Comunidade científica e senadores do PT criticaram a possibilidade levantada pelo governo Bolsonaro de fusão da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e alertaram para o risco que essa proposta trará para o futuro do financiamento de projetos e pesquisas no País.
A ideia criada pela equipe do ministro Abraham Weintraub é transformar as duas agências numa fundação a ser gerida pelo Ministério da Educação (MEC).
Criadas em 1951, as duas instituições têm missões distintas. A Capes, ligada ao MEC, tem como missão inicial a qualificação de profissionais de nível superior, tornando-se fundamental na criação e expansão do sistema de pós-graduação no País. Já o CNPq, vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), é responsável por fomentar projetos de pesquisa científica, de modo a contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do País.
“A ‘ideia’ do governo de unir os órgãos CNPq e Capes é uma tragédia para a pesquisa científica no Brasil. A proposta visa apenas cortar gastos e nos deixa reféns de países que produzem conhecimento. É preciso lutar contra o novo golpe à soberania nacional”, alertou o senador Paulo Rocha (PT-PA).
Além de recomendar a fusão das duas agências, o ministério da Economia sugeriu a vinculação da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), hoje ligada ao MCTIC, ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“O governo está com um movimento para redirecionar todo o sistema de ciência e tecnologia, reduzi-lo drasticamente, e mudar o foco só para pesquisa aplicada, que gere recursos e lucros. É um risco para a soberania nacional, porque sem produzir conhecimento básico o País fica refém dos países que produzem esse conhecimento”, afirmou Roberto Muniz, presidente do Sindicato Nacional de Gestores em Ciência e Tecnologia e presidente da Associação de servidores do CNPq.
O ministro do MCTIC, Marcos Pontes, também se mostrou contrário à proposta de fusão das agências. Para ele, a junção das estruturas “seria prejudicial ao desenvolvimento científico do País”.
Cortes orçamentários
Por causa de bloqueio de recursos promovidos pelo governo, a Capes cortou cerca de 7,5 mil bolsas de pesquisa, o equivalente a 8% do que havia no início do ano. Mesmo após descontingenciamento, o órgão ainda enfrenta um congelamento de R$ 549 milhões no orçamento do ano.
O órgão ainda perde metade do orçamento em 2020, segundo proposta encaminhada ao Congresso pelo governo: sai de R$ 4,25 bilhões, segundo o valor autorizado para 2019, para R$ 2,20 bilhões no ano que vem. O MEC afirma que já garantiu mais R$ 600 milhões para o que vem e a Capes tem tentando convencer deputados a construir uma emenda parlamentar de mais R$ 300 milhões.
Com relação ao CNPq, o orçamento de 2019 já foi aprovado com a previsão de recursos insuficientes. O orçamento garantia o pagamento das 84 mil bolsas somente até agosto. Para pagar bolsistas neste mês, o CNPq remanejou recursos da área de fomento à pesquisa, que financia empreendimentos como o Sirius.
“Seria uma medida equivocada sob todos aspectos já que as duas instituições, criadas e desenvolvidas ao longo de mais de seis décadas, têm missões bastante claras e complementares”, diz carta, assinada por instituições como a Academia Brasileira de Ciências, Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e Andifes (que reúne reitores das universidades federais).
Confira a íntegra da carta das entidades contrárias a fusão
A “ideia” do governo de unir os órgãos CNPq e Capes é uma tragédia para a pesquisa científica no Brasil. A proposta visa apenas cortar gastos e nos deixa reféns de países que produzem conhecimento. É preciso lutar contra o novo golpe à soberania nacional.https://t.co/FYY7rdYuIA
— Paulo Rocha (@senadorpaulor) October 16, 2019