O que falta para a abusiva taxa básica de juros (Selic) de 13,75% cair no Brasil? Para o presidente do Banco Central (Bacen), Roberto Campos Neto, é a queda da inflação. O contraditório é que a inflação atual no Brasil é a mais baixa dos últimos dois anos. O tema foi debatido nesta terça-feira (25) durante audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Durante o debate, Campos Neto disse que, caso a inflação seja contida, a taxa Selic poderá voltar a cair no país. No entanto, o índice em março, na gestão Lula, atingiu o menor patamar dos últimos dois anos: 4,65% em 12 meses – percentual que mantém o país dentro da meta da inflação para 2023 (até 4,75%).
“Ao longo dos anos, temos diminuído o juro real do Brasil – com alguns solavancos de tempos em tempos. A gente vem de um período com taxas muito mais altas e, ultimamente, está mais baixa. Se fizermos o trabalho de conter a inflação, poderemos voltar a cair a taxa de juros e ter uma tendência de melhora”, afirmou.
Comparando com o governo Bolsonaro, em 2021, a inflação foi de inacreditáveis 10,06%, enquanto a taxa de juros naquele ano terminou em 9,25% ao ano.
Senadores do PT enquadraram o presidente do Bacen, questionando o motivo da autoridade monetária insistir em juros que beneficiam apenas rentistas e prejudicam milhões de famílias brasileiras, especialmente aos mais pobres. Os beneficiados, mesmo, são os investidores que ocupam os prédios comerciais da avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo (SP).
“Queria perguntar ao presidente do Banco Central se ele sabe quanto custa um litro de leite, um quilo de arroz, um quilo de feijão. Porque, com todo respeito, nós temos que sair da Faria Lima e interagir com a população que mais precisa”, criticou o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES).
Segundo ele, ao manter a Selic em 13,75%, não se cumpre o objetivo da lei que rege a autonomia do Bacen, que determina o fomento ao pleno emprego. A equação é simples: com juros tão altos, o empresário vai preferir aplicar no mercado financeiro a investir recursos na própria empresa.
“Hoje temos aí 62,5 milhões de brasileiros e brasileiras abaixo da linha da pobreza. Uma desigualdade social e regional. E essa taxa de juros só vai aprofundar essa desigualdade”, disse Contarato, destacando que quem sofre os piores efeitos são os mais pobres.
No mesmo tom, a senadora Teresa Leitão (PT-PE) questionou como o Bacen pode contribuir para equilibrar a geração de emprego com o desenvolvimento econômico. Ela lembrou que a autonomia da autoridade monetária não significa deixar de focar no crescimento do país.
“É urgente o crescimento econômico responder também à inclusão. Do crescimento também corresponder à geração de empregos. Tarefa esta legalmente competente ao Banco Central”, lembrou a parlamentar.
Para a senadora Augusta Brito (PT-CE), Campos Neto fez uma longa explanação em defesa da taxa abusiva, mas não explicou o que está sendo feito para reduzi-la. “Juros que não fazem bem a ninguém. Nem ao setor produtivo, nem em relação à queda do desemprego”.
Já o senador Rogério Carvalho (PT-SE) afirmou que a meta de inflação não pode ser uma “camisa de força” para obrigar o país a alterar a taxa de juros ao ponto de tornar a economia vulnerável. Para ele, é preciso rever o patamar e garantir “fôlego para a geração de emprego”.
“Política monetária e política fiscal precisam caminhar juntas. É bom deixar o debate político para nós políticos e trabalhar no ponto de vista colaborativo”, finalizou Rogério.
Confissão
Campos Neto confessou que a inflação de 5,79% do Brasil no ano passado foi alcançada a partir das manobras do governo anterior. Na época, Jair Bolsonaro adotou uma série de medidas eleitoreiras que reduziram temporariamente, por exemplo, o preço dos combustíveis, o que ajudou a derrubar o índice inflacionário de forma artificial.
“A gente vê que o Brasil saiu muito da meta em 2021 [quando alcançou 10,06%]. Ficou mais perto da meta, mas ainda fora do corredor, em 2022. Isso foi até um pouco artificial, porque a gente teve medidas de desoneração de preços de telecomunicações, combustível e eletricidade”, explicou o presidente do Bacen.
Pede pra sair
Campos Neto também foi pego no pulo por senadores de outros partidos. Questionado por Omar Aziz (PSD-AM) se quem paga a conta dos juros altos são os mais pobres, disse acreditar que “o custo seja para toda a economia, inclusive para o pobre. Recai, também, sobre o emprego”.
Já o senador Cid Gomes (PDT-CE) lembrou que os juros altos, além de comprometer as finanças públicas – já que aumentam os gastos do país com pagamentos da dívida pública, ainda comprometem a iniciativa privada de investir. Ele destacou ainda a questão política envolvida na presença do presidente à frente do Bacen: Campos Neto fez manifestações públicas em defesa do ex-presidente Bolsonaro.
“Nessa hora, me perdoe, mas aceite a minha sugestão: pegue o seu bonezinho e peça para sair”, ironizou Cid durante a audiência, entregando em seguida um boné ao presidente do Banco Central.
Recentemente, até mesmo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, teceu críticas. Segundo ele, o país não tem como crescer com juros a 13,75%. “Se há algo que nos une, neste momento, é a impressão, o desejo e a obstinação de reduzir a taxa de juros no Brasil.”
A fala ocorreu durante evento empresarial em Londres. Ele ressaltou que as “marolas” políticas não podem interferir drasticamente na economia. O presidente do Congresso disse que, mesmo sob ambiente de “ruído”, o Brasil teve taxa de juros de 2% no passado.