ENTREGUISMO

Especialistas criticam MP de privatização do saneamento básico

Paulo Paim: “Todos sabemos do lobby que existe hoje no País para que [a iniciativa privada] se aposse do potencial de águas que o Brasil tem”
Especialistas criticam MP de privatização do saneamento básico

Foto: Agência Senado

“Essa Medida Provisória vai ampliar a desigualdade social no País”. Essa é a avaliação de especialistas que discutiram, nesta quarta-feira (5), a MP do Saneamento em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH). Para eles, a MP 844/2018 que abre a possibilidade de privatização dos serviços de saneamento básico no Brasil fará com que o setor deixe de ser uma importante política de inclusão social e indutor de outras políticas públicas responsáveis pelo desenvolvimento social, cultural e econômico.

“A população mais pobre será afastada dos serviços de saneamento e o município passa a não exercer mais seu papel de responsabilidade na gestão dos serviços de saneamento. Assim, a MP vai privilegiar apenas o setor privado. Os municípios pequenos e pobres continuarão na mão do Estado e não vamos resolver o problema. Vamos apenas dividir a situação de saneamento em dois países. Essa MP transforma o saneamento básico num grande balcão de negócios”, criticou Aparecido Hojaij, presidente nacional da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (ASSEMAE).

Ele também criticou o fato de nenhum representante do governo ter participado da audiência pública. O senador Paulo Paim (PT-RS), vice-presidente da CDH explicou que representantes do governo foram convidados, mas não compareceram à audiência. Paim ainda se comprometeu a apresentar representantes da sociedade civil para que possam participar dos debates da MP do Saneamento antes das votações previstas no Congresso.

“Quem perde são eles [governistas]. Isso mostra que [o governo] não tem argumentos para defender essa Medida Provisória. Eles deveriam estar aqui. Esse é um tema de extrema relevância. Todos sabemos do lobby que existe hoje no País para que [a iniciativa privada] se aposse do potencial de águas que o Brasil tem”, destacou o senador.

Renata Valim, representante da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), também criticou a ausência de debate por parte do governo com a sociedade civil interessada no tema.

“Ao retirar a expressão ‘universalização’ do acesso a água, qual era o intuito do governo? Questionamos isso. Por que não fizeram o debate com setores interessados da sociedade? Talvez o interesse principal seja o da iniciativa privada, já que o Brasil detém 13% da água doce mundial”, alfinetou.

Para Sérgio Antonio Gonçalves, diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), a MP editada por Michel Temer propõe a repetição de experiências malsucedidas pelo mundo. De acordo com estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado em 2016, nos últimos 15 anos houve ao menos 180 casos de reestatização do fornecimento de água e esgoto em 35 países.

“Quando se trabalha com uma visão mercadológica para o saneamento básico e a água, causa-se uma perda humana imediata pela morbidade de crianças de 0 a 5 anos que são as mais afetadas. E mesmo aquelas que não morrem, ficam com sequelas de desenvolvimento. As doenças decorrentes da ausência do saneamento estão voltando, estamos retrocedendo na saúde pública”, lamentou. “A água potável e o saneamento básico são fatores que devem alicerçar condições minimamente dignas de cidadania”, emendou o representante da ABES.

Ainda segundo a ONU, dados de 2017 apontam que em todo o mundo, cerca de três em cada dez pessoas — em um total de 2,1 bilhões — não têm acesso a água potável em casa, e seis em cada dez — ou 4,5 bilhões — carecem de saneamento seguro.

Ação judicial
O PT ajuizou, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), na última terça-feira (4/9), ação de inconstitucionalidade (ADI 6006) contra a Medida Provisória 844.

Na avaliação do partido, ao atualizar o marco legal do saneamento básico, o texto enviado pelo Executivo ao Legislativo teria privilegiado o setor privado em detrimento do acesso aos serviços públicos, com esvaziamento da autonomia e competências constitucionais dos municípios.

A MP tem vigência até o próximo dia 20, mas pode ser prorrogada por mais 60 dias.

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