“Acre pode se orgulhar de seus senadores”, afirma Cristovam

“Acre pode se orgulhar de seus senadores”, afirma Cristovam

Embora sem condições materiais, políticas e legais para acolher as centenas de migrantes haitianos, o Acre não tem se omitido no dever de solidariedade a esses refugiados da fome e da falta de perspectivas. “Fico orgulhoso de ver que não viemos aqui discutir soluções policiais ou de fronteiras, mas buscar uma saída humanitária para a crise”, afirmou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), que presidiu o debate na Comissão de Relações Exteriores (CRE).

Ele elogiou a postura dos dois senadores acreanos, Jorge Viana e Aníbal Diniz, que foram enfáticos na defesa de uma solução que ampare os migrantes haitianos. “Nossa preocupação é com as condições sub-humanas a que estão submetidas essas pessoas e com os riscos decorrentes dessa situação”, afirma Jorge Viana. “Queremos uma solução para os migrantes aqui no Brasil. Não aceitamos que eles sejam mandados de volta para a Bolívia ou Peru, onde têm sofrido toda sorte de violência”, completa Aníbal Diniz.

Segundo Cristovam, “O Acre pode se orgulhar de seus senadores” pela postura humanista adotada, ainda que diante dos transtornos enfrentados pelo estado para apoiar os migrantes. “E todos nós podemos nos orgulhar do Senado Brasileiro. Em poucos países do mundo uma situação como essa estaria sendo discutida nesses termos e não na perspectiva de como se livrar do problema”, afirmou o pedetista.

Solidariedade acreana
Calcula-se que pelo menos 4 mil haitianos já entraram no Brasil pela rota Andina-Amazônica, passando pelo Equador, Peru e Bolívia, nos últimos dois anos. Segundo o representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados- ACNUR, Andrés Ramirez, também presente à audiência, há 3.200 haitianos vivendo em Manaus e 1.100 em em Tabatinga. No Amazonas, a ajuda aos migrantes vem de organizações da sociedade civil, notadamente da Pastoral do Migrante, organização ligada à Igreja Católica. O governo amazonense alega não ter condições de participar do esforço humanitário.

A situação é diferente no Acre. Lá, o governo do estado já gastou, só em 2011, cerca de R$ 1 milhão em ajuda aos “refugiados”, concentrados principalmente na pequena Brasiléia, com 13 mil habitantes na área urbana. O número de haitianos na cidade varia a cada dia. Neta terça-feira, eram 811— “E mais cerca de 50 em Iñapari, no Peru, esperando para atravessar a fronteira, esta noite”, segundo o senador Aníbal Diniz.

Café da manhã
As condições de alojamento são dramáticas. O hotel local, com 80 leitos, chega a abrigar quatro e até cinco vezes mais gente que sua capacidade. “As instalações sanitárias estão em colapso. Não é exagero imaginar que, em breve, poderemos ter que lidar com uma epidemia de cólera em Brasiléia”, afirma Aníbal.

O governo do Acre tem arcado com as despesas de hospedagem e também com a alimentação dos migrantes, garantindo a todos eles duas refeições diárias — almoço, às 13 horas, e jantar, às 19 horas. Há alguns dias, o Ministério Público Federal decidiu que essa ajuda era insuficiente e determinou, também, o fornecimento do café da manhã: dois pães e um copo de leite para cada migrante. “O estado não tem orçamento para isso. É preciso que o governo federal assuma a situação”, defendeu Jorge Viana.

Antes do terremoto
O fluxo de haitianos para o Brasil foi intensificado após o terremoto que devastou o país, em janeiro de 2010, e o surto de cólera registrado em outubro daquele ano. Mas o terremoto não explica tudo: “Um ano após a devastação do país caribenho, o Chile sofreu uma catástrofe semelhante, resultante de tremores até mais fortes, sem que isso desencadeasse uma crise humanitária”, lembra o representante do ACNUR.

Os haitianos fogem da fome endêmica, da falência institucional e econômica do país mais pobre das Américas — o primeiro do mundo a abolir a escravidão e o segundo do continente a se tornar independente dos colonizadores europeus, na esteira de uma rebelião de escravos que pregavam a República, a liberdade e a igualdade, em 1794. Isso custou ao Haiti 60 anos de feroz bloqueio comercial comandado pelos Estados Unidos e pelos maiores países da Europa Ocidental.

Cyntia Campos

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