O retorno do presidente Lula à Presidência da República trouxe, também, a volta de uma política internacional com base em nossas tradições de uma atuação externa universalista, ecumênica e independente, sobretudo em sintonia com as expectativas e reais necessidades da sociedade brasileira. A afirmação foi feita pelo ministro Mauro Vieira nesta quinta-feira (10), em audiência da Comissão de Relações Exteriores (CRE).
“Estamos trabalhando de forma empenhada, com sentido de urgência, para reconstruir nossas parcerias, ampliar parcerias com o mundo em desenvolvimento, fortalecer o multilateralismo, colocando o Brasil na vanguarda do tratamento das principais questões da agenda internacional”, destacou o ministro aos senadores.
O chanceler lembrou que, em seu primeiro pronunciamento após o resultado das eleições, o presidente Lula destacou a volta do Brasil. E isso, para ele, não se trata de mera figura de retórica. Ao longo dos pouco mais de quatro meses de gestão, Lula esteve com chefes de Estado e de governo de 22 países.
Além disso, o próprio Mauro Vieira teve encontros com aproximadamente 85 chanceleres, chefes de Estado e governo, dirigentes de organismos internacionais, autoridades ministeriais e estrangeiros. Isso não inclui as visitas em que acompanhou o presidente.
“O que se verifica em todos esses contatos é o interesse intenso em discutir as mais diversas agendas e, por si só, demonstra que o Brasil está sendo procurado por um grande número de parceiros internacionais”, ressaltou.
Outro foco da atuação do Brasil nesta área é a retomada do diálogo de alto nível com os países vizinhos. Na primeira semana de janeiro, o Brasil anunciou a reincorporação plena e imediata do Brasil à Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) após três anos de afastamento.
“Retornamos a este que é o único mecanismo de diálogo e cooperação que inclui o conjunto dos países da América Latina e do Caribe”, disse.
O Brasil também tomou medidas para o regresso ao Tratado Constitutivo da União das Nações Sul-Americanas. Nesse sentido, o presidente Lula convocou para o próximo dia 30 de maio reunião de presidentes de países da América do Sul, em Brasília.
“Não nos interessa uma região em que prevaleçam conflitos e isolamentos. Precisamos encontrar soluções negociadas para os desafios que compartilhamos”, disse. “Creio que estamos todos de acordo que interessa ao Brasil trabalhar por um entorno regional estável e próspero”, completou.
Na atual gestão, o país também restabeleceu relações plenas com a Venezuela com a reabertura da embaixada em Caracas. Essa medida permitirá o relançamento da agenda bilateral e a assistência consular aos cerca de 20 mil brasileiros que permanecem residindo naquele país.
Da mesma forma, o Brasil está reativando, com Lula, as relações com Cuba. O Brasil manteve praticamente suspensas as relações com o país caribenho desde 2016.
“Estamos restabelecendo o nível da representação da embaixada em Havana e vamos trabalhar, de forma pragmática, com espírito construtivo, para identificar oportunidades em matérias de comércio e investimento, cooperação técnica, a começar pelo setor de biotecnologia”, explicou.
Recomposição de laços
Os primeiros meses do governo Lula, para além dos parceiros regionais, também foram dedicados à retomada de agendas com importantes parceiros tradicionais. Mauro Vieira destacou o encontro do presidente com representantes dos Estados Unidos, Alemanha, França, Portugal, Espanha e União Europeia – com os quais, segundo ele, o país mantém “relações maduras, importantes, densas, baseadas em interesses e valores comuns”.
“A visita do presidente Lula a Washington, ainda no primeiro mês de governo, e o encontro mantido com o presidente [Joe] Biden sinalizaram o compromisso das duas maiores democracias do continente de voltarem a trabalhar conjuntamente em uma ampla gama de questões, como combate ao extremismo antidemocrático e à violência política, o enfrentamento à mudança de clima, a luta contra a discriminação racial ou ainda a reforma da governança internacional”, destacou.
Brasil como mediador
Com relação ao conflito em curso na Ucrânia, o chanceler disse aos senadores que o Brasil tem buscado manter uma posição equilibrada e construtiva. Ele ressaltou que o país condena a violação da integridade territorial ucraniana e, ao mesmo tempo, não vê como positiva a tentativa de isolamento da Rússia em fóruns internacionais, já que elas “diminuem o espaço de diálogo”.
“O Brasil tem credenciais e patrimônio diplomático suficientes para ajudar a buscar soluções para essa crise, que diz respeito a toda a comunidade internacional. Não estamos interessados em tomar lados, mas em preservar canais de diálogo com todos, única maneira de contribuir efetivamente para a construção de espaços de negociação que conduzam à paz efetiva e sustentável”, disse.
China e Brics
Antes envolvida numa série de discursos preconceituosos e tratada com desrespeito, a China voltou, com o presidente Lula, a ser tratada com o respeito que o principal parceiro comercial do Brasil merece.
O país asiático é uma das principais fontes de investimentos externos diretos em nosso país, com estoque estimado em mais de US$ 70 bilhões. O Brasil, por sua vez, é o principal parceiro comercial da China na América Latina e, desde 2017, o maior fornecedor de produtos agrícolas ao país asiático.
“Os encontros, no mais alto nível em Pequim, permitiram elevar as relações com este importante parceiro estratégico, restabelecendo o diálogo político e atualizando o tratamento de temas que deixaram de ser tratados na pauta bilateral, como o combate à mudança climática e o enfrentamento da fome e da pobreza”, explicou.
Além disso, o chanceler afirmou que a liderança da ex-presidenta Dilma Rousseff, no comando do Novo Banco de Desenvolvimento, o braço financeiro dos Brics, além de ser motivo de orgulho, é uma oportunidade de o país orientar a agenda de concessão de créditos da instituição, que tem amplas capacidades de financiamento de projetos estruturantes em desenvolvimento.
“Retomamos nosso pleno engajamento com o Brics, mecanismo indispensável para a construção de um mundo verdadeiramente multipolar”, disse.
Protagonismo no clima
O ministro das Relações Exteriores disse aos senadores que o ministério, em estreita coordenação com as demais áreas do governo Lula, em especial o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, está plenamente comprometido em colocar as questões da sustentabilidade e do clima no centro da ação diplomática, de maneira a reposicionar o Brasil na vanguarda da transição ecológica e energia global.
A prioridade conferida aos esforços globais para conter a mudança do clima, explicou, reflete-se também na decisão do Brasil de apresentar a candidatura da cientista Thelma Krug à presidência do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima.
“Caso eleita, será a primeira mulher e a primeira representante da América Latina a presidir o IPCC”, destacou o ministro, lembrando que o IPCC é o órgão das Nações Unidas responsável pela avaliação da ciência relacionada à mudança climática.
“[O IPCC] tem papel fundamental no contexto da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e do Acordo de Paris”, explicou.
O chanceler lembrou, ainda, o desbloqueio do Fundo Amazônia, que se encontrava paralisado desde 2019, e conta com o apoio de parceiros como Noruega, Alemanha e, mais recentemente, Estados Unidos e Reino Unido.
Outra medida anunciada por Vieira é a revitalização da organização do Tratado de Cooperação Amazônica. Para isso, o presidente Lula convocou a Cúpula da Amazônia, 4ª Reunião de Presidentes dos Estados Partes do Tratado de Cooperação Amazônica, que será realizada no mês de agosto, em Belém (PA).
Dívidas pagas
Uma das medidas imediatas tomadas pela gestão Lula foi a quitação de dívidas, deixadas pelos governos anteriores, com organizações internacionais das quais o Brasil faz parte.
Entre as entidades para as quais o Brasil efetuou pagamentos estão a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização Mundial da Saúde, a Organização Mundial do Comércio, a Agência Internacional de Energia Atômica, a Organização para a Proibição de Armas Químicas, o Tribunal Penal Internacional e o Parlamento do Mercosul.
Na área dos Direitos Humanos, houve a retomada do tradicional compromisso brasileiro com políticas e iniciativas de caráter humanitário.
“Renovamos a concessão de vistos para cidadãos ucranianos, bem como o acolhimento e reunião familiar para cidadãos haitianos, em sintonia com a política migratória aberta e solidária, que já vinha amparando os cidadãos do Afeganistão e da Venezuela – neste último caso, por meio da Operação Acolhida”, detalhou.