Meio Ambiente

Debatedores divergem sobre projeto para coibir desmatamento

Especialistas convidados mostraram preocupações com proposta que prevê destinar exclusivamente ao reflorestamento as áreas rurais de floresta nativa que sofrerem queimadas ilegais. Eles apontaram alternativas aos parlamentares
Debatedores divergem sobre projeto para coibir desmatamento

Foto: Agência Senado

Especialistas ouvidos nesta quarta-feira (11) pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) divergiram sobre a eficácia do Projeto de Lei (PL 135/2020) que altera o Código Florestal (Lei 12.651/2012) para destinar exclusivamente ao reflorestamento as áreas rurais de floresta nativa que sofrerem queimadas ilegais.

O senador Jaques Wagner (PT-BA), presidente da CMA, e um dos requerentes da audiência, defendeu a proposta e comparou a iniciativa com a do senador Paulo Rocha (PT-PA) que culminou na legislação de combate ao trabalho análogo à escravidão. A legislação prevê o confisco de propriedades em que esse crime for encontrado e sua destinação à reforma agrária ou a programas de habitação urbanos.

“Fui ministro do Trabalho entre 2003 e 2004 e tínhamos muito problema com trabalho forçado. Várias leis foram feitas para coibir essa prática. Tivemos muito sucesso, inclusive, com a destinação dessas áreas onde se encontrava trabalho em condições subumanas para outras destinações, como a reforma agrária. Esse projeto tem o mesmo condão. Ele pretende fazer com que áreas desmatadas por queimadas ilegais sejam destinadas ao reflorestamento. E acho isso nobre”, destacou o senador Jaques Wagner.

“É uma recomposição de uma área indevidamente violentada. O projeto tenta usar desse instrumento para inibir o que tem nos desgastado muito no cenário internacional, que são as queimadas ilegais, principalmente na Amazônia”, completou.

O líder do PT no Senado, Paulo Rocha, destacou o fato de o estado do Pará vir sofrendo historicamente com grandes devastações em nome do avanço produtivo, seja para pecuária, seja para mineração ou mesmo para exploração de madeireiras.

Foto: Agência Senado

“O incentivo a criação do boi no sul do Pará foi produto da devastação ambiental. A indústria da madeira também foi produto de grandes devastações. Essas duas experiências ao longo do tempo fizeram os próprios empresários perceberam que precisavam de saídas pelo desenvolvimento sustentável. Hoje se tem consciência de que não é preciso derrubar nenhum centímetro de floresta para produzir soja e criar bois. É possível promover o desenvolvimento sem destruir a floresta”, disse.

Para Roberta Del Giudice, secretária-executiva do Observatório do Código Florestal, é papel do Poder Legislativo propor instrumentos de Estado para que se inviabilize o ciclo de desmatamento de utilização de queimadas ilegais para fazer avançar as áreas produtivas.

“A proposta de que essas áreas não sejam destinadas a outros usos que não seja a restauração da área pode ser benéfica nesse processo de implantação de políticas públicas de combate ao desmatamento”, disse.

De acordo com dados do MapBiomas apresentado por Luis Fernando Guedes, diretor de Conhecimento da SOS Mata Atlântica, entre 1985 e 2020 foram queimados 1,6 milhão de quilômetros quadrados de área no Brasil, ou seja, 20% da área do país; 85% das áreas queimadas no Brasil se concentram na Amazônia e no Cerrado; 61% queimaram pelo menos duas vezes no período; 60% ocorre em imóveis rurais e propriedades particulares; e 65% do fogo ocorreu em área nativa e 35% em área de pastagem, agrícola ou urbana.

Divergências

Mesmo defensores da proposta, os convidados explicaram aos parlamentares a necessidade de aprimoramento do texto para não haver brechas que estimulem a queimada de áreas de floresta nativa.

De acordo com Alison Pureza Castilho, secretário-executivo e coordenador do Programa Territórios, Florestas e Comunidades do Instituto Internacional de Educação do Brasil e representante de Observatório de Manejo Florestal Comunitário e Familiar, o projeto aborda de forma generalizada a necessidade de reflorestamento de área desmatada.

Isso, segundo ele, permitiria a recomposição da área degradada com alguma monocultura que não respeite a biodiversidade. “A proposta poderia criar um novo problema e incentivar novas queimadas e desmatamentos na Amazônia. É preciso fortalecer os mecanismos de controle e fiscalização que foram desmontadas nos últimos três anos. Esses serviços poderiam coibir a prática ilegal. O próprio Código Florestal já apresenta mecanismos que visam coibir essa prática”, defendeu.

Roberta Del Giudice sugeriu como aprimoramento a alteração do termo “reflorestamento” para “restauração”. Segundo ela, seria uma forma de tentar recompor a área degradada respeitando a vegetação anterior.

Já o representante da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), Leonardo Minaré Braúna, defendeu a atual legislação presente no Código Florestal e afirmou ser o atual arcabouço legal suficiente para aplicar sanções legais e administrativas aos criminosos que destruam áreas de vegetação nativa.

Segundo ele, o projeto impõe uma espécie de “pena perpétua” aos desmatadores ao determinar o reflorestamento da área.

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