Ana Rita reage à autorização para produzir cana na Amazônia

Articulados, ruralistas conseguem aprovar projeto em comissão do Senado. 

Ana Rita reage à autorização para produzir cana na Amazônia

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“Cria-se um precedente
para que outras áreas em
situações semelhantes
possam receber plantio
de cana ou de outro cultivo
que não possibilita a
recuperação das áreas”

Como já se previa, o projeto de lei (PLS 626/2011) que permite o plantio de cana-de-açúcar em áreas de preservação sensíveis, como a Amazônia Legal e o Pantanal, foi aprovado pela Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), dominada pela bancada ruralista no Senado. Contrariando técnicos e o próprio Governo Federal, os senadores defensores dos interesses ruralistas se articularam, burlaram o regimento e conseguiram aprovar a alteração do Zoneamento Agroecológico (ZAE) do País, nesta terça-feira (14).

 

Preocupados com o impacto ambiental da medida, os senadores Ana Rita (PT-ES) e Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) representaram as vozes destoantes do discurso da maioria ruralista e os dois votos contrários ao projeto. Numa tentativa convencer os colegas a compreender o quão “inoportuno” é a expansão das áreas de cultivo de cana para além do ZAE, a petista advertiu para a possibilidade do Congresso Nacional criar um precedente que pode derrubar por terra o Programa de Reflorestamento Ambiental (PRA), que está sendo desenvolvido pelo Ministério do Meio Ambiente conforme orientação do novo Código Florestal Brasileiro.

“Esse projeto é inoportuno. Se são áreas já degradadas, elas precisam ser recuperadas e transformadas em áreas de florestas. O plantio de cana-de-açúcar não é melhor caminho. Cria-se um precedente para que outras áreas em situações semelhantes possam receber plantio de cana-de-açúcar ou de outro cultivo que não possibilita a recuperação dessas áreas e tornam o solo cada vez mais infértil. A monocultura fragiliza muito o solo e seria muito melhor a recuperação dessas áreas”, ponderou Ana Rita.

Apelando para a necessidade de aumentar a produção de biocombustíveis, os senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA) e Acir Gurgacz (PDT-RO), respectivamente, autor e relator do projeto, fizeram efusivas defesas pela aprovação da matéria. Para Flexa, muitas áreas com alta aptidão para o plantio de cana-de-açúcar foram excluídas pelo ZAE, quando este não analisou os biomas Amazônia e Pantanal e a Bacia do Alto Paraguai.

Ao que parece, o tucano esqueceu-se de que o ZAE foi elaborado com a finalidade de impedir o plantio de cana em algumas regiões e incentivar em outras, a partir das informações que orientaram a produção do documento. Algumas áreas ficaram de fora do mapeamento, à época de sua produção após um acordo firmando entre os ministérios, por serem tecnicamente frágeis ao cultivo da planta. Além disso, no Zoneamento destaca-se que “o País não necessita incorporar áreas novas e com cobertura nativa ao processo produtivo”. Os resultados obtidos no estudo demonstram que o Brasil dispõe de cerca de 63,48 milhões de hectares de áreas aptas à expansão do cultivo com cana-de-açúcar.

Posição do Governo

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O Governo realiza diversas iniciativas
para promover o desenvolvimento
socioeconômico da região amazônica
aliado à conservação ambiental

Em nota técnica, o Ministério do Meio Ambiente ressaltou que o Governo desenvolve diversas iniciativas para promover o desenvolvimento socioeconômico da região amazônica aliado à conservação ambiental. “É exemplo a recente aprovação do zoneamento agroecológico da cultura de palma de óleo, que tem a região como alvo prioritário, e constitui alternativa de inclusão econômica e social para os produtores locais”, dizia o texto, que sugeriu o arquivamento do projeto.

Outra fala elucidativa foi emitida pelo coordenador-geral de Açúcar e Álcool da Secretaria de Produção e Agroenergia do Ministério da Agricultura, Cid Jorge Caldas, durante uma audiência no ano passado, enquanto o PLS 626 ainda estava tramitando na Comissão de Agricultura do Senado (CRA). Caldas observou que os empresários que se aventurarem a explorar a cana-de-açúcar e a produção de biocombustível, na certa, colherão prejuízos. “O clima e a localização da Amazônia tiram o atrativo do investimento”, afirmou.

À época, Caldas deu como exemplo o caso de uma usina de álcool, localizada a 150 km de Manaus (AM), que enfrenta enormes dificuldades com a interrupção constante do trabalho por semanas inteiras, por causa das chuvas. “Esta usina funciona por um dia ou dois, e interrompe o trabalho por uma semana, enquanto usinas de outras regiões do País funcionam diuturnamente”, disse. “Além disso, a Região Amazônia está distante dos centros comerciais, dos portos, fatores que elevam o custo da produção, sem contar o encarecimento de terra e insumos dos últimos anos”.

A suspeita de um golpe
Para além da maioria ruralista dentro CMA, que por si só já evidencia uma articulação em defesa dos interesses agropecuaristas em desfavor das questões ambientais, algumas suspeitas sobre a aprovação do PLS 626 pairam no ar. A primeira delas foi a mudança do horário de funcionamento da comissão. Tradicionalmente marcada para às 11h30 das terças-feiras, a reunião deliberativa de hoje foi reagenda para às 8h30 apenas no final da tarde de ontem, sem justificava.

Igualmente estranha foi a forma como Blairo Maggi (PR-MT), presidente da CMA e o maior produtor de soja do País, ignorou o regimento interno do Senado e iniciou a sessão sem quórum. Às 8h35, quando o senador abriu a reunião, apenas três assinaturas constavam na folha de presença – apenas um terço das nove necessárias para discutir qualquer matéria.

Catharine Rocha

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