Tortura nunca mais

CDH requisita áudios que revelam tortura na ditadura

Além de requerer as gravações, presidente da Comissão, senador Humberto Costa, pediu audiência pública sobre o assunto. Em alguns trechos, de acordo com estudioso do material, ministros zombam das vítimas da violência da ditadura
CDH requisita áudios que revelam tortura na ditadura

Foto: Alessandro Dantas

São cerca de 10 mil horas de áudio, gravados entre 1975 e 1985, que, de acordo com análise do historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), revelam como os ministros do Superior Tribunal Militar (STM) recebiam os relatos de tortura durante a ditadura e como lidavam com eles. A denúncia foi publicada pelo blog da jornalista Miriam Leitão, no jornal O Globo, neste domingo (17), e gerou pedido duplo do presidente da Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, Humberto Costa (PT-PE). Ele quer acesso aos áudios e uma audiência pública para tratar do assunto.

“É muito grave a denúncia apresentada. Ela reforça, confirma que era de conhecimento dos oficiais militares a tortura, e que pouco se fez para evitá-las. Era de conhecimento público, e especialmente dos que compunham o Tribunal Militar, a existência de sevícia, violência, do que se fazia nos porões da ditadura” – justificou Humberto Costa, que incluiu no pedido o convite ao professor Carlos Fico para que participe da audiência no Senado.

As gravações das sessões do STM foram obtidas pelo professor a partir de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2015. De lá para cá, Carlos Fico vem analisando o material. Mas, no início de abril, após o episódio em que o deputado Eduardo Bolsonaro debochou das torturas sofridas por Miriam Leitão na ditadura, decidiu compartilhar os áudios com a jornalista. Na ocasião, o deputado filho do presidente escreveu “Coitada da cobra”, numa rede social, ao comentar uma das torturas sofridas por Miriam Leitão, que, grávida, foi colocada em uma sala de quartel com uma cobra.

Em entrevista, o pesquisador disse que os áudios do STM revelam “piadas” com vítimas das sevícias: “sobretudo em sessões secretas, esses ministros se sentiam muito confortáveis. Tem falas muito pesadas, grotescas, piadas com vítimas de tortura”. O conteúdo gravado também aponta divergências entre os ministros de farda. Enquanto alguns exigiam provas para se convencer das torturas, outros condenavam seus autores, “indivíduos covardes, na maioria das vezes de pior caráter que o encarcerado”.

Na opinião de Humberto Costa, o material confirma o teor das investigações da Comissão da Verdade, que atuou entre 2012 e 2014. “A Comissão da Verdade foi um grande passo. Mas ainda há um enorme caminho a percorrer”, acrescentou o senador, para quem a audiência pública na CDH “vem num momento muito importante, em que o presidente Jair Bolsonaro reacende o debate sobre a ditadura, defendendo suas práticas e, principalmente, quando milhões de brasileiros que não viveram aquela experiência precisam, num ano de eleição, ser advertidos sobre o que quer Jair Bolsonaro ao final das contas: instaurar uma ditadura e se proclamar ditador do Brasil”.

Em postagem numa rede social, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) reforçou: “A ditadura escancarada: os áudios de ministros do STM são mais uma prova das torturas praticadas pelo regime de terror que durou 21 anos no Brasil. A Comissão de Direitos Humanos do Senado, da qual sou vice-presidente, irá apurar a fundo essas revelações”.

 

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