A Federação Ibero-Americana de Ombudsman (FIO) – que reúne Defensorias del Pueblo, Provedorias de Justiça, Procuradorias e Comissões de Direitos Humanos de mais de 20 países da região – lançou no último dia 28, durante encontro no Rio de Janeiro, manifesto contra a violência estatal e o ataque à democracia em países da América Latina.
No documento, o colegiado expressa profunda preocupação com a atual situação de violações de direitos na região e menciona Brasil e Bolívia como países em cujos Parlamentos tramitam proposições legislativas que representam grave ameaça à democracia.
“Exemplos claros são os regulamentos que procuram isentar de responsabilidade penal as forças militares e de segurança que atuam na repressão a manifestações com uso desproporcional de força, resultando em mortos e feridos. São os casos de projetos de lei da Bolívia e do Brasil, medidas que representariam um enorme retrocesso na construção de uma democracia plena”, destaca o texto.
Nessa perspectiva, o colegiado exorta os Parlamentos desses países a não aprovarem leis que afetem ou ponham em risco a vigência dos direitos humanos – ainda que sob a pretensa justificativa de segurança pública ou salvaguarda da ordem pública.
“Esses tipos de normas não estão em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos e, na prática, resultariam em uma grave mensagem sobre impunidade das forças armadas e das forças de segurança pública”, alerta a FIO.
A manifestação da Federação Ibero-Americana de Ombudsman feita nesta quinta-feira, no Brasil, se soma a pronunciamentos recentemente realizados pelo colegiado em relação ao contexto de violações de direitos humanos em outros países da região.
No último dia 19, a FIO lançou nota pública na qual manifestou profunda preocupação com a atual situação que atravessa o Estado Plurianual da Bolívia, destacando que o país está envolto “em uma grande comoção social e institucional que afeta a convivência democrática e a coexistência pacífica do povo”.
Em outubro, a Federação já havia se pronunciado em uma nota pública na qual instou autoridades públicas do Chile a reconsiderar o uso de armas antidistúrbios em operações relacionadas a manifestações públicas. O comunicado alerta que a atuação na área deve ter como diretriz “o princípio da proporcionalidade no uso da força” e pede que sejam investigadas e adequadamente responsabilizadas práticas de uso abusivo de força por parte de agentes públicos encarregados de cumprir a lei.
Os riscos de proposições legislativas que possam favorecer a violência estatal já haviam sido apontados pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão que integra o Ministério Público Federal, em uma nota técnica encaminhada na terça-feira (26) ao Congresso Nacional para tratar sobre o Projeto de Lei 6.125/2019.
Para a PFDC e a Câmara do MPF que trata sobre Controle da Atividade Policial e Sistema Prisional, o referido PL busca instituir um regime de impunidade para crimes praticados por militares ou policiais em atividades de Garantia da Lei da Ordem (GLO). Segundo os órgãos do Ministério Público Federal, a medida é flagrantemente inconstitucional e sem paralelo – mesmo se comparada aos atos institucionais da ditadura militar.
Instituições sob ameaça
No pronunciamento desta quinta-feira, a Federação de Ombudsman – da qual a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão é membro – também chama atenção aos ataques à independência e ao trabalho de defensores e instituições nacionais de direitos humanos.
“Instituições ombudsman encarregadas de defender direitos fundamentais estão sendo impedidas ou tendo sua atuação limitada por parte de governos”.
No documento, os membros da FIO apontam preocupação com a “deriva política” que põe em risco as conquistas democráticas realizadas pelos países latino-americanos nas últimas décadas e cita as recentes convulsões sociais ocorridas em países como Haiti, Equador, Chile, Bolívia e Colômbia como reflexo da crítica situação que se vive.
“Neste momento histórico, sérias ameaças aos direitos humanos e à democracia convergiram na região, o que demanda um papel ativo dos Ombudsman na defesa e proteção dos direitos humanos”, destaca o texto.