Nos últimos dias, Bolsonaro tem corrido para negar que vá acabar com a reposição da inflação no salário mínimo, plano dele e de Paulo Guedes revelado na semana passada pelo jornal Folha de S. Paulo. Segundo a reportagem, a manobra seria feita por meio de mudança na Constituição, desobrigando o governo de repor essas perdas. Hoje, os benefícios são corrigidos com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do ano anterior, o que ao menos garante, a quem ganha até 5 salários mínimos, a paridade em relação ao aumento de preços.
Embora negue o plano ao ser pilhado pela imprensa, faz sentido que Bolsonaro deseje cortar a correção inflacionária dos holerites. Afinal, já é certo que ele será o primeiro chefe do Executivo, desde o início do Plano Real, a encerrar o mandato com o salário-mínimo valendo menos do que quando entrou. E mais da metade dos brasileiros depende disso. São mais de 100 milhões de trabalhadores e ao menos 36 milhões de aposentados e pensionistas.
Sem ganho real
Um público que já sofre outra tortura. O atual governo acabou com a Política Nacional de Valorização do Salário Mínimo, criada em 2004 por Lula, e mantida até 2019. A fórmula assegurava aos empregados com carteira assinada – e aos demais que têm esse piso como referência – reajuste com base na variação do PIB, mais inflação, ou seja, aumento real no final do mês.
Cálculo do economista Francisco Faria, da LCA Consultoria, noticiado pela colunista Miriam Leitão, aponta que, com o fim dessa política, os trabalhadores perderam R$ 1.058,00 desde janeiro de 2020. Caso o ganho real fosse mantido pelo atual governo, o salário mínimo, hoje, seria de R$ 1.248,00, ao menos R$ 36 maior do que é.
“Quando da vigência daquela regra, PIB mais inflação, o salário mínimo chegou a valer 360 dólares. Fato inédito. Hoje está em cerca de 240. Ele é um poderoso instrumento de distribuição de renda, mesmo se considerarmos o trabalho informal”, sustenta Paulo Paim (PT-RS), um militante da Política Nacional de Valorização do Salário Mínimo. Levantamento publicado nesta segunda-feira pelo UOL mostra que, sem essa política desenvolvida até 2019, o salário mínimo hoje não passaria dos R$ 700.
Antes era melhor
Os números confirmam outro argumento de Paim, o de que o aumento da renda faz aumentar o consumo e a produção, criando um círculo virtuoso. Nos governos Lula e Dilma, o salário mínimo teve reajuste de 76% acima da inflação. E os demais setores da economia comemoraram o aumento da demanda por produtos, o que fez crescer a capacidade produtiva. “Isso só foi possível pela determinação política e econômica voltada para o desenvolvimento social e de forte combate à pobreza e à miséria” – reforça o senador.
O impacto é sentido igualmente na arrecadação de impostos, acrescenta Paim: “propicia uma melhora na situação do comércio local – mercados, padarias, bodegas, feiras, lojas – aplicando oxigênio na arrecadação dos municípios. Todos ganham”.