Perguntas que Moro e procuradores não querem responder (Parte 2)

Perguntas que Moro e procuradores não querem responder (Parte 2)

Foto: Alessandro DantasAlceu Nader

9 de novembro de 2016 | 09h33

Na segunda – e última – reportagem da série, mais doze perguntas que o jornal “O Estado de S. Paulo” deixou de fazer para o juiz Sergio Moro na entrevista publicada no último domingo (06). Na sequência, a comprovação de que as denúncias contra Lula são despropositadas e ineptas, o uso abusivo de divulgação selecionada de delações precisa ser comprovado para ter valor legal e a falta completa de fundamento das acusações contra o ex-presidente.                            

Então, as denúncias contra Lua são despropositadas, ineptas?

Apesar das centenas de páginas com que os procuradores de Curitiba escreveram para sustentar suas acusações, o texto é lacônico, genérico e superficial, e se perde quando vagueia entre teses de ciência política, que não nada tem a ver com a lei, muito menos quando fazem parte de uma peça acusatória.

As acusações têm outros buracos. Primeiro, não individualiza as condutas de Lula e dona Marisa determinada pela Lei. Segundo, não diz quais os fatos tidos por criminosos e de todas as suas circunstâncias, com determina o art. 41, do CPP.

Fora isso, sobram exemplos em que um trecho da acusação desmente outro, além da confusão de fatos e conceitos. Os procuradores exageraram na “convicção” de que Lula é culpado, levados pela ilusão de prendê-lo. São também fundamentalistas e generalizam o que não podem, como fizeram ao afirmar que há ampla corrupção no Congresso Nacional sem nenhuma identificação.

Mas e as delações que os procuradores dizem apontar para Lula?

A lei é clara: delação não é prova, mas apenas “meio para obtenção de prova”, como define o Supremo Tribunal Federal. Isso sem contar que várias das delações foram obtidas sob constrangimento, como descreveu o ex-senador Delcídio Amaral, que resolveu fazer sua delação depois de ter sido trancado em um quarto-cela sem luz e que enchia de fumaça de um gerador.

Isso tem outro nome: é tortura. Mais grave de tudo é que várias dessas técnicas de coação foram praticadas com a aprovação do juiz responsável pelos inquéritos da Lava Jato, Sérgio Moro, que também é acusado de usar delação premiada (do ex-deputado Pedro Corrêa) sem que ela tivesse sido homologada pelo STF.

Moro também usou a delação de Fernando Moura, que depois afirmou ter mentido, além de permitir que acusações dessas delações chegassem à imprensa sem qualquer prova, com a intenção de queimar a reputação dos acusados e usar a opinião publicada pela imprensa para pressionar outras instâncias do Poder Judiciário.

Mas, então, por que os procuradores acusam Lula e dona Marisa de “corrupção passiva”?

Mais uma ilegalidade, pois a acusação dos procuradores não apresenta qualquer elemento concreto que evidencie participação de Lula e de D. Marisa em crime de corrupção passiva qualificada. Toda denúncia de corrupção passiva deve descrever quanto e como o acusado se beneficiou – e isso também os procuradores de Curitiba foram incapazes de apontar. Para eles, basta ser amigo ou aliado político de pessoas condenadas para a imputação de crimes “por osmose”.

Outro crime de que Lula é acusado no caso do apartamento do Guarujá é o de lavagem de dinheiro. Há provas?

Elas não existem – e nem poderiam existir, porque Lula nunca cometeu esse tipo de crime. Essa acusação tem de ser respondida com outras perguntas. Como eles podem ser acusados de lavagem de dinheiro, por causa das reformas que fizeram no imóvel, se o apartamento não é nem nunca foi deles?

Como lhe acusam de ser dono do apartamento, se o apartamento não está registrado no Cartório de Registro Imobiliário no nome dele, nem de qualquer outra pessoa de sua família?

Mas onde estariam as provas que fundamentam as acusações contra Lula?

Elas não estão em lugar algum. Por essa razão, é que os advogados do ex-presidente querem saber como, onde e por quê os promotores fundamentam suas acusações. Eles também querem encontrar as provas. Por isso, pediram que sejam anexadas as vinte delações, assim como os depoimentos complementares, nos quais que os procuradores dizem ter encontrado suposta vinculação com Lula. Para se precaver de edições e omissões de delações feitas pelos procuradores, o que já aconteceu mais de uma vez, seus advogados também querem ter acesso à integra de todos os áudios e vídeos em que as delações foram gravadas.

Quais são as outras informações que comprovam que Lula está falando a verdade?

Da Petrobras, os advogados de Lula querem que sejam incorporadas aos inquéritos todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias do seu Conselho de Administração e do seu Conselho Fiscal, do período entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, assim como as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão de Licitação da Companhia no mesmo período e, ainda, de pareceres e manifestações emitidos pelo órgão nesse período;

Para afastar a suspeita de que Lula participou da indicação de vários diretores da Petrobras acusados de corrupção, seus advogados também querem que a Petrobras envie o histórico completo dos acusados no período em que foram funcionários da Petrobras, mas não apenas as datas em que eles foram admitidos e demitidos. A defesa do ex-presidente quer saber de que forma eles foram admitidos (se indicados ou por concurso), quais os cargos que ocuparam e quer saber também quais os órgãos que participaram da designação de cada um dos cargos ocupados por Delcídio do Amaral, Nestor Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Pedro Barusco.

Outra documentação requerida pela defesa é a anexação ao processo de todos os elementos relativos aos pagamentos realizados pela Companhia ao Grupo OAS denunciados. Eles querem não apenas os comprovantes de pagamento, com a indicação das datas, locais e meios usados para a realização de tais pagamentos. Fora isso, também quer ter acesso às cópias das auditorias financeiras e jurídicas realizadas sobre os contratos denunciados com a OAS.

Essa mesma falta de documentação se repete em outras denúncias que atingem o ex-presidente?

Lamentavelmente, sim.

Por exemplo?

Por exemplo, no caso do apartamento do Guarujá, os advogados de Lula requerem que seja anexado ao inquérito a relação de todos os empreendimentos que foram transferidos ao Grupo OAS e outras empresas construtoras pela Bancoop, bem como o histórico dessas transferências, incluindo, mas não se limitando, à participação do Ministério Público e eventual(is) homologação(ões) judicial(is) e, ainda, a análise por outros órgãos de controle. Além disso, querem que seja exposto o histórico da cota-parte da adquirida (e posteriormente) vendida do apartamento adquirido em nome de dona Marisa Letícia.

Do condomínio Solaris, onde está o apartamento, eles pedem que seja enviada a cópia de todos os registros de entrada e saída de Lula e Marisa Letícia no edifício até a presente data – seja por meio de imagens, seja por meio de anotações. Outras provas pedidas são as ações de cobrança do condomínio do edifício de todos os apartamentos de propriedade da OAS, junto com documentação que conste a relação de todos os moradores e prestadores de serviços registrados no período compreendido entre 2009 até a presente data.

Fora isso, a defesa também quer saber a data em que as obras do edifício foram concluídas, a situação em que cada um de seus apartamentos se encontrava, incluindo registros no Cartório de Registro de Imóveis, quais as alterações feitas depois de concluídas as obras no apartamento 164-A, que é identificado pelos procuradores como de propriedade de Lula, e qual o seu valor final após essas alterações.

E a denúncia da cozinha de luxo que teria sido comprada para o apartamento? 

Nesse caso, a defesa quer que a empresa que vendeu os equipamentos, a Fast Shop envie para a Justiça as cópias de notas fiscais relativas a todas as compras realizadas pelo Grupo OAS no estabelecimento entre 1º/01/2003 a 16/01/2016. Também relativa a essa acusação, a defesa de Lula pede a Tallento Construtora seja ouvida para informar se houve algum contato feito com a empresa por Lula e Marisa Letícia e, em caso positivo, encaminhe a a cópia da eventual correspondência supostamente havida entre eles.

Sobre a acusação de desvio do acervo presidencial, alguma prova foi requerida?

Sim, uma muito simples. Que a transportadora e armazenadora de bens Granero encaminhe cópia de todas as correspondências, minutas e contrato(s) firmado(s) em relação ao acondicionamento do acervo presidencial relativo a Lula.

Mas os procuradores também envolvem a construtora OAS na acusação que envolve o pagamento das palestras de Lula:

Para contrapor essa ilação, a defesa quer saber se a construtora contratou palestras de outros ex-presidentes da República do Brasil e, caso seja positiva a resposta, indique os eventos e valores envolvidos. Também quer saber se a OAS fez doações a outros ex-presidentes ou a entidades a eles relacionadas e, caso digam que sim, que sejam indicadas as datas e os valores envolvidos.

Desse enredo, ainda faltam pedidos de provas de outros envolvidos?

Sim, por essa razão que a defesa quer que a Presidência da República envie para os inquéritos que tentam incriminar Lula as informações de todas as 84 missões empresariais que Lula no cargo de Presidente da República entre os anos de 2003 a 2010, incluindo os destinos e os participantes.

Do Congresso, a defesa quer que sejam informados à Justiça o status de todos os projetos de lei apresentados pela Presidência da República entre os anos de 2003 a 2010, constando, dentre outras coisas, as emendas apresentadas e eventual quórum de aprovação, incluindo a cópia do relatório final e de todos os documentos da chamada “CPMI do Mensalão”.

Outro órgão do Congresso do qual se requer provas, os advogados querem que o Tribunal de Contas da União (TCU) envie para Sergio Moro cópia de todos os procedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisões proferidas nesses procedimentos.

A mesma prova documental foi pedida para a CGU nos procedimentos que a controladoria executou na Petrobras entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, inclusive com os eventuais pareceres dos auditores e suas decisões e recomendações.

É possível que alguma irregularidade não tenha sido detectada pela CGU nem pelo TCU?

É improvável. Por essa razão os advogados do ex-presidente querem também que as consultorias independentes Ernest & Young, Price Water House Coopers e KPMG informem se identificaram algum ato de corrupção ou qualquer ato ilícito que tenha sido cometido na Petrobras com a participação de Lula e, na hipótese de resposta positiva, para que encaminhe o eventual trabalho correspondente, bem como todo o material de apoio.

Além de informações dessas empresas reconhecidas em todo o mundo, a defesa de Lula também pede que seja feita uma prova pericial multidisciplinar para identificar se houve desvio de recursos da Petrobras nos três contratos indicados na denúncia, quem seriam os beneficiários por esses desvios, e o ex-presidente ou dona Marisa estão entre esses supostos beneficiários.

* Texto originalmente publicado na Agência PT 

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