Ana Rita: Brasil só será justo quando erradicar a violência contra a mulher

Os 100 dias de atividades da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência contra a Mulher foram o tema do pronunciamento da senadora Ana Rita (PT-ES), relatora da CPMI, em discurso ao plenário do Senado, na tarde desta terça-feira (05/06). “Esse é um momento oportuno para fazermos um balanço sobre a situação de violência vivida pelas mulheres brasileiras e também para uma reflexão”, afirmou a senadora.

Instalada em fevereiro deste ano, a CPMI investiga a situação da violência contra a mulher no Brasil e apurar as denúncias de omissão por parte do poder público na aplicação dos instrumentos de proteção às vítimas e tem apurado inúmeras situações de violação dos direitos humanos das mulheres. Até o momento, a comissão já realizou 18 audiências, diligências e reuniões em seis Estados brasileiros. “A situação de descaso com a vida das mulheres é semelhante em todo o País”, constata Ana Rita.

A situação agravou-se nas últimas décadas, relata a senadora. O Brasil já o sétimo país do mundo número de mortes de mulheres. O baixo índice de resolução dos crimes e a demora nos julgamentos dos casos concluídos resultam em impunidade. “O caso de Maria da Penha só não prescreveu por que foi levado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, lembra a senadora.

O Brasil, segundo ela, vive uma contradição: tem uma das melhores legislações de violência doméstica do mundo – a Lei Maria da Penha –, mas sua aplicação por parte do sistema de justiça enfrenta enormes resistências. “Não são raros os casos em que as mulheres procuram o sistema de justiça em busca de proteção e não são atendidas”. Ana Rita cita o caso de Fernanda Rodrigues Crisóstomo, assassinada no Espírito Santo, em fevereiro deste ano. “Após peregrinar por mais de 30 dias, na busca de uma medida protetiva, sem que nenhum dos poderes do sistema de justiça cumprisse o seu dever, ela foi assassinada pelo ex-companheiro”.

Ana Rita alerta para a necessidade de que as instituições públicas realizem suas atribuições com zelo “e não tolerem, em nenhum caso, atitudes individuais que violem a lei e que levem a situações dramáticas e irreversíveis”.

Outro exemplo citado pela senadora é o de Renata Rocha Araújo, assassinada em Belo Horizonte, no último dia 16 de maio. Renata solicitou, por duas vezes, medida protetiva contra seu ex-companheiro. “O magistrado local, alegando falta de provas e o fato de que a Lei Maria da Penha não foi criada para destruir a família e o casamento, indeferiu o pedido da medida”, relata a senadora.  “Casos como esses demonstram a absoluta incompreensão dos poderes públicos sobre a violência doméstica e sobre a Lei Maria da Penha, que foi criada para proteger as mulheres dentro de famílias e casamentos violentos, que exemplificam a dura realidade da violência cotidiana vivida pelas mulheres brasileiras”, afirmou Ana Rita.

A senadora considera inaceitável que o Brasil, sexta maior economia do mundo, com uma Constituição garantidora de direitos, e subscritor de tratados internacionais “ainda não considere a violência doméstica, sexual e urbana contra mulheres como um problema social grave, que deve ser enfrentado com seriedade”. Para ela, “é intolerável que as instituições de justiça continuem a promover a conciliação em conflitos domésticos em detrimento da proteção à integridade física e psíquica das mulheres”.

Apesar dessa dura realidade, a senadora capixaba reconhece avanços nas políticas públicas nos últimos anos, principalmente a partir da estruturação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. “A força dos movimentos de mulheres tem feito avançar o debate e as políticas públicas específicas para as mulheres”. Ana Rita relata que a CPMI tem conseguido importantes compromissos dos poderes públicos em todos os estados visitados. “A violência contra a mulher atinge a todas nós e é consequência do exercício do poder patriarcal presente em todas as instituições públicas e privadas”.

Ana Rita conclamou o conjunto de senadores e senadoras a colocarem na agenda política e em suas plataformas de mandato o tema da violência contra mulheres. “Cobrem de forma persistente dos governos e dos demais poderes dos seus estados o cumprimento do Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher. Com isso, estarão contribuindo não apenas com a CPMI, mas, fundamentalmente, com a instauração de um Estado democrático de verdade, pois não há menor possibilidade de se construir um país verdadeiramente moderno, justo e avançado, tolerando-se práticas tão atrasadas e nefastas contra as mulheres”.

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