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Psiquiatra, ex-ministro da Saúde e defensor de uma abordagem menos criminal com atenção à saúde pública no que diz respeito à dependência química, o senador Humberto Costa (PT-PE) voltou a defender a penalização apenas para os grandes traficantes e tratamento psiquiátrico para o dependente. “Qualquer proposta que trate do assunto deve estabelecer uma distinção importante entre o que é o traficante e o que é o dependente. Caso contrário, corremos o risco de penalizar quem precisa de tratamento”, alertou.
Além de ser contrário à criminalização do usuário de drogas, Humberto rejeita firmemente a tentativa de segregar o dependente químico, internando-o à força em hospitais psiquiátricos ou clínicas de recuperação, nem mesmo com a anuência da família. “Essa ideia de internação compulsória e adoção de pseudotratamentos é uma prática antiga, superada e que, em muitos casos só traz como resultado a cronificação da doença”, garantiu.
Desde as primeiras discussões sobre a Reforma Psiquiátrica, ainda na década de 90, o senador engajou-se na luta antimanicomial. Em seu pronunciamento ao plenário nesta quarta-feira (06), ele defendeu o tratamento da dependência química nos Centros de Assistência Psicossocial Álcool e Drogas (Caps-AD). “Lá, são desenvolvidas ações de ressocialização e enfrentamento da dependência que é, acima de tudo, um problema psiquiátrico”, insistiu.
Referindo-se à proposta que veio da Câmara dos Deputados e que deve ser apreciada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nos próximos dias – o projeto de Lei nº 37 de 2013 -, Humberto disse que houve avanços, especialmente se for levada em conta a comparação com o projeto original ,de autoria do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), foi apresentado em julho de 2010.
No que diz respeito à tratamento, Humberto aceita apenas o acolhimento de dependentes químicos em comunidades terapêuticas. “Houve avanços, como a não-aceitação da internação compulsória de pacientes, mas ainda há um leque aberto de possibilidades para a internação voluntária, que pode ser uma responsabilidade da família”, criticou.
Para Humberto, há ainda a possibilidade do texto, relatado pelo senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) na CCJ, trazer ainda mais avanços à discussão.
A proposta
Relatado pelo deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL), o PL 37 tramitou em conjunto com outras 16 proposições, analisadas por uma Comissão Especial criada em maio de 2012 pela Câmara dos Deputados. A proposta foi aprovada no fim do ano passado, na forma de substitutivo com diversas propostas polêmicas. Em março de 2013, a matéria foi aprovada no plenário daquela Casa em regime de urgência com nove emendas
Foram eliminados diversos pontos polêmicos, como a obrigação de professores identificarem alunos suspeitos de envolvimento com drogas; a transferência direta de recursos federais para estabelecimentos privados que atuam no acolhimento de usuários e dependentes; a possibilidade de qualquer servidor público solicitar a internação involuntária do usuário ou dependente; agravamento generalizado das penas criminais, inclusive para o usuário ou dependente; entre outras.
O texto enviado ao Senado Federal altera treze diplomas legais objetivando reformular a política sobre drogas, em quatro grandes eixos: a estruturação do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas; a atenção aos usuários ou dependentes de drogas; aspectos criminais e processuais penais; e o financiamento das políticas sobre drogas.
Responsabilidade da família
Entre outros pontos, o projeto prevê a possibilidade de as famílias ou responsáveis legais de usuários de drogas requererem, mesmo sem o consentimento do dependente, a internação em instituição de saúde para tratamento e desintoxicação. Para que haja a internação à revelia, contudo, será necessário o aval de um médico.
Para o autor do projeto, a internação involuntária tem como finalidade principal atender aos usuários que estão nas ruas sem condições de se reabilitar. Pela regra aprovada pelos deputados, a internação involuntária irá se estender apenas pelo tempo necessário à desintoxicação, não ultrapassando 90 dias.
Além disso, os familiares ou representantes legais do usuário poderão, a qualquer momento, solicitar aos médicos a interrupção do tratamento. O texto ressalta ainda que as internações voluntárias e involuntárias de dependentes só são indicadas quando os recursos “extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”.
O projeto de lei determina também que as internações e altas dos dependentes químicos deverão ser informadas, em no máximo 72 horas, ao Ministério Público, à Defensoria Pública e outros órgãos de fiscalização. Apesar de prever a comunicação às autoridades, a proposta de lei assegura o sigilo das informações do paciente.
Penas para traficantes
Outro ponto no projeto é o endurecimento da punição para os chefes do tráfico de drogas. O texto determina que quem exerce o “comando individual ou coletivo” de organização criminosa voltada ao tráfico de entorpecentes poderá ser condenado a penas que variam entre 8 e 15 anos de prisão em regime fechado. Atualmente, a punição para quem vende, fornece, fabrica, importa ou exporta drogas é de 5 a 15 anos.
A proposta especifica que organização criminosa é a associação de quatro ou mais pessoas ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com o objetivo de obter, “direta ou indiretamente”, vantagem de qualquer natureza, “mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 anos, ou que sejam de caráter transnacional”.
Conheça o projeto de lei 37/2013
Giselle Chassot
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