A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar o futebol brasileiro realizou, nesta quinta-feira (27), a terceira audiência pública com a participação de jornalistas para reunir informações que poderão orientar os senadores na sequência das investigações.
Na reunião de hoje foram ouvidos os jornalistas Amaury Ribeiro Jr., Luiz Carlos Azenha e Leandro Cipoloni, autores do livro “O Lado Sujo do Futebol”, lançado no ano de 2014. Azenha explicou que o livro foi construído a partir de documentos públicos obtidos em cartórios, principalmente, do Rio de Janeiro e de São Paulo, além de documentos do Ministério Público no Brasil e na Suíça e entrevistas com personagens envolvidos nos bastidores do futebol.
Segundo o jornalista, ao longo das investigações realizadas para o livro, chamaram-lhe a atenção a falta de transparência da Confederação Brasileira do Futebol (CBF).
Nas investigações anteriores feitas pelas CPI que aconteceram no início dos anos 2000, Azenha destacou que, apesar de os trabalhos dos parlamentares estarem no caminho certo na CPI da Nike, realizada pela Câmara, e CPI da CBF, no Senado, as consequências jurídicas não acompanharam as investigações e permitiram que Ricardo Teixeira ficasse por mais de dez anos, após as investigações, no comando da Confederação. Teixeira deixou o comando da CBF pouco antes da realização da Copa do Mundo de 2014.
Intermediários
Em 2001, Ricardo Teixeira, então presidente da CBF respondeu a uma pergunta do então deputado Dr. Rosinha (PT-PR), e afirmou não ser o dono da empresa Sanud. Segundo Teixeira, em depoimento, a empresa seria apenas acionista de outra empresa que, essa sim, seria de Teixeira.
“Na nossa investigação tivemos acesso a documento da Promotoria da Suíça que investigava Teixeira e João Havelange. E, esse documento era uma lista de pagamento de propina em que estava explícita a participação da Sanud como intermediária de recebimento de propinas. E o promotor suíço deixa claro que a Sanud era integralmente gerida por Teixeira”, relatou Azenha.
Também em 2001, o então deputado Eduardo Campos questionou os contratos da CBF com a Traffic, empresa de J. Hawilla, réu confesso no escândalo conhecido como Fifagate e que levou à prisão de José Maria Marin. Na época, em reunião da CPI, Teixeira foi questionado se, não seria mais transparente a Confederação iniciar um processo de licitações para fechamento de contratos de direitos de TV.
“Na nossa opinião, esse processo não passou para o sistema de licitações porque, a Traffic era uma intermediária e o dono dela é delator como pagador de propinas nas investigações do FBI. A ISL que foi a origem da propina, que segundo a Promotoria suíça foi paga a Teixeira e Havelange, também era intermediária”, apontou. “A pergunta óbvia é: qual o papel desses intermediários nesses contratos? Será que esses intermediários são colocados apenas para pagamento de propinas? Qual o sentido de uma empresa do Oriente Médio vender os jogos da seleção brasileira? ”, questionou.
Caixa preta
O jornalista Leandro Cipoloni ressaltou que a ausência de transparências nas negociações da CBF é o ponto que mais lhe chamou a atenção durante a investigação que resultou no livro. “Muitos me perguntaram o que mais chamou a atenção durante as investigações e a publicação do livro. E eu digo que foi a leniência das autoridades. Teixeira foi investigado inúmeras vezes e sabemos que nada aconteceu”, disse.
Segundo Cipoloni, a atual falta de transparência na instituição existe por conta de uma manobra “genial” de Teixeira idealizada um ano após assumir o comando da CBF, em 1990. Teixeira, na oportunidade, retirou todo dinheiro público que era investido na Confederação – na época, recursos da Loteria Esportiva. “A partir daquele momento, a CBF se tornou uma caixa-preta. As autoridades têm uma dificuldade muito grande de investigar a entidade e isso aconteceu com Teixeira, com Marin e agora com Del Nero”, apontou
O jornalista Amaury Ribeiro Jr. se comprometeu a apresentar documentos ao corpo técnico da CPI do Futebol para que os senadores tenham condições de investigar a lavagem de dinheiro que ocorreu em solo brasileiro durante a realização da Copa do Mundo FIFA 2014. “Não vim para esta CPI trazer documentos antigos. Estou aqui para apresentar fatos novos”, salientou.
Donizeti: “Nós temos de encontrar uma forma de o povo brasileiro ter condições de poder interferir nos rumos do futebol, inclusive, como ele deve ser dirigido”O senador Donizeti Nogueira (PT-TO) defendeu que a CPI procure uma saída para que, efetivamente, o comando do futebol brasileiro, considerado patrimônio do povo, seja gerido por todos.
“Nós sempre ouvimos que o futebol brasileiro é um patrimônio do povo brasileiro. Se é um patrimônio do povo brasileiro, ele deve ser objeto de concessão disse. “Nós temos de encontrar uma forma de o povo brasileiro ter condições de poder interferir nos rumos do futebol, inclusive, como ele deve ser dirigido”, disse
O senador ainda avaliou que a Justiça precisa ter um peso e uma medida acerca das investigações que estão acontecendo. Para ele, a CPI do Carf, originada a partir da operação Zelotes da Polícia Federal, em andamento no Senado tem sido prejudicada pela quantidade de habeas corpus concedidos aos acusados
Donizeti explicou aos colegas que aquela CPI tem encontrado uma dificuldade enorme em obter informações, já que praticamente todos os inquiridos chegam ao colegiado munidos de um habeas corpus, que, na prática, desobriga o convocado a depor. “No caso da operação Lava Jato, os camaradas são presos, se não falar não sai. Temos uma espécie de delação torturada. É preciso que os juízes analisem bem o fornecimento desse direito]”, reclamou. “Nós temos sido impedidos permanentemente de investigar as questões na CPI do Carf e, certamente, essa mesma situação ocorrerá na CPI da CBF”, emendou.
Movimentação de Del Nero
O presidente da CBF, Marco Polo Del Nero formalizou, na última quarta-feira, no STF, solicitação para que o seu sigilo bancário não seja quebrado pela CPI do Futebol.
Na reunião desta quinta, o presidente da CPI, senador Romário (PSB-RJ) informou que deverá apresentar uma lista de motivos que justifiquem a ação.
Próxima reunião
A próxima reunião da CPI do Futebol será realizada no dia 1º de setembro às 10h15.
Rafael Noronha
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