comissão.
Requerimentos aprovados
Antes do início da oitiva de Mauro Cid, a CPMI aprovou 90 requerimentos de quebras de sigilo, pedidos de informação e acesso a relatórios financeiros. Entre os pedidos aprovados está a quebra do sigilo telemático do tenente-coronel Mauro Cid, no período em que ocupava a função de ajudante de ordens do ex-presidente.
Também foram aprovadas as quebras de sigilos do coronel Jean Lawand Júnior, do ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques e de George Washington de Oliveira, acusado de arquitetar um ataque terrorista próximo ao Aeroporto de Brasília no final do ano passado.