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CPI: Barros foi facilitador político da Belcher junto ao governo

Representante da farmacêutica Belcher, da mesma cidade de Ricardo Barros, admite que participou de reunião no Ministério da Saúde marcada pelo líder do governo após ter assinado termo de confidencialidade com a farmacêutica CanSino
CPI: Barros foi facilitador político da Belcher junto ao governo

Foto: Alessandro Dantas

O depoimento do sócio da farmacêutica Belcher, Emanuel Catori, nesta terça-feira (24) à CPI da Covid, deixou clara a atuação do líder do governo Bolsonaro na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), como facilitador político da empresa junto ao Ministério da Saúde. Catori confirmou ter participado de reunião no Ministério agendada por Barros.

Catori foi chamado a depor sobre as negociações que a empresa teve com o governo Bolsonaro e o laboratório chinês CanSino, fabricante da vacina contra a Covid-19 Convidecia. A Belcher atuaria como intermediária no negócio, à exemplo de Precisa Medicamentos na negociação do imunizante indiano Covaxin.

Alegando problemas de compliance, a CanSino descredenciou a Belcher antes que o contrato fosse formalizado. A Belcher tem sede em Maringá (PR), cidade natal e reduto eleitoral do líder do governo Ricardo Barros.

O encontro articulado pelo deputado bolsonarista ocorreu no dia 15 de abril. Na ocasião, a Belcher já havia assinado um termo de confidencialidade com a farmacêutica chinesa CanSino para a venda da vacina Convidecia no Brasil. Apesar disso, Catori negou que tenha negociado a venda do imunizante com o ministro Marcelo Queiroga. Segundo o empresário, a reunião foi destinada a tratar de um antiviral.

Na avaliação dos senadores, essa é a repetição do modus operandi adotado para aquisição da vacina indiana Covaxin. Se por um dado o governo Bolsonaro ignorava centenas de comunicações da Pfizer, comprava um quantitativo mínimo ofertado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e menosprezava a produção de imunizantes pelo Instituto Butantan, por outro  lado priorizava a compra de vacinas por meio de atravessadores pouco confiáveis como Belcher (Convidecia), Davati (Astrazeneca) e Precisa (Covaxin).

Foto: Alessandro Dantas

“É a cópia do que a Precisa [Medicamentos] iria fazer. A escolha da Belcher não se deu por acaso, não caiu do céu. Ela foi trabalhada, intermediada por pessoas de dentro do governo. Foi uma atuação política para promover esse casamento entre Belcher, Ministério da Saúde e CanSino. A CanSino viu que era uma fria e resolveu romper o contrato. A Covaxin entrou naquela fria e está suja em vários lugares. Nesse sentido, os chineses foram mais espertos que os indianos”, disse o senador Humberto Costa (PT-PE).

O senador também questionou o fato de a audiência solicitada pelo deputado Ricardo Barros com o ministro Marcelo Queiroga não ter nenhuma ata relatando o que foi debatido. O único registro é uma foto com a mesa de reuniões lotada que foi publicada pela assessoria do Ministério.

“Quando foi perguntado, Ricardo Barros disse que tinha levado o senhor [Catori] para apresentar um remédio antiviral [ao Ministério]. [O relator] chegou a questionar se achava correto um deputado levar um empresário para vender antiviral. Segundo fato: essa reunião foi marcada por Ricardo Barros, como se ele fosse sozinho, e ele trouxe esse pessoal todo [se referindo à foto apresentada no telão pouco antes]. Terceiro fato: essa reunião não tem ata. Só sabemos que houve essa reunião porque a comunicação do Ministério publicou uma foto”, destacou Humberto.

Na avaliação do senador Rogério Carvalho (PT-SE), a CPI cumpriu um papel fundamental ao desnudar as irregularidades cometidas pelo governo Bolsonaro na gestão da pandemia. E, apesar do habeas corpus obtido por Emanuel Catori que o permitiu permanecer em silêncio diante de perguntas que pudessem incriminá-lo, o senador aponta que o volume de documentos em posse do colegiado seja suficiente para esclarecer ao Brasil todos os crimes cometidos pelo governo federal desde o surgimento da Covid-19.

Foto: Alessandro Dantas

“Esta CPI mostrou todas as ilegalidades do governo Bolsonaro na condução da pandemia. Tenho dito que os fatos se sobrepõem às narrativas, às histórias contadas aqui, como se nós não tivéssemos acesso a outras fontes de informações. Com o senhor não vai ser muito diferente”.

Interesse de Wizard e Hang em vacinas
Emanuel Catori afirmou aos senadores ter participado de uma reunião com os empresários bolsonaristas Luciano Hang e Carlos Wizard para tratar da compra de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19 por parte do governo.

Além disso, o sócio da Belcher afirmou também ter dialogado com Hang e Wizard, entre fevereiro e março deste ano, para intermediar a compra de doses da vacina CoronaVac. Segundo ele, o imunizante seria doado ao Sistema Único de Saúde (SUS). No Brasil, a SinoVac possui contrato de exclusividade com o Instituto Butantan.

Questionado pelos senadores, Catori afirmou que, na época da negociação, não sabia da cláusula de exclusividade, e que as negociações foram suspensas após os empresários tomarem conhecimento do fato. O representante da Belcher negou ainda que os empresários Hang e Wizard tenham participado da negociação para compra do imunizante da CanSino.

O senador Humberto Costa questionou o interesse de empresários bolsonaristas na aquisição privada de vacinas para Covid-19, uma vez que a alegada intenção de compra “humanitária” era contraditória com a própria postura de lobby demonstrada junto ao Congresso Nacional, que pedia a aprovação de uma legislação que permitisse a compra e a comercialização privada de imunizantes, em detrimento do Sistema Único de Saúde (SUS).

“Não consigo acreditar que esses empresários se reuniram com o secretário-executivo, com a Embaixada da China, com o ministro da Saúde por um espírito humanitário de doar vacinas para o SUS. Pelo contrário, o tempo inteiro essas empresas atuaram no Congresso Nacional para facilitar a comercialização de vacina”, disse.

“Não é por acaso que o senhor [Luciano] Hang chama [a lei] de jabuticaba brasileira. Porque só poderia doar [as vacinas compradas por empresas]. Só iria vender depois que toda população vulnerável estivesse vacinada. Esse argumento não se sustenta. Houve tráfico de influência, advocacia administrativa e outros crimes cometidos pelo Ministério da Saúde”, afirmou o senador.

 

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