A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT – RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o Supremo Tribunal Federal marcou para esta quarta-feira a discussão sobre a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa. Eu observo aqui, hoje, muitos Senadores – Senador Pedro Simon, Senadora Ana Amélia, Senador Paim – e muitos outros Senadores que já se manifestaram neste plenário, favoráveis à votação e aprovação desta lei de grande importância para a política brasileira.
Há uma grande expectativa na sociedade para que as eleições municipais de 2012 já sejam conduzidas com base nos critérios definidos pela Lei da Ficha Limpa. E o critério mais relevante é justamente o que impede a candidatura de políticos com condenação em colegiados de segunda instância.
Em um País em que vicejam escândalos envolvendo os políticos, com inevitável desgaste para todos, inclusive para aqueles que cumprem rigorosamente com suas obrigações, é fundamental dotar a Justiça de mecanismos que possam filtrar, de alguma forma, o ingresso aos cargos de poder.
Então, a Lei da Ficha Limpa, fruto de proposição legislativa que surgiu no seio da sociedade brasileira e que foi apresentada a este Congresso Nacional com mais de um milhão de assinaturas, representa uma conquista histórica, que impõe a todos uma profunda reflexão sobre a atividade política em nosso País.
Quero, portanto, deixar aqui registrado o meu apoio à Lei e a sua aplicação, torcendo para que o Supremo Tribunal Federal tenha, nesta quarta-feira, o mesmo entendimento, sob pena de gerar grande frustração em toda a sociedade brasileira e no Congresso Nacional, porque tem muitos Senadores, muitos Deputados que estão torcendo e trabalhando para que ela seja aprovada já para as eleições de 2012.
Mas, Srª Presidenta, Srs. Senadores, eu gostaria de tocar num outro tema de fundamental importância também para o nosso País, que é a regulamentação da Emenda nª 29, a emenda que disciplina investimentos em saúde no nosso País. Definir uma correlação entre saúde de qualidade e investimento constitui questão essencial para o nosso País.
Uma criança nascida hoje em um país desenvolvido pode esperar viver cerca de dez anos mais que uma nascida em 1960. Nos últimos cem anos, o nível de morte prematura caiu pela metade. Isso se deu, em grande parte, pelas melhorias dos cuidados médicos. Assistimos, no passado recente, a avanços decisivos na prevenção e no tratamento de doenças graves, como as cardíacas ou o câncer.
Conseguimos praticamente erradicar determinadas moléstias, graças a imunizações ou a novos medicamentos. Temos hoje como tratar doenças crônicas de forma a prolongar a vida das pessoas e, em especial, melhorar sua qualidade de vida.
Com novas drogas, técnicas e procedimentos, podemos tratar essas doenças melhor do que antes. Técnicas cirúrgicas minimamente invasivas proporcionam restabelecimento mais rápido e menos doloroso para os pacientes. Alguns que outrora sequer eram candidatos a cirurgia podem agora receber cuidados médicos eficientes.
Esses avanços têm um custo. E um custo elevado. As despesas – podemos dizer investimentos – em saúde representam em média mais de 8% do Produto Interno Bruto dos países industrializados. Ultrapassam 10% nos Estados Unidos, na Suíça e na Alemanha.
É um aumento significativo em relação aos níveis anteriores. Em 1970, os custos ligados à saúde não representavam, em média, mais de 5% do Produto Interno Bruto dos países desenvolvidos. Esse aumento se deve não apenas ao progresso registrado pela medicina, mas também às crescentes expectativas de cuidados médicos. Podemos registrar isso no Brasil, onde todas as pesquisas de opinião mostram que a saúde ocupa o primeiro lugar entre as preocupações dos entrevistados, à frente da segurança e da educação.
Decorre daí uma lição, Srs. Senadores: se os avanços tecnológicos permitem que se faça muito mais e, com isso, abrem uma nova expectativa, também precisaremos pagar mais. Será esse um problema ou uma solução? Podemos ser otimistas. Prolongar a vida com mais qualidade significa que os benefícios ultrapassam os custos suplementares, mas eles existem e é preciso lhes fazer frente. Isso coloca em discussão o papel do Poder Público. Mesmo nos países já desenvolvidos, cerca de três quartos das despesas de saúde provêm do dinheiro público. E vamos lembrar que isso ocorre no momento em que os orçamentos governamentais vêm sendo reduzidos. Até nos Estados Unidos, onde o setor privado desempenha papel muito mais importante nesse financiamento, as despesas públicas já representam 6% do Produto Interno Bruto e estão em alta. Isso explica a prioridade conferida pelo Presidente Barack Obama ao seu programa de saúde.
Esses dados não são estáticos, Srª Presidenta. A pressão dos custos de saúde é crescente e incessante. Como já disse a Presidenta Dilma Rousseff, não se faz saúde de qualidade sem um custo elevado. Mais do que isso, há um fator adicional a examinar. Refletindo os avanços contínuos nos cuidados médicos, haverá demanda maior pelas populações idosas. Ao mesmo tempo, a parcela da população economicamente ativa tende a decrescer em relação ao total, provocando ainda mais tensão nas finanças públicas.
Srª Presidenta, o Brasil registrou progressos significativos na universalização do atendimento médico. Avançou, por exemplo, na sofisticação dos tratamentos acessíveis ao conjunto da população. Não podemos perder de vista que o Brasil tornou-se o único País com mais de 100 milhões de habitantes a assumir o desafio de implementar um sistema universal, público e gratuito de saúde.
Hoje, 145 milhões de brasileiros dependem exclusivamente do SUS para sua assistência médica. Não há paralelo no mundo.
O SUS chegou à média anual de 32 milhões de procedimentos ambulatoriais, um milhão de internações por mês e dois milhões de partos. É hoje quem faz o maior número de transplantes de órgãos no Planeta. Mantém a maior rede de bancos de leite, igualmente em todo o mundo.
É quem movimenta 90% do mercado de vacinas do País. Partem dele, do SUS, 80% dos investimentos no combate ao câncer. E é ainda o responsável por 90% das hemodiálises realizadas no País. Todos eles são tratamentos de valor elevado.
Tudo isso mostra por que o SUS opera a um custo cada vez mais alto, tanto per capita quanto no valor total. Seu gasto em medicamentos e em equipamentos de saúde, por ano, chega a R$10 bilhões. Corresponde a 50% do mercado da área de equipamentos e 25% do mercado de medicamentos.
Decreto Presidencial de 28 de junho de 2011 institui mecanismos de controle mais eficazes e criou instrumentos para que o Ministério da Saúde atue na pactuação e no monitoramento das ações realizadas na rede pública, com o intuito de racionalizar esses gastos e de proporcionar maior transparência.
Entretanto, Srª Presidenta, justamente em função dos custos do equipamento e da pressão da demanda, ainda há problemas a corrigir. Um dos exemplos está na demora no início dos tratamentos.
É o que acontece no caso da quimioterapia. O tempo de espera médio tem sido de 76 dias. Apenas 35% das pessoas foram atendidas em 30 dias, prazo recomendado pelo Ministério da Saúde. Na radioterapia, a espera média chega a 113 dias e apenas 16% são atendidos no primeiro mês.
Srª Presidenta, essa lentidão se deve, reconhecidamente, às despesas elevadas e à necessidade de novos investimentos na saúde. É por isso que adquire especial relevância a discussão que agora empreendemos neste Congresso Nacional sobre a regulamentação da Emenda nº 29.
Esperamos que essa regulamentação que agora examinamos assegure à saúde do nosso País um fluxo contínuo de recursos, dando previsibilidade às contas do setor e garantindo instrumentos para que a sociedade possa cobrar o uso desses recursos.
Será possível, Srª Presidenta, a partir daí, disciplinar os gastos com saúde, retirando de sua base de cálculo áreas paralelas, ainda que não menos relevantes, como saneamento básico. Assim, os investimentos deverão atender exclusivamente, a partir de agora, a pré-requisitos, como sua destinação a ações e serviços de acesso universal, de responsabilidade específica do setor de saúde.
Acredito, sinceramente, que, com a regulamentação da Emenda nº 29, conseguiremos um avanço significativo para a ampliação e qualificação da assistência médica em nosso País.
Então, Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, eu queria aqui registrar a nossa grande preocupação com esses dois temas tão relevantes, neste momento, para o Congresso Nacional e para a sociedade brasileira: a regulamentação da Emenda nº 29, que destina recursos para a saúde do nosso País, da nossa população, e a aprovação, na quarta-feira, no Supremo Tribunal Federal, da Lei da Ficha Limpa.
Era isso que eu tinha a dizer.
Muito obrigada, Srª Presidenta.