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Empresário admite financiar instituto que intermediou venda com propina

Otávio Fakhoury repete mantras bolsonaristas sobre tratamento precoce e negação da vacina à CPI e afirma que disseminação de notícias falsas sobre a pandemia seriam apenas expressão de suas “opiniões”. Depoente também admitiu financiamento do Instituto Força Brasil, que intermediou a compra de 400 milhões de doses de vacinas entre a Davati e o Ministério da Saúde
Empresário admite financiar instituto que intermediou venda com propina

Foto: Alessandro Dantas

A CPI da Covid teve nesta quinta-feira (30) um exemplar do mais puro suco do negacionismo espalhado pelo bolsonarismo durante a pandemia com o depoimento do empresário Otávio Fakhoury. Vice-presidente do Instituto Força Brasil, Fakhoury passou o depoimento repetindo basicamente todos os mantras ditos por Bolsonaro que desinformaram a população e levaram à morte quase 600 mil pessoas por Covid-19.

Aos senadores, o empresário demonstrou orgulho ao afirmar que nenhum de seus familiares se vacinou e que todos fizeram uso do chamado tratamento precoce, reconhecidamente ineficaz, quando foram contaminados pela doença. Assim como Luciano Hang, o depoente do dia anterior, Fakhoury utilizou o mesmo argumento negacionista e disse que já possui um “índice elevado de anticorpos naturais” e que, por isso, não precisaria se vacinar. Ele também mentiu ao afirmar que todas as vacinas em uso no Brasil estão em fase experimental, argumento já utilizado por Bolsonaro para desestimular a vacinação no País.

O empresário, que também é investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito das fake News, entrou na mira da CPI em razão de suspeitas de que ele seja responsável por financiar a disseminação de notícias falsas sobre a pandemia. Os senadores questionaram qual seria sua participação num vídeo contrário ao uso de máscaras. Na imagem, as pessoas são incentivadas a retirar as máscaras do rosto. De acordo com o empresário, se tratava apenas da exposição da “opinião” dele.

“Estamos diante de uma pessoa que patrocinou, difundiu e defendeu que a população fosse exposta ao vírus, ao risco e ao grau de letalidade [do vírus]. E pessoas foram conduzidas ao risco da morte e à morte. Em saúde pública, a informação veiculada se transforma em comportamento”, disse o senador Rogério Carvalho (PT-SE).

Foto: Alessandro Dantas

“Quando o presidente da República diz que é para aglomerar, diz que é uma gripezinha, se coloca contra o isolamento social, se coloca contra as vacinas e pessoas financiam esse tipo de prática, está estimulando um comportamento de risco na sociedade e colocando a vida de milhões de brasileiros em risco”, completou.

O senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que Otávio Fakhoury admitiu durante o depoimento o cometimento de uma série de crimes durante a pandemia. Dentre eles, expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente (art. 132 – Código Penal); infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa (art. 268 – Código Penal); causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos (art. 267). Além disso, o depoente também pode ser enquadrado pelo Código de Defesa do Consumidor nos artigos 67, 68 e 69 por propaganda enganosa ao disseminar medicações ineficazes contra a Covid-19.

Foto: Alessandro Dantas

“Quando o senhor financia sites, canais e manifestos que propagam notícias falsas sobre a pandemia como o uso do tratamento precoce, o senhor se torna participante de diversos crimes: perigo para a vida ou saúde de outrem, crimes de epidemia, crime de publicidade enganosa. Terá de responder a tudo isso”, destacou o senador.

Financiamento do Instituto Força Brasil
O negacionista Otávio Fakhoury admitiu à CPI que financiou o Instituto Força Brasil, do qual é vice-presidente, até junho deste ano. A organização é responsável por uma serie de postagens contrárias as vacinas, ao distanciamento social e ao uso de máscaras.

No dia do depoimento do presidente do Instituto à CPI, coronel Helcio Bruno, o site chegou a ser retirado do ar. Hélcio Bruno foi o responsável por aproximar os representantes da empresa Davati e integrantes do governo Bolsonaro para negociar a compra de um suposto lote de 400 milhões de doses do imunizante AstraZeneca. Na negociação, o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, teria pedido propina de US$ 1 dólar por dose para dar sequência às negociações.

Apesar de financiar e ser vice-presidente do Instituto, Fakhoury disse aos senadores não ter conhecimento sobre as ações da organização e de ter ficado sabendo das ações de Helcio Bruno apenas após o ocorrido. O Instituto Força Brasil foi criado em junho do ano passado e defende, entre outras pautas, a liberação das armas, o homeschooling e o voto impresso.

O senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da Minoria, questionou o fato de um instituto com lideranças negacionistas, de uma hora para outra, criar o interesse na aquisição de vacinas para o Brasil.

Foto: Alessandro Dantas

“É um instituto que busca o bem do Brasil na forma do que os associados acreditam que seria bom. Perfeitamente legítimo. O que eu não consigo entender é como se dá essa virada para tratar de vacinas. Por que o instituto se mete nas questões das vacinas? Nós vemos o reverendo Hamilton, Hélcio Bruno, Davati. O senhor mesmo não acreditava na vacina, não queria trazer vacina para o Brasil. É estranho”, apontou o senador.

Confissão de caixa 2 de campanha
O relacionamento de Fakhoury com Bolsonaro e a suposta prática de ilícitos é mais antiga do que se imaginava. Ao ser questionado se participou da campanha presidencial de Bolsonaro em 2018, Fakhoury acabou admitindo ter financiado a impressão de materiais que não estavam vinculados oficialmente à campanha. Logo, não houve prestação de contas dos recursos empregados, o   que se configura caixa 2. Os senadores chegaram a alertá-lo para que não se autoincriminasse.

De acordo com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, a Polícia Federal apontou que duas notas fiscais de gráficas do Nordeste foram emitidas com a impressão de 560 mil itens de propaganda eleitoral sem a devida declaração à Justiça Eleitoral.

Ofensa aos senadores
No início da sessão, o senador Fabiano Contarato (Rede-AP) pediu uma questão de ordem para apresentar um ataque homofóbico feito pelo depoente contra ele e sua família nas redes sociais.

“Eu aprendi que a orientação sexual não define caráter, a cor da pele não define o caráter, poder aquisitivo não define caráter”, disse o senador.

Foto: Alessandro Dantas

Após a fala do senador Fabiano Contarato, surgiram outras mensagens de Fakhoury nas redes sociais com ataques aos senadores Rogério Carvalho, Humberto Costa, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Omar Aziz (PSD-AM). A CPI solicitou que a Polícia Legislativa investigue Fakhoury pela prática do crime de homofobia e que o Ministério Público Federal seja informado sobre a ocorrência dos casos.

Ao final da manifestação de Contarato, o depoente pediu desculpas pelo comentário “infeliz” e afirmou que fez em tom de “brincadeira”.

Requerimento aprovado
A CPI aprovou requerimento de convocação do diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar, Paulo Roberto Vanderlei Rebello. A intenção da CPI é investigar eventuais omissões do órgão no escândalo da Prevent Senior.

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