8 de janeiro

CPMI aprova relatório que indicia Bolsonaro e prevê ações contra ataques à democracia

Rogério Carvalho destaca que ninguém foi indiciado por perseguição, mas por contribuir com uma “história de horror contra a democracia”. Para Contarato, trabalho da CPMI só será concluído quando todos os golpistas forem condenados
CPMI aprova relatório que indicia Bolsonaro e prevê ações contra ataques à democracia

Senadores Fabiano Contarato (PT-ES) e Eliziane Gama (PSD-MA): petista e relatora atuaram em conjunto com parlamentares democráticos pela aprovação do relatório da CPMI do Golpe

Após cinco meses de trabalho, a CPMI do Golpe aprovou nesta quarta-feira (18/10), por 20 votos a favor e 11 contra, o relatório oficial do colegiado apontando culpados e propondo caminhos para que nunca mais o Brasil seja refém de aspirações golpistas e autoritárias.

O documento de 1.333 páginas indicia 61 pessoas – entre eles, o ex-presidente Bolsonaro, cinco ex-ministros, dois ex-comandantes das Forças Armadas e dezenas de militares – pelos atos que culminaram nos ataques terroristas do dia 8 de janeiro nas sedes dos Três Poderes, em Brasília.

Mesmo com o relatório aprovado, o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), acredita que o trabalho da CPMI ainda não terminou.

“Ele só vai estar efetivamente finalizado quando todos esses golpistas forem condenados e pagarem pelos ataques à democracia. […] A liberdade de expressão não pode ser usada como escudo para a prática de crime”, destaca o parlamentar.

Contarato aproveitou para elencar o passo a passo golpista que levou ao 8 de janeiro. Entre eles, os ataques constantes ao sistema eleitoral promovidos pelo ex-presidente. Uma dessas ações, inclusive, culminou na contratação de um hacker para tentar burlar o sistema eleitoral e enganar a opinião pública com um código-fonte fake da urna eletrônica.

O questionamento às urnas, aliás, chegou a ser levado para reunião com a cúpula das Forças Armadas por Bolsonaro. Ao lembrar do tema, o senador Rogério Carvalho aponta que os fatos destacados no parecer aprovado colocam em evidência toda a construção golpista do governo anterior.

“Nenhum dos indiciados está aí por injustiça ou perseguição, mas porque contribuíram com essa história de horror contra a democracia que dura desde o início desta nação, que é uma elite que quer dominar o poder a qualquer custo, independente da vontade popular”, disse Carvalho.

O deputado Rogério Correia (PT-MG) disse esperar que o resultado do relatório se torne um grande movimento no país para que seja punidos os responsáveis pela organização dos atos antidemocráticos. “Que o ex-presidente Jair Bolsonaro não tenha anistia, como não tenham anistia generais ou civis que participaram dessa articulação do golpe”, disse.

Para o deputado Rubens Pereira Jr (PT-MA), a oposição – que insistiu na abertura da CPMI – está arrependida de insistir na abertura dos trabalhos do colegiado. “O que eu percebo é que a oposição ficou carente ao longo desse processo. Por isso tantas interrupções [durante as audiências da comissão], porque aqui eles não tiveram muitas alegrias. Pelo contrário”, argumenta.

Um dos votos a favor do relatório, do deputado Pastor Henrique (PSOL-RJ), homenageou a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), vítima de golpe de Estado em 2016. Além disso, na época do processo de impeachment na Câmara Federal, foi atacada pelo então deputado Jair Bolsonaro: ele exaltou o coronel Carlos Brilhante Ustra, que a torturou durante o período da ditadura militar.

Eu quero dedicar este voto à Dilma Rousseff. Uma mulher que sofreu um golpe parlamentar misógino e, já que o Bolsonaro elogiou torturador, eu termino homenageando a torturada”, coloca.

Propostas

Além dos indiciamentos, o relatório de Eliziane Gama ainda aponta propostas no âmbito do Congresso Nacional para defender a democracia e prevenir novos ataques antidemocráticos no país.

Uma das sugestões é a aprovação do PL 3.611/2023, que endurece as penas para os crimes contra o Estado democrático de Direito. Ela ainda recomenda o fortalecimento da educação sobre a importância da democracia nos ambientes formativos e na educação básica.

Há ainda proposta para que os trabalhos das CPIs não sejam limitados. Neste sentido, ela sugere adequar as normas para que os prazos estabelecidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU), destinados ao atendimento das demandas desses colegiados.

A parlamentar ainda sugere a criação do Dia Nacional de Defesa da Democracia, que já vem sendo informalmente comemorado no dia 25 de outubro, data do assassinato do jornalista Vladimir Herzog, em 1975.

Finalmente, Eliziane propõe alterar uma lei em vigor (11.473/2007) para prever que a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) possa atuar de ofício, por determinação do Ministro da Justiça, dentro do perímetro situado a 33 metros da delimitação externa dos edifícios públicos federais, exclusivamente para proteção de bens e de pessoas nessa região.

Relatórios paralelos rejeitados

Parlamentares apoiadores de Jair Bolsonaro chegaram a apresentar dois relatórios paralelos tentando incriminar integrantes do governo Lula, como Flávio Dino, pelos atos antidemocráticos. A CPMI, no entanto, rejeitou ambos. Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), os pareceres tentando inocentar culpados e atacar as vítimas não a surpreendem.

“Isso porque o comportamento nesta Comissão [de parlamentares da oposição] foi permanentemente violento, de não investigação, de aplaudir de pé golpistas da linha dura da ditadura e que se mostraram agora partícipes desse processo”, disse.

“Esses votos em separado não conseguiram sequer indiciar um partícipe do 8 de janeiro: os réus confessos, como Mauro Cid, ou os que tentaram invadir a Polícia Federal. Não tem um militar indicado como partícipe dessa construção; os caras que jogaram a bomba no aeroporto não estão indiciados no voto em separado. Cadê esses partícipes golpistas do processo? Cadê o Augusto Heleno? Cadê a indicação e indiciamento de verdadeiros criminosos contra a democracia brasileira?”, questiona.

Indiciamentos

Eliziane Gama apontou evidências de Bolsonaro como autor intelectual e moral dos ataques perpetrados contra as instituições. Ela cita os insistentes ataques às instituições, além da ênfase nas teses que questionavam a segurança das urnas eletrônicas.

A parlamentar elencou ainda a instrumentalização da Polícia Rodoviária Federal para que eleitores da região Nordeste tivessem mais dificuldade de votar no segundo turno das eleições de 2022 e o recebimento, pelo então presidente, de uma minuta de golpe, fato que teria sido presenciado pelo seu ex-ajudante de ordens, Mauro Cid.

Além deles, Eliziane também responsabilizou militares que atuaram na cúpula do governo anterior. Entre eles, os ex-ministros Braga Netto (Casa Civil), Augusto Heleno (Gabinete da Segurança Institucional – GSI), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência) e Paulo Sérgio Nogueira (Defesa). Na visão da senadora, todos eles colaboraram de forma ativa na orquestração do roteiro que antecedeu as invasões.

Os financiadores dos atos golpistas também foram responsabilizados no relatório. A parlamentar cita, no parecer, o Relatório de inteligência da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) apresentando indícios da participação de parte de empresários do agronegócio no grupo informal denominado Movimento Brasil Verde e Amarelo (MBVA). Eles, segundo a relatora, foram responsáveis pelo envio de caminhões para Brasília e pelos bloqueios rodoviários realizados logo após o resultado das eleições de 2022.

G. Dias e Flávio Dino

O documento ainda derruba as mentiras disseminadas por bolsonaristas sobre as atuações do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Gonçalves Dias, e do titular do Ministério da Justiça, Flávio Dino. Com documentos, a relatora comprovou a atuação ilibada de ambos.

Apesar de reconhecer a atuação de servidores do GSI nas omissões que culminaram na invasão ao Palácio do Planalto, Eliziane Gama inocentou G. Dias, alegando que ele estava há apenas sete dias no cargo, enquanto os demais dez denunciados tinham conhecimento prévio de possíveis ataques.

A senadora ainda mostrou documentos comprovando que o ministro da Justiça, Flávio Dino, solicitou apoio da Força Nacional para atuar na Esplanada dos Ministérios entre os dias 8 e 9 de janeiro. No entanto, o pedido, que obrigatoriamente deveria ser aprovado pelo governo do DF, foi ignorado pelo governador Ibaneis Rocha.

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