“A matéria não tem embasamento |
Curiosamente, o Tribunal de Contas da União (TCU) abriu uma sindicância para analisar a aquisição da refinaria Pasadena com base nas informações contidas na matéria denunciativa da revista Veja. Em sessão plenária do tribunal, o ministro José Jorge, ex-senador do Pernambuco pelo extinto PFL, afirmou que a operação tinha indícios de danos aos cofres públicos, embora o TCU tenha passado um mês dentro da Petrobras analisando os documentos sem se manifestar até agora.
O Ministério Público do Rio de Janeiro também foi motivado a investigar o caso com base na matéria da revista, e o restante da imprensa continua com essa pauta debaixo dos braços. O expediente faz supor que lança-se uma denúncia na revista e, articuladamente, aciona-se os órgãos para fazer uma investigação de fato. Apesar disso, após a longa audiência no Senado, presidida pelo senador Blairo Maggi (PR-MS), o ex-presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, enfrentou uma saraivada de perguntas e pegadinhas e não deixou nada para trás.
Repórter – Não entendi como o senhor chegou à segunda parcela de US$ 290 milhões sendo que era mais de US$ 820 milhões, segundo a justiça americana definiu.
Gabrielli – A primeira parcela dos 50% foi adquirida por US$ 190 milhões, a US$ 3.800,00 por barril de capacidade de processamento. A segunda parcela, decidida pelo tribunal arbitral e pelo tribunal de Justiça dos Estados Unidos, foi estipulada em US$ 296 milhões. Essa segunda parcela significa um valor total de aquisição da refinaria de US$ 486 milhões pela capacidade de processamento, no momento em que a média do mercado era de US$ 9.478,00 por barril processado. Portanto, nós adquirimos a refinaria por menos da metade da média do mercado americano de 2006. Além disso, a Petrobras adquiriu estoques de petróleo e de derivados que são processados e vendidos.
Por isso não podem ser considerados ativos de transformação porque são estoques. O valor desses estoques foi de US$ 170 milhões na primeira vez, significando US$ 360 milhões quando da operação de compra de 50% mais US$ 170 milhões da segunda vez, em 2008, que são estoques que mudaram. A Petrobras também pagou US$ 173 milhões de garantias comerciais dadas pelos bancos para as operações no mercado de derivados. Essas são as operações realizadas. A refinaria foi comprada por US$ 486 milhões. Estou falando da decisão da decisão judicial de 2010. Sai em fevereiro de 2012 e o acordo foi fechado em junho de 2012.
Repórter – Não seria importante o senhor ter acesso aos dados atuais já que foi presidente há tanto tempo?
Gabrielli – Fui presidente até fevereiro de 2012. O acordo é de junho de 2012. Vim explicar meu período na presidência da empresa. E expliquei.
Repórter – Mas não explica o valor que de fato vai pagar né?
Gabrielli – Há um acordo feito que não é a decisão judicial.
Repórter – Como o senhor atribui uma única matéria, no caso da revista Veja, ser usada como base para investigação por órgãos como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Procuradoria Geral da República (PGR), como se fosse um escândalo?
Gabrielli – A matéria não tem embasamento técnico e nem jurídico. As investigações estão começando. O que existe é uma denúncia publicada na revista Veja. Essa é a origem de tudo isso. Agora, sobre a exploração política disso eu não posso me manifestar. A forma de manifestação da imprensa sobre esse assunto é um problema para os editores e para os leitores.
Repórter – O senhor afirma que foi um bom negócio…
Gabrielli – Eu afirmo que foi um negócio normal e típico da época em que foi realizado, entre produtor de petróleo pesado e comercializador de petróleo, adquirindo uma refinaria que poderia ser melhorada para processar petróleo pesado e que o mundo mudou em 2008. Essa mudança em 2008 foi importante para modificar as margens de ganho das refinarias e essas alterações ocorrem com fatos importantes dentro do Brasil, que foi a descoberta do pré-sal que altera as relações da produção de petróleo pesado e petróleo leve no País e, portanto, mudam as estratégias da Petrobras em 2007, depois da aquisição da refinaria em 2005. Na realidade do mundo pré 2008 foi um negócio adequado à realidade daquele mercado. Hoje ela tem uma situação diferente. Os Estados Unidos tem uma redução de consumo, o Brasil tem um crescimento do mercado interno muito grande, que exige investimento em mais refinarias no País do que no exterior. As condições entre preços de petróleo pesado e leve se alteraram principalmente com o desenvolvimento shale oil (petróleo e gás extraído das rochas) nos Estados Unidos. Isso modificou as relações de preços naquele país, e esse negócio tem que refletir a realidade do mercado hoje.
Repórter – O senhor concorda com a avaliação da presidente Graça Foster que se soubesse o que ia acontecer também não teria comprado?
Gabrielli – No mercado de hoje, a refinaria é lucrativa por circunstâncias específicas do Texas onde há possibilidade de comprar petróleo leve e barato, e pela logística em receber petróleo e enviar derivados. Concordo com o que diz a presidenta Graça Foster que se as informações fossem as de hoje eu estaria fazendo um comentário do jogo no domingo na segunda-feira. Mas sou um técnico tomando a decisão no sábado, e não na segunda-feira depois do jogo.
Repórter – A conta petróleo aponta uma parada de produção na plataforma da Bacia de Campos. De fato é um problema que remete à sua gestão?
Gabrielli – Não acho que isso remete à minha gestão. O que há é o seguinte: nós temos a Bacia de Campos que está produzindo há 60 anos. Nós temos um processo de produção de muitos anos e a atividade de petróleo declina ao longo do tempo. Nós tivemos ao longo dos últimos dez anos uma coisa extraordinária e positiva para as empresas de petróleo, que é descobrir grandes reservatórios. Em 2006 nós tínhamos duas sondas em atividade de produção em águas profundas e tínhamos um potencial enorme de descobertas no pré-sal, porque expandimos a atividade exploratória para a Bacia de Santos e Bacia do Espírito Santo. Encontramos enormes potenciais com duas sondas. Evidentemente que para desenvolver as atividades de exploração e produção nós precisávamos de mais sondas. Iniciamos um processo de aquisição em 2007, 2008 e 2009 e esse processo aconteceu num momento em que o mercado internacional de sondas estava aquecido. Nós não conseguimos obter essas sondas no mercado internacional porque elas não estavam disponíveis. Nós ampliamos estratégia de crescer a capacidade de produção de sondas no Brasil e hoje temos condição de trazer até 2020 quase 70 sondas, em produção brasileira e internacional.
Repórter – O que isso significa?
Gabrielli – Isso significa que nossa condição de equipamento para operar na descoberta de novas áreas e para operar na Bacia de Santos foi criada ao longo desses dez anos, é uma coisa que não se faz de um dia para o outro. No entanto, objetivamente, a produção na Bacia de Campos, com declínio acelerado e com a chegada de novas sondas, a produção vai voltar a crescer, onde temos programas de atuação em campos com alto grau de exportação. Isso é um processo que não é de um mês para o outro que se modifica. Todos os projetos que estão entrando em operação hoje foram decididos cinco anos atrás. Portanto, o que está aumentando a produção foi decidido há cinco anos, só que o processo dura tempo. O grande problema da balança comercial está no limite da capacidade de refino. Nós estamos trabalhando com 96% da capacidade de refino. Precisamos fazer novas refinarias. Estamos fazendo a Abreu e Lima (PE), temos que fazer a do Ceará, a do Maranhão, acelerar o Comperj no Rio de Janeiro, a Clara Camarão (RN). A área de refino está sendo implantada. Não vejo porque tem crítica ao passado.
Repórter – É que tem uma queda de produção de petróleo, de exportação de petróleo.
Gabrielli – A exportação de petróleo está reduzindo não porque caiu a produção, mas porque o consumo de derivados no mercado interno aumentou. Aumentamos os investimentos em conversão de nossas refinarias, fizemos com que as nossas refinarias passassem a refinar o petróleo brasileiro.
Marcello Antunes
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