A mistura de terra e mãos semeia o ventre que faz nascer a vida e ensina que o pão que dela nasce deve ser dividido em grandes atos de amor e de humanidade na fluidez constante dos rios da alma e das coisas simples que o coração fala.
Deixamo-nos levar pelos horizontes do Brasil interiorano, seus ensinamentos e cores que brotam do chão e pelo suor de homens e mulheres que acordam o sol e fazem das flores estrelas do céu e do trabalho sagrado olhares de mil esperanças.
A Agricultura Familiar tem força e tenacidade, uma capacidade incrível e uma perspectiva grandiosa para alimentar o nosso País inteiro, para erradicar a fome, a pobreza e a miséria, levando sonhos e conjunções de felicidade àqueles que mais precisam.
Investir nesse setor da economia é acreditar na geração de emprego e renda; no desenvolvimento sustentável, no respeito ao meio ambiente, à biodiversidade e ao ecossistema; na segurança alimentar, no combate ao êxodo rural e no crescimento do País em sua essência e realidade.
Atualmente, a Agricultura Familiar emprega cerca de dez milhões de trabalhadores, segundo o IBGE. Envolve mais de quatro milhões de famílias. É responsável pela economia de 90% dos municípios com até vinte mil habitantes; 40% da população economicamente ativa depende dessa prática.
Ainda, segundo o IBGE, ela ocupa 23% do território nacional e 77% dos estabelecimentos; 70% dos agricultores possuem de um a 50 hectares de terra e 70% da alimentação que vai para a mesa do brasileiro é produzida por esse setor.
A importância da sua produção está assim representada: 70% do feijão; 34% do arroz; 87% da mandioca; 46% do milho; 38% do café; 21% do trigo; 60% do leite; 59% do rebanho suíno; 30% dos bovinos; entre outros, como os produtos hortifrutigranjeiros.
A Agricultura Familiar tem um faturamento anual de US$ 55 bilhões verificados pelos censos agropecuários, conforme a Embrapa. Portanto, é um setor da economia brasileira que merece ser olhado com mais carinho. Os governos precisam ter iniciativas que viabilizem a garantia do que hoje se tem e a própria expansão do setor.
Os desafios são enormes. Muito já se fez, mas temos totais condições de fazer muito mais, por meio de boas práticas e políticas públicas e de Estado que envolvam a cadeia produtiva, como uma roda, em que a sociedade seja agregada, beneficiando a todos.
Precisamos pensar como manter o jovem no campo e como melhorar a qualidade de vida e o trabalho, juntamente com mulheres, idosos e aposentados. Temos que ficar atentos à masculinização do campo e ao envelhecimento da população, situação que preocupa. A extensão rural tem papel fundamental em todo esse cenário. Lembro aqui do SENAR, da EMATER e da EMBRAPA, que fazem um belíssimo trabalho.
Os desafios não param: aumento da produtividade e a melhoria nos resultados; disponibilização de novas tecnologias; melhor distribuição de terras com reforma agrária, conservação e novas estradas para escoamento, energia elétrica e internet; cooperativas mais abrangentes, chegando onde o agricultor familiar está e dando respostas às suas necessidades.
Todas as condições que se tem hoje, disponibilizadas pelos governos Federal, Estadual e Municipal precisam, de uma forma estratégica, ser acrescidas e melhoradas. Ou seja, temos que pensar em mais alternativas, mais crédito, seguros de produção, incentivos à comercialização e ao custeio. O Pronaf precisa disponibilizar mais dinheiro.
Agora, nesta pandemia, a Agricultura Familiar é um dos setores mais atingidos e que mais vem sofrendo. Além disso, como exemplo de que esse setor precisar ser olhado com mais carinho, pois há outros tantos problemas que o envolvem, como as intempéries climáticas, cito aqui o nosso Rio Grande do Sul, que teve que enfrentar ainda uma fortíssima estiagem. Mais de 400 municípios entraram em estado de emergência. Houve uma drástica redução na produção de leite.
O Congresso Nacional precisa aprovar, imediatamente, o PL 735/2020, que traz um conjunto de medidas emergenciais para socorrer esse setor atingido pela pandemia. Aqui a minha reverência aos movimentos dos agricultores familiares, sindical e social, que, com muito diálogo e argumentação, estão agindo na articulação da aprovação desse projeto.
Creio que o desenvolvimento sustentável e o crescimento do Brasil, a redução das desigualdades sociais e da concentração de renda, a geração de emprego e renda que tanto buscamos, passam pelo fortalecimento da Agricultura Familiar e pelo respeito aos homens e mulheres agricultores, trabalhadores e trabalhadoras do campo.
Mas, entendo também que essa não é apenas uma questão do Brasil: a Agricultura Familiar é um debate planetário, uma visão de mundo que unifica a solidariedade entre os povos e está ligada diretamente à sobrevivência da humanidade, pois é por meio dela que mais de 50% dos alimentos são produzidos no mundo.
Artigo originalmente publicado no Jornal do Brasil